sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

OS 25 MAIORES MOMENTOS DOS QUADRINHOS BRASILEIROS - parte 2

Olá.
Hoje, continuamos com a série que traz os 25 maiores momentos da história dos quadrinhos brasileiros, elegidos por mim.
Lembrando aos leitores que os fatos apresentados podem divergir com a opinião de leitores e especialistas do assunto. Se vocês não concordarem com algum fato que foi apresentado, podem expressar sua opinião junto comigo. Os fatos estão sendo apresentados em ordem cronológica, e não por colocação.
Bem, vamos agora com os fatos 6, 7, 8, 9 e 10 dessa cronologia.



6 – A Aparição do personagem “Amigo da Onça” (1943)

O magnata da imprensa Assis Chateaubriand (1891 – 1968) também começou a investir em quadrinhos. Em 1943, ele lançou, através da editora O Cruzeiro (que publicava a famosa revista homônima) a revista O Guri. A editora, de gibis, também já lançou os da Luluzinha e do Bolinha, e do Pererê de Ziraldo. Mas foi dentro da revista O Cruzeiro que apareceu o personagem mais popular do grupo editorial, O Amigo da Onça, criado por Péricles de Andrade Maranhão (1924 – 1961), o mais conhecido cartum-personagem brasileiro. O personagem foi criado a partir de uma piada muito popular da época, e que simbolizava o espírito do próprio. O malandro, um tipo cínico que aprontava todos os tipos possíveis de sacanagens com a cara mais deslavada desse mundo, cujas desventuras tinham um único quadro, era a primeira seção que os leitores de O Cruzeiro geralmente liam. O Cruzeiro também foi a casa de outros humoristas célebres, como Carlos Estevão e Millôr Fernandes. O Amigo da Onça sobreviveu inclusive ao suicídio de Péricles, em 1961, motivado por questões pessoais – Carlos Estevão (1921 – 1970), criador do personagem e da revista Dr. Macarra (também editada pela O Cruzeiro), assumiu o personagem e o desenhou, junto com suas outras criações, até o ano de sua morte.

7 – A fundação da editora EBAL (1945)
Após o fechamento do Suplemento Juvenil e de sua cadeia, o GCSN, Adolfo Aizen, que nunca desistiu dos quadrinhos, resolve criar sua própria editora, a EBAL (Editora Brasil-América LTDA). A EBAL, iniciando suas atividades em uma pequena sala no edifício São Borja, número 255 da Avenida Rio Branco, para depois se mudar para o amplo prédio no Bairro de São Cristóvão, no Rio de Janeiro, foi a maior editora de quadrinhos da América Latina no século XX. A primeira revista da editora, Seleções Coloridas, era impressa na Argentina; mas, depois que estabeleceu gráfica própria, a EBAL começou com O Heroi (assim, sem acento) a imprimir suas revistas no Brasil. A EBAL seria, por muitos anos, a casa de personagens como Super-Homem, Batman e dos outros heróis da DC Comics; Tarzan, Lone Ranger (Zorro) e vários títulos de faroeste da editora norte-americana Gold Key; dos heróis da Marvel Comics (pouco antes de a publicação destes ser assumida pela RGE) e dos famosos álbuns em tamanho gigante de Flash Gordon e Príncipe Valente. Além de quadrinhos estrangeiros, a EBAL mantinha séries produzidas por artistas brasileiros. Entre elas, a Edição Maravilhosa, uma série de adaptações de obras da literatura estrangeira e nacional para quadrinhos, a Grandes Figuras, biografias quadrinizadas de personagens históricos, e a Série Sagrada, de histórias religiosas (biografias de santos e fatos ligados à religião católica). Essas três séries eram produzidas por artistas como o haitiano André Le Blanc, os italianos Nico Rosso e Eugenio Collonese, o argentino Ramón Llampayas e os brasileiros Manoel Victor Filho, Aylton Thomas, José Geraldo... E a mais importante dessas séries foi a Edição Maravilhosa, que começou com uma série de romances estrangeiros (oriundas da série norte-americana Classics Illustrated), e que começou sua linha de romances brasileiros com O Guarani, de José de Alencar, por André Le Blanc (a terceira adaptação do romance para quadrinhos - a primeira foi a de Francisco Acquarone, em 1938, e a segunda foi a do português Jayme Cortez, em 1947). Apesar dos textos condensados e reduzidos ao essencial, com o objetivo de não substituir os livros, a Edição Maravilhosa foi a pioneira nas adaptações de obras da literatura para quadrinhos, algo que se tornou muito comum no início do século XXI – o Brasil foi o segundo país, depois dos Estados Unidos, a adaptar romances de autores locais para HQ. Já na linha de super-heróis, o maior representante brasileiro editado pela EBAL era O Judoka, de Eduardo Baron, Pedro Anísio e Mário Silva, que apareceu em 1970. O herói, o mais identificado com o clima de ufanismo da Ditadura Militar, consagrou o desenhista Floriano Hermeto e virou até filme. Aizen também ficou conhecido pelas boas relações que mantinha com os leitores, com os educadores e com a Igreja (a Série Sagrada e a Edição Maravilhosa foram fruto da preocupação de manter boas relações com esses dois últimos setores da sociedade) de seus gibis, e tinha como principal orgulho o prédio da editora, que inclusive estampava a logomarca da editora, onde mantinha também um Museu Permanente das HQ, e que recebia visitas até de turmas de escolas. A editora, que começou a passar por uma crise nos anos 70, acabou encerrando suas atividades por volta de 1995, por causa das dificuldades econômicas.

8 – A aparição da Editora Abril (e dos quadrinhos Disney no Brasil) (1950)
Os personagens de Walt Disney, que ganharam o mundo a partir de 1928, com o primeiro curta-metragem estrelado por um ratinho concebido durante uma viagem de trem, até hoje cativam gerações de crianças, adolescentes e adultos. Anteriormente, eles já haviam sido publicados n’O Tico-Tico e no Suplemento Juvenil. E a publicação das histórias em quadrinhos estreladas por Mickey Mouse, Pato Donald, Zé Carioca e todo o restante dessa fauna ainda pertence à Editora Abril, fundada em 1950 por Victor Civita (1907 – 1990). Se com Walt Disney tudo começou com um rato, como ele mesmo dizia, com Civita tudo começou com um pato. È que a estreia da editora foi com o gibi próprio do Pato Donald – embora a primeira revista tivesse sido, na verdade, a do personagem italiano Raio Vermelho, que, devido ao fracasso de vendas, foi apagada da memória da editora. A princípio, as histórias dos personagens eram predominantemente estrangeiras, mas, depois, a partir de 1959, os brasileiros começaram a desenhar histórias de Disney no Brasil. O primeiro “Mestre Disney” nacional foi Jorge Kato, com a assessoria de Valdir Igayara (que depois, seria lembrado como o criador da revista Recreio e do palhaço Alegria, para a mesma editora). E eles começaram desenhando Zé Carioca, o personagem que representava o Brasil – mas do modo como os estadunidenses imaginavam os brasileiros, estereotipado, portanto – criado em 1942. Durante algum tempo, eles também acabaram mantendo o famoso “caso do Zé Fraude”: como a demanda por histórias novas cresceu pelo fato de a revista do Zé Carioca ser inicialmente semanal (e revezando com o gibi do Pato Donald), Kato e Igayara usaram do expediente de redesenhar histórias de outros personagens, substituindo o Mickey ou o Pato Donald pelo Zé Carioca. Só mais tarde, o papagaio malandro seria “nacionalizado”, a partir do trabalho do gaúcho Renato Canini, que começou a desenhar o personagem a partir de 1971, incluindo no universo do personagem, por exemplo, favelas e personagens negros. O Estúdio Disney brasileiro foi a casa de muitos artistas talentosos, como Ivan Saidenberg (criador de personagens exclusivos das HQ Disney brasileiras, como o Morcego Vermelho), Arthur Faria Jr., Primaggio Mantovi (criador do palhaço Sacarrolha), Gerson B. Teixeira, Oscar Kern (criador dos fanzines Historieta e Confraria dos Dinossauros), Rodolfo Zalla, Fernando Ventura e Marcelo Cassaro. Porém, por volta de 1997, o Estúdio Disney Brasileiro parou de produzir HQs, e o material Disney editado pela Abril passou a ser exclusivamente produzido na Itália (a divisão estadunidense também parou de produzir quadrinhos Disney no início do século XXI). Mas a Editora Abril, em sua linha de quadrinhos, não se limitou apenas aos quadrinhos Disney, mas também a de outros personagens, inclusive brasileiros – a Abril foi a primeira, por exemplo, a publicar o gibi da Mônica de Maurício de Souza, em 1971, e assumiu a publicação dos gibis da DC Comics e da Marvel Comics após o fim do contrato com a EBAL e a RGE. A Abril também publicou algumas das melhores séries dos nascentes “quadrinhos adultos” dos anos 80, encabeçadas pelo Batman – O Cavaleiro das trevas de Frank Miller e o Watchmen de Alan Moore de Dave Gibbons.

9 – A Primeira Exposição Internacional de Histórias em Quadrinhos (1951)
Até a segunda metade do século XX, os quadrinhos nunca foram vistos a sério. Os jovens encontravam neles apenas entretenimento, e os mais velhos os viam com desconfiança – pais, educadores e religiosos desaconselhavam crianças a lerem histórias em quadrinhos, sob o argumento do “empobrecimento intelectual” de quem só lia quadrinhos, e da suposta “má influência” – por causa das teses controversas do psiquiatra norte-americano Fredric Wertham, autor do livro A Sedução do Inocente, as HQ de terror e policiais, por exemplo, seriam as grandes responsáveis pela delinquência juvenil e pelo homossexualismo, então malvisto pela sociedade conservadora. No Brasil, o preconceito às histórias em quadrinhos era amplificado inclusive pela imprensa, sobretudo aos editoriais dos jornalistas Carlos Lacerda e Samuel Weiner. Só na segunda metade do século XX, os quadrinhos, e sua influência na cultura mundial, começaram a ser estudados “a sério” pelos europeus. Porém, os brasileiros já haviam se antecipado a esses estudos: em 1951, por iniciativa do grupo composto por Álvaro de Moya, Jayme Cortez, Syllas Roberg, Reinaldo de Oliveira e Miguel Penteado, foi organizada no Brasil a 1ª Exposição Internacional de Histórias em Quadrinhos, no Centro Cultura e Progresso, em São Paulo. Na exposição, são mostrados originais de Alex Raymond, Hal Foster, Al Capp, Milton Caniff, Will Eisner, Roy Crane e muitos outros – originais esses que foram enviados de presente por esses artistas e que, curiosamente, foram pedidos apenas para análise, sem intenção de se organizar uma exposição, segundo conta o próprio Álvaro de Moya (1930 -), que ia se notabilizar como grande estudioso das HQ no Brasil. Enquanto isso, Jayme Cortez (1926 – 1988) se tornaria um dos grandes nomes dos quadrinhos no Brasil, como artista e editor, a partir da carreira iniciada em Portugal, e Miguel Penteado (1918 – 2000) é lembrado como um dos maiores editores e incentivadores dos desenhistas brasileiros, co-fundador das editoras Continental/Outubro e GEP. Essa exposição foi a primeira do mundo, chamou a atenção da imprensa para os quadrinhos (apesar das críticas negativas) e foi reconhecida pelos europeus pelo pioneirismo – os brasileiros se adiantaram aos italianos, que organizaram o Primeiro Congresso Internacional de Quadrinhos em Bordighera em 1965 – no ano seguinte, o Congresso é transferido para Lucca, também na Itália. Aliás, no Congresso de Lucca de 1966 o Brasil envia uma representação, única na América Latina, da qual faziam parte Álvaro de Moya, Jayme Cortez e Maurício de Souza. Em 1970, Álvaro de Moya lança, quase junto com Moacy Cirne, o primeiro livro “teórico” sobre HQ, Shazam!, um apanhado de artigos sobre quadrinhos (no mesmo ano, Cirne lança A Explosão Criativa dos Quadrinhos). E o Brasil ainda produziria outros especialistas de renome, como Zilda Augusta Anselmo, Otacílio D’Assunção (Ota), Sônia Bibe Luyten, Marco Aurélio Lucchetti, Gonçalo Júnior e Franco de Rosa. O próprio Moya narraria a experiência da exposição de 1951 no livro Anos 50 – 50 Anos, editado em 2002 pela Editora Opera Graphica.

10 – A aparição do herói “Capitão 7” (1954)
O Capitão 7 surgiu na televisão, mais precisamente na TV Record, em 1954, com o patrocínio do Leite Vigor, criado por Rubem Biáfora e interpretado por Ayres Campos. O “7” do nome do herói fazia referência ao canal de TV que transmitia as aventuras desse herói. Mas, marcadamente, é o primeiro super-herói brasileiro de sucesso. Embora os programas do personagem, que eram transmitidos ao vivo, não existam mais, os quadrinhos do personagem sobreviveram. Foi a partir de 1959 que apareceu, pela editora Continental / Outubro, o gibi do Capitão 7, com roteiros de Helena Fonseca, Hélio Porto e Gedeone Malagola e artes de Jayme Cortez, Júlio Shimamoto, Getúlio Delphim e Juarez Odilon. A aparência do herói dos quadrinhos é diferente da TV – nos gibis, o Capitão 7 lembrava uma combinação de Flash Gordon com Superman, com superpoderes inclusive. Nos gibis, o Capitão 7, habitante do Sétimo Planeta que veio à Terra ainda garoto, assumia a identidade secreta do cientista Carlos, e teve como namorada constante Silvana (que não apenas se casou com o herói como também ganhou poderes) e como adversário constante o maléfico Caveira. Atualmente, os familiares de Ayres Campos, morto em 2003, detém os direitos sobre o personagem – tanto que pouquíssimas vezes o uso do personagem foi autorizado. Na verdade, só duas vezes: em 2006, para uma série de HQs produzida por Danyael Lopes e publicada na revista Triplik, da editora Profashional (revista promocional das grifes de roupas infantis Lilica Ripilica e Tigor T. Tigre, da Marisol); e em 2010, numa história de Carlos Henry e Márcio Correa, para o gibi Almanaque Meteoro no. 1 (editada por Roberto Guedes), onde ele faz um crossover com outro herói brasileiro conhecido, o Fantasticman de Tony Fernandes. E podemos dizer que o Capitão 7 foi um marco, pois, depois dele, apareceriam muitos outros super-heróis brasileiros, que, apesar de não conseguirem fazer frente aos heróis das editoras norte-americanas Marvel e DC, e portanto não obterem o devido reconhecimento dentro do Brasil, tem lá seus fãs. Depois do Capitão 7, o super-herói brasileiro de maior sucesso foi o Raio Negro de Gedeone Malagola, criado em 1964. O Raio Negro foi o primeiro herói criado exclusivamente para os gibis, publicados pela Gráfica Editora Penteado (GEP), de Miguel Penteado. Curiosamente, o Raio Negro, uma cópia do Lanterna Verde da DC Comics, foi criado às pressas para substituir outro personagem que quase foi o protagonista do gibi, o Homem-Lua, também de Malagola. O Raio Negro e o Homem-Lua são os mais celebrados heróis de Malagola. Depois deles, os super-heróis brasileiros mais conhecidos e celebrados, entre os que chegaram às bancas e os que circulam pelos meios alternativos, estão o Escorpião, de Wilson Fernandes, o Golden Guitar, de Rivaldo Macedo e A. Torres, o Judoka, a Velta de Emir Ribeiro, o Meteoro de Roberto Guedes, o Máscara Noturna de José Salles e Edu Manzano e o Vulto de Wellington Santos.

Na próxima postagem: os fatos 11, 12, 13, 14 e 15.
Como ilustração própria, uma representação minha, apresentada acima, do Capitão 7 dos quadrinhos. Peço desculpas aos familiares de Ayres Campos, se eles estiverem lendo esse blog, se feri alguma lei do direito autoral. Fanarts estão inclusas? As outras imagens foram extraídas da internet, de diversos sites.
Até mais!

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