domingo, 7 de outubro de 2018

Filme: NETTO PERDE SUA ALMA

Olá.

O assunto desse momento é eleições, e, no momento em que escrevo, estão sendo realizadas as eleições gerais para Deputados, Senadores, Governadores de Estado e Presidente da República, mas, sabendo que os meus 17 leitores já devem estar cansados de ouvir falar nesse assunto, não vou tratar disso. Em vez disso, vou tratar de filme – brasileiro.
Na última postagem, eu tratei, mesmo que fora do tempo, do romance Netto Perde Sua Alma, do escritor e cineasta gaúcho Tabajara Ruas, que versa a respeito da Guerra dos Farrapos (1835 – 1845), que costuma ser celebrada no mês de setembro.
Hoje, falarei do produto derivado do livro: o filme, é claro. Há muita gente que conhece mais o filme que o livro. De todo modo, NETTO PERDE SUA ALMA, o filme, marcou a carreira não apenas do seu co-diretor, mas também de seu ator principal.


NETTO PERDE SUA ALMA foi dirigido por Tabajara Ruas e Beto Souza, e estreou em 2001. O roteiro é de Tabajara Ruas, Fernando Marés de Souza, Lígia Walper, Beto Souza e Rogério Brasil Ferrari, baseado no romance do primeiro; direção de fotografia de Roberto Henkin; direção de arte de Adriana Nascimento Borba; e trilha sonora de Celau Moreira.
A recriação cinematográfica da trajetória heroica de Antônio de Souza Netto, responsável pela proclamação da República Rio Grandense em 20 de setembro 1836 – episódio chave da Guerra dos Farrapos – foi amplamente premiada no Brasil e no exterior. Foram quatro troféus Kikito no Festival de Gramado, nas categorias Melhor Filme – Júri Popular, Melhor Montagem, Melhor Trilha Sonora e Prêmio Especial do Júri; no Festival de Recife, foram três troféus – Troféu Gilberto Freyre de Melhor Ator Coadjuvante para Simar Antunes, Melhor Roteiro e Melhor Direção; no Festival de Brasília, prêmio de Melhor Ator para Werner Schünemann; duas indicações no Grande Prêmio Cinema Brasil, categorias Melhor Ator (Werner Schünemann) e Melhor Roteiro Adaptado; no festival de Huelva, na Espanha, prêmio de Melhor Fotografia; e, no festival de Trieste, na Itália, prêmios de Melhor Diretor Estreante e Melhor Música. Ufa.
NETTO PERDE SUA ALMA não foi a primeira experiência de Tabajara Ruas com cinema, mas certamente foi a que mais lhe projetou nacionalmente. Outro dos envolvidos que se deu bem com a produção foi o ator Werner Schünemann, que, apesar de ator veterano, sua carreira, até protagonizar este filme, nunca havia saído das fronteiras do Rio Grande do Sul. Em 2002, Schünemann foi escalado para interpretar outro herói da Guerra dos Farrapos, o General Bento Gonçalves, na série A Casa das Sete Mulheres, da Rede Globo. Foi aí que o ator se tornou nacionalmente conhecido. Ah: na mesma Casa das Sete Mulheres, Tabajara Ruas atuou como consultor.
E, claro que, como o próprio autor do livro estava diretamente envolvido na produção, o filme deveria ser o mais fiel possível ao livro. Com algumas liberdades e algumas alterações, mas o filme é bastante fiel ao romance, tanto no enredo quanto na estrutura narrativa, com a história contada de maneira não-linear, cheia de flashbacks, avanços e retrocessos no tempo.
O filme, que teve locações no Rio Grande do Sul e no Uruguai, se inicia, tal como no livro, em um hospital militar de Corrientes, na Argentina, em 1866. Nele, Antônio de Souza Netto (Schünemann), que então estava lutando contra as tropas paraguaias, acaba internado, com ferimentos. O hospital militar está à cargo do tenente Philip Blood (Arines Ibias) e de diversas enfermeiras, entre as quais Catarina (Lisa Becker) e Rosita Zibiaurre (Márcia do Canto). Internados no mesmo hospital, estão mais dois homens, dentre eles o Capitão De Los Santos (João França). Com uma duvidosa experiência em medicina, Blood (no livro, Fontainebleaux) procede a amputação das pernas do Capitão De Los Santos, sem necessidade. O sofrimento posterior do Capitão alimenta o desejo de Netto em fazer-lhe justiça.
Mais tarde, Netto recebe a visita de um velho colega de batalha, o negro Sargento Caldeira (Sirmar Antunes), a quem revela seus planos. A partir daí, Netto começa a rememorar episódios de sua vida, principalmente de sua participação no movimento da Guerra dos Farrapos.
Começa com a pequena aventura ocorrida em 1835, quando Netto e um parceiro, o capitão Teixeira Nunes (Nélson Diniz), longe das tropas, e em direção a se reunir a elas, param em uma estância para adquirir cavalos, e enfrentam a resistência da estancieira Maria Luíza (Letícia Liesenfeld); mas eles conseguem os cavalos graças à intervenção da estancieira Sra. Guimarães (Araci Esteves), que tinha parentes no campo de batalha. Algum tempo depois, quando já estavam a caminho, Netto e Nunes são abordados pelo jovem negro Milonga (Anderson Simões), empregado da estância, que deseja se juntar ao corpo de lanceiros negros que faz parte das tropas farroupilhas. Em princípio, os dois oficiais dispensam os préstimos de Milonga, mas, depois, quando são atacados por um grupo de bandoleiros, liderados por um “padre” (Miguel Ramos), Milonga foi decisivo (outra mudança em relação ao livro: na obra original, os assaltantes eram índios charruas; no filme, são castelhanos). E o jovem negro acaba sendo aceito no corpo dos lanceiros negros, depois que ambos se encontram com as tropas.
Sucedem-se uma série de episódios durante a Guerra dos Farrapos. Uma batalha, reuniões de tropas, ainda com os sobreviventes feridos, e a proclamação da República Rio Grandense, em meio a um campo, e em frente às tropas. Tudo mostrado em detalhes, e com sequências de dramaticidade (como no trecho em que um corneteiro moribundo se arrasta por um banhado durante a cena de batalha).
A história avança para o final da guerra, com a revolta de Milonga: ele, e alguns remanescentes dos lanceiros negros, se sentiram traídos pelos líderes farroupilhas (temem voltar à condição de escravos após a assinatura do tratado de paz, programado para alguns dias), e se rebelam. O Sargento Caldeira tenta convencer os rebelados a reconsiderarem sua decisão de fugirem para longe, mas não tem sucesso, principalmente com Milonga, que perdeu uma das pernas em batalha. Pouco depois, Milonga tenta matar o General Netto, mas acaba morto por Caldeira, em defesa do General.
Posteriormente, o filme avança para a época do exílio de Netto no Uruguai, onde monta uma estância na localidade de Piedra Sola, em Tacuarembó, e constitui família com Maria Escayola (Laura Schneider). Mas ele não consegue desfrutar de plena tranquilidade: após uma conversa com um embaixador inglês (Fábio Neto), Netto é instado a atuar contra os interesses de Solano Lopes, o governante do Paraguai, na região platina – eventos que dariam origem à Guerra do Paraguai. Também a lembrança de Milonga, e seu destino, é responsável por tirar-lhes o sono. O filme também trata do relacionamento entre Netto e Maria, tratado como conflituoso.
E o filme retorna, ao final, ao hospital militar, quando Netto e Caldeira procedem o plano de matar o doutor Blood. Até mesmo o delírio de morte de Netto, descrito no livro, é representado pictoricamente no filme.
O filme, bastante centrado no conflito de consciência de Netto, que, antes de tudo, tinha anseios de liberdade apesar de não concordar totalmente com as ideias de seus colegas, possui um caráter cult, e, por isso, merece ser assistido várias vezes, por conta da atuação dos atores, da fotografia e da trilha sonora, composta de versões instrumentais de músicas gaúchas tradicionais e canções em ritmo afro. Sem falar, ainda, nos recursos utilizados pelos diretores para marcar a passagem do tempo, como a cena que mostra uma bandeira farrapa inicialmente nova, depois esfarrapada ao final do conflito. E, claro, na reconstituição da época – sendo Tabajara Ruas alguém que entende de história gaúcha, a reconstituição fiel de vestimentas e cenários foi fundamental.
Mas não se trata de um filme para todos os públicos, devido às cenas sangrentas de batalhas – a mais arrepiante foi a da cirurgia da amputação das pernas do Capitão De Los Santos.
Ainda assim, NETTO PERDE SUA ALMA é um desses filmes recomendados para exibição em escolas, como recurso extracurricular. Pode não tratar totalmente dos eventos da Guerra dos Farrapos, mas ao menos a polêmica questão do tratamento dos soldados negros das tropas farrapas ajuda a levantar questionamentos.
Posteriormente, Tabajara Ruas retoma o personagem Netto em outro filme, Netto e o Domador de Cavalos. Desse filme trataremos em outra oportunidade.
E, em breve, estreia novo filme do diretor Tabajara Ruas, A Cabeça de Gumercindo Saraiva. Fica uma recomendação para os próximos dias.
Imagens: extraídas da internet.

PARA ENCERRAR...
...claro que só poderia ser com mais páginas de minha HQ folhetinesca, O Açougueiro. Embora temendo que a história já esteja perdendo seu rumo, prossigo produzindo páginas a conta-gotas, e publicando-as aos poucos. No final do ano, já devo reunir as páginas publicadas durante 2018 em um terceiro volume, tal como fiz nos anos anteriores.
E nunca é demais lembrar aos meus 17 leitores: vote consciente. Não deixe de acreditar em um futuro melhor para o Brasil. Ao menos, não venda seu voto.
Até mais!

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