Hoje, de novo vou falar de livro – e cumprindo outra promessa feita um post atrás.
A época é propícia para falar de mais este livro - enquanto escrevo, ainda é 7 de setembro, dia da Independência Brasileira.
Hoje então falarei da continuação do megasucesso editorial 1808: 1822. Também do jornalista Laurentino Gomes.
O livro já chama a atenção pelo subtítulo bombástico: Como um Homem Sábio, Uma Princesa Triste e um Escocês Louco por Dinheiro Ajudaram D. Pedro a Criar o Brasil – Um País que Tinha Tudo Para Dar Errado. Apesar de ter partido de um tema já conhecido, a Independência do Brasil, esse gancho ajuda a tornar este livro mais interessante. Não foi à toa que o livro, lançado pela Editora Nova Fronteira em 2010, figurou durante todo o ano de 2011 na lista dos mais vendidos, e foi vencedor no mesmo ano de um prêmio Jabuti – mesma láurea recebida por 1808. Também ganhou uma versão ilustrada e uma versão para jovens. E, tal como 1808, a atual edição é mais compacta, com letras menores.
Bão. Laurentino Gomes continua, em 1822, a narrar um fato histórico apoiado em ampla bibliografia, em uma linguagem acessível ao público leigo, repleto de comparações com o presente e desenterrando fatos até então desconhecidos de quem só conhecia a versão dos livros de História. No caso, ele não se detém apenas nos bastidores da Independência brasileira, mas em todo o período em que D. Pedro I governou o Brasil, ou seja, de 1822 a 1831.
E... por que o Brasil “tinha tudo para dar errado” quando se tornou independente? Porque, tomando a situação do país em 1822, muita gente duvidava da viabilidade do Brasil como nação:
“De cada três brasileiros, dois eram escravos, negros forros, mulatos, índios ou mestiços. Era uma população pobre e carente de tudo, que vivia à margem de qualquer oportunidade em uma economia agrária e rudimentar, dominada pelo latifúndio e pelo tráfico negreiro. O medo de uma rebelião dos cativos tirava o sono da minoria branca. O analfabetismo era geral. E cada dez pessoas, só uma sabia ler ou escrever. Os ricos eram poucos e, com raras exceções, ignorantes. O isolamento e as rivalidades entre as diversas províncias prenunciavam uma guerra civil, que poderia resultar na fragmentação territorial (...). Para piorar a situação, ao voltar para Portugal, no ano anterior, o rei D. João VI havia raspado os cofres nacionais. O novo país nascia falido. Faltavam dinheiro, soldados, navios, armas ou munição para sustentar uma guerra contra os portugueses, que se prenunciava longa e sangrenta. As perspectivas de fracasso, portanto, pareciam bem maiores que as de sucesso. (...) (texto da 4ª. capa).
Bem. A situação não era nada boa no momento em que D. Pedro desembainhou a espada e deu o famoso grito de “Independência ou Morte”, na tarde do dia 7 de setembro de 1822, às margens do Rio Ipiranga. Laurentino Gomes, em sua obra, relata como, com uma combinação de acaso, sorte, improviso e também se sabedoria das lideranças, o Brasil acabou dando certo. Não do jeito que seria apropriado, mas deu.
Os diversos fatos e pessoas que compuseram a história do Primeiro Reinado Brasileiro são relatados de forma detalhada, de modo a desfazer a visão “oficial” da História, mas também a versão “escrachada”, aquela que põe inúmeros defeitos nos antes heróis nacionais. D. Pedro foi um grande herói, que proclamou nossa independência, foi um governante seguro de si, mas também era impaciente, mulherengo e promíscuo. Hoje não é fácil atribuir ao homem que atualmente estampa o verso das moedas de 10 centavos um papel único na História: nem herói, nem vilão. Nem tanto moço exemplar, nem tanto um tipo sem-vergonha. Aliás, um dos capítulos do livro dedica-se exatamente a traçar um perfil do homem de costeletas, nome bombasticamente comprido e que morreu jovem - fez o que fez em apenas 35 anos de vida.
Bão... e os personagens que o subtítulo faz referência? São gente conhecida. O homem sábio é José Bonifácio, o “Patriarca da Independência” e o idealizador do manifesto que nortearia as decisões de D. Pedro; a princesa triste é D. Leopoldina, a esposa austríaca de D. Pedro, que sofreu demais com as infidelidades e os maus tratos que o marido lhe impingia, mas que teve papel importante no projeto de independência; e o escocês louco por dinheiro é Lorde Cochrane, mercenário contratado por D. Pedro para auxiliar nas lutas contra as tropas portuguesas no Nordeste Brasileiro, que foram decisivas para confirmar a independência – se dependesse só do Grito de D. Pedro, não teria adiantado nada. Cada personagem tem seu perfil detalhadamente descrito nos capítulos a eles dedicados. Ah: e não podia faltar também um capítulo sobre Domitila de Castro Canto e Melo, a Marquesa de Santos, a amante mais famosa de D. Pedro e a maior responsável pela desgraça pela qual a boa D. Leopoldina passou dentro de nosso país. Também há referências a Francisco Gomes da Silva, o Chalaça, o maior amigo de D. Pedro. Embora este não tenha ganho um capítulo próprio, ele é citado aqui e ali.
Quanto às revelações feitas por Laurentino Gomes, uma delas é referente ao famoso quadro de Pedro Américo que retrata o momento do Grito do Ipiranga: além de a cena retratada não corresponder à realidade histórica, o quadro ainda é uma cópia de uma pintura francesa que retratava Napoleão!
E quanto aos fatos relatados, estão: a reconstituição e as diferentes versões do Grito do Ipiranga; os momentos do Dia do Fico (quando D. Pedro resolveu desobedecer as determinações das Cortes Portuguesas e ficar no Brasil); a caracterização (já feita acima, mas mais detalhada) do Brasil da época da Independência, e de como esse país que tinha tudo pra dar errado acabou dando certo; as diversas batalhas entre Portugal e o Brasil após o 7 de setembro – incluindo a trágica Batalha do Jenipapo e a Batalha do Pirajá, onde o erro de um corneteiro representou uma vantagem ao exército brasileiro; a formação desse mesmo exército, formado por homens obrigados a lutar; os bastidores da elaboração da Constituição de 1824, a primeira do nosso país e a mais duradoura até agora (o Brasil já teve sete constituições, em 1824, em 1891, em 1932, em 1937, em 1946, em 1964 e em 1988); a Confederação do Equador, a guerra separatista dos Estados do Nordeste contra D. Pedro (de onde se destaca a figura do Frei Joaquim do Amor Divino Rabelo, o Frei Caneca); os acordos para o reconhecimento da nossa independência por Portugal (incluindo a inauguração da nossa dívida externa, pois para pagar a indenização cobrada por Portugal, D. Pedro precisou recorrer a um empréstimo da Inglaterra; o papel da Maçonaria, a célebre Ordem Secreta, na Independência brasileira; e os fatos que conduziram à renúncia de D. Pedro em 1831 (deixando seu trono para o filho de então 5 anos, o futuro D. Pedro II), como a Guerra da Cisplatina e o problema de sucessão do trono português, incluindo as guerras que D. Pedro empreendeu contra o irmão usurpador D. Miguel. Para resumir, é como está aí; se querem saber os fatos com mais detalhes, leiam este livro.
Há alguns fatos que Laurentino Gomes, neste volume, passa meio por alto, dedica poucas páginas, como o segundo casamento de D. Pedro, com a princesa Amélia de Beauharnais – que pôs ordem no caos gerado após a morte de Leopoldina – e a Guerra da Cisplatina, a revolta provincial que resultou na criação de um novo país, o Uruguai (sabiam que o Uruguai já fez parte do Brasil?).
1822 continua na trilha iniciada por 1808. Laurentino Gomes continua despertando no leitor mais leigo o gosto pela História. Leitura recomendada para quem quer saber mais das intimidades de D. Pedro, o “Demonão” da “Titília” Marquesa de Santos; para quem tem dificuldades de entender os fatos descritos nos livros de História; e para quem quer saber mais sobre o Império Brasileiro antes de Pedro II. O recurso dos ganchos do subtítulo funcionou muito bem: foi uma maneira original de chamar a atenção para a História.
É isso aí.
Para encerrar: enquanto ainda é 7 de setembro, coloquei, simultaneamente nos meus três blogs adicionais, o Blog da Letícia, o Blog dos Bitifrendis e o Blog do Teixeirão, uma ilustração de cada um deles rendendo homenagens ao Dia 7 de Setembro.
Durante o dia, teve desfile cívico em várias cidades do Brasil; agora, na internet, as homenagens só tem de continuar enquanto o dia não vira.
Ah: também deixei, no blog Educar é Viver (http://orientarpedagogos.blogspot.com.br/), do qual também sou colaborador, uma versão destas mesmas ilustrações para colorir. Recomendável para os professores que procuram material do 7 de setembro para passar aos alunos.
Viva a Pátria! Liberdade ou Morte! Não importa o que digam de nosso país, temos de mudar sua situação ao invés de seguir apenas reclamando dos buracos de bichos que fizeram na nossa bandeira!! Vocês entenderam a metáfora?
Até mais!
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