Hoje já cumpriu duas semanas. Hoje, portanto, tem novo episódio de Macário, o meu folhetim ilustrado, no Estúdio Rafelipe! Leitura para tentar esquecer a situação pela qual o Brasil atualmente passa...
ATENÇÃO: Leitura não recomendada para menores de 18 anos. Contém cenas de sexo, consumo de bebidas alcoólicas e insinuação de submissão feminina.
A primeira visão que tive, ao abrir os olhos,
no dia seguinte, foi a do relógio despertador ao lado de minha cama: marcava 15:30
– três e meia da tarde.
Estava grogue.
Ooohhh... Que aconteceu?
Eu sonhei com a noite de ontem? Eu sonhei com
o dia de ontem inteirinho?
Sonhei que Valtéria estava no hospital, toda
enfaixada, como uma múmia?
Sonhei que ela saiu de seu leito de hospital
para propor fazer amor comigo lá no hospital mesmo?
Sonhei que, à noite, eu havia atendido um
bando de “monstros” que compareceu ao bar onde trabalho?
Sonhei que, por uma noite, eu havia me
tornado o melhor bartender do mundo?
Aliás, eu sonhei que trabalhava naquele bar?
Sonhei que quase fui atacado por cães ferozes?
Sonhei que consegui afastar esses mesmos cães
raivosos com um único grito?
Sonhei que salvei uma garota que horas antes
gritou comigo?
Sonhei que Viridiana transou comigo de novo?
Levantei da cama, meio alquebrado, sonolento,
tantas perguntas na cabeça. A claridade que entrava pelas venezianas da janela
machucava meus olhos.
Estava nu. Mas Viridiana não estava ali. Será
que foi embora? Será que foi sonho?!
Levantei, procurei minha cueca e minha calça,
jogados no chão, e vesti. Estava meio grogue. Abri a porta do quarto. E andei.
Haveria algum sinal de que Viridiana esteve
por aqui? Acho que foi tudo um sonho mesmo, ah, ah...
Mas aí, ergui o olho quando passei pela área
de serviço. No varal, havia uma calça pendurada. E não era minha. Assim como a
camiseta, o casaco, o sutiã e a calcinha, evidentemente tudo lavado há pouco
tempo.
Ah, estou lembrado... A Viridiana molhou as
calças diante dos cães rosnantes, e... Terá ela lavado as calças enquanto
estava dormindo? Decerto... toquei a calça, já estava quase seca, ficou um bom
tempo no varal, assim como o restante da roupa. Mas... e a Viridiana? Onde...
Aí, senti um cheiro vindo da cozinha. Cheiro
de arroz cozido. E me dirigi à cozinha.
De trás do balcão que separava a cozinha da
sala de estar, ela saiu.
Oh! Viridiana! Ali, na cozinha, cozinhando! E
estava trajando apenas óculos e um avental, que lhe cobria a parte frontal do
corpo!
- Vi?...
Ela se virou em minha direção e sorriu.
- Ah, boa tarde, Macário. Acordou,
finalmente.
- Pensei que tivesse ido embora. Pensei que
tivesse sido sonho, você aqui...
- Não foi sonho, Macário. – Ela falava com
calma, e algum carinho. – Eu estive aqui ontem à noite, e ainda estou. Só tive
de dar uma saída e... ah, peguei uma calça sua emprestada, do seu roupeiro. Ali
em cima da cadeira.
Havia uma calça pendurada em uma das cadeiras
que cercavam a mesa. Essa era minha.
- Onde foi com minha calça?
- Ao hospital. Vieram buscar a Valtéria, os
pais dela, e eu tive de ir lá dar uma mão. Ela estava ainda meio chapada por
causa dos remédios, então ela não deve ter estranhado que eu estava com uma
calça de homem... Ela já foi para casa. Mas acho que ela foi despedida do
emprego, depois de todos os dias que ela faltou... – ela deu uma murchada no
sorriso, mas que não se desfez totalmente. – Assim que melhorar da cabeça, ela
vai ter de voltar a procurar emprego...
- Lamento por isso.
Aí, o sorriso de Viridiana voltou a aumentar.
- Mas não se preocupe, não contei a ninguém
que passei a noite aqui. A Valtéria não sabe de nada sobre ontem à noite. Não
sabe que eu vim dar para você de
novo, ah, ah...
- Ah, ah... – dei um riso amarelo. – Ué, não
foi trabalhar hoje?
- Resolvi faltar hoje. – ela respondeu,
sorrindo, com uma piscadela. – Depois eu dou uma desculpa. Sei, não é típico de
mim, mas...
- Vi...
- Além do mais, tive de lavar minha calça
aqui. No ensejo, lavei toda minha roupa. Pode ver se já está seca, Macário?
- Já vi. Ainda está um pouco úmida. Deve
secar totalmente dentro de uma meia hora... E... o que faz pelada, só de
avental?
- Ora, o quê? Estou cozinhando. – disse, com
um acento de indignação, como se eu estivesse duvidando do que via. – É o
mínimo que estou fazendo para retribuir o que você fez por mim ontem à noite.
Você me salvou dos cães ferozes, e deixou que eu dormisse aqui, e...
- ...e o que está cozinhando? – interrompi.
- Risoto. – Respondeu, levantando a tampa da
panela. – Mexi na geladeira e nos armários e encontrei ingredientes de risoto.
A Valtéria gosta do meu risoto. Quer provar também?
- Risoto às três e meia da tarde, Viridiana?
– dessa eu tive de sorrir.
- Por que não? A gente sai de casa jantado,
não precisa jantar no Restaurante Universitário antes de ir para a faculdade,
não é? Economiza uns créditos...
Minha cabeça estava cheia de pontos de
interrogação. Não era à toa que Valtéria e Viridiana eram colegas de quarto no
alojamento da universidade: pelo jeito, as duas não batem bem da cabeça. A
Valtéria demonstrou atitudes fora do normal, além de um gosto assustador por
sexo. Mas Viridiana era a que mais me assustava, porque ela está demonstrando
isso também, mas ela tem um jeito de garota séria. Naquela noite que saímos, ela
não estava agindo assim, como a realização da fantasia de um macho, vestida
apenas com o avental, preparando uma refeição, solícita e algo submissa. Não.
Viridiana, se bem me lembro, era feminista e tinha pendor para a bissexualidade
– ela declarou preferir mais a companhia das mulheres que dos homens, embora
não dispensasse a companhia de um quando lhe desse na telha. Começo a achar que
a relação entre ela e Valtéria vai muito mais além de uma simples amizade.
E, é estranho: as pessoas podem mudar, mas...
em apenas uma madrugada? No fim da tarde de ontem, ela supostamente me odiava
porque eu comecei a supostamente influenciar a cabeça de sua amiga. E, na
madrugada de hoje, ela estava me seduzindo e transando comigo...
Calma, Macário, mantenha a calma. Pode ser
que ela acabe se irritando, pode ser que ela volte a ser o que era, de supetão,
e acabe tentando acertar seu rosto com petardos de arroz quente. Evite isso,
faça o jogo dela...
- No que está pensando, Macário? – Viridiana
me fez voltar à realidade.
- Hã... nada. Só captando o cheiro desse seu
risoto.
- Ah. Já está pronto. Quer se servir?
- Eu...
- ...ou quer fazer alguma outra coisinha
antes? – disse, se aproximando de mim, e me olhando lânguida.
- O-outra coi-coisinha? T-tipo o quê?
- Um... aperitivo para abrir o apetite. Pode
ser?
E se abraçou a mim, e me beijou. Acho que sei
de que tipo de “aperitivo” ela está falando. Estava muito claro, pelo fato de
ela estar usando apenas um avental, sem nada por baixo, de ela estar com a bundinha
de fora, mesmo com as janelas abertas.
- Você não se cansou de ontem à noite, Vi?
- Você que apagou antes de me dar mais,
Macário. Sei que você é capaz de me dar mais prazer, Macário... Por favor,
Macário...
Engoli em seco. Mas ela também estava
perfumada. Tomou banho, também, no meu banheiro, decerto, seu cabelo estava
levemente úmido. Não consegui resistir.
Nos atiramos no sofá. E começamos a nos
agarrar. Recuperei a lucidez um instante: espere, tenho de pegar uma... Mas
Viridiana tirou, não consegui ver por onde, uma camisinha, e me mostrou. Ah,
menos mal.
- Aah, Macário... me trata como uma p(...),
eu deixo...
Coloquei a camisinha e possuí Viridiana no
sofá, mesmo – por que eu recusaria um convite assim? Eu só precisei arriar a
calça, sem tirá-la, ela só precisou levantar o avental da frente da virilha. Não
foi tanto como ela pediu, que eu a tratasse “mal”, mas ela gostou. Ela nem
gritou, só gemeu, gemeu. Mas não levou mais que cinco minutos. Fiquei fraco e
ofegante depois que terminei.
- Macário... já acabou?! – pergunta
Viridiana, ofegante.
- Fiquei fraco (puf puf)...
- Fraco?!
- Vi... (puf) deve ser porque ainda não comi
nada... (puf)... Não tomei café... (puf) E sexo exige esforço... (puf)
- Ah, sim... Espere aí, já te sirvo.
Reuni o que sobrava de forças para me
levantar, tirar a camisinha e vestir a calça novamente. E fiquei sentado no
sofá, com aquela sensação depressiva típica do pós-sexo. Por alguma razão, esta
“investida” não foi legal para mim. Ela pode ter gostado, mas eu...
Viridiana ajeitou o avental, fez o favor de
levar a camisinha usada para a lata de lixo próxima à pia, foi ao fogão e
voltou em seguida, trazendo um prato de risoto nas mãos. O prato tinha uma boa
aparência, com carne picada, ervilha, milho, tempero verde, o arroz grudado e vermelho
por conta do molho de tomate.
- Humm... – falei, dando a primeira garfada.
- Ficou bom?
- Bastante. – e era verdade. Estava
delicioso. – Se você tivesse feito esse risoto no nosso primeiro encontro, acho
que sairíamos namorando...
Já me sentia um pouquinho melhor, com essa
refeição.
- Vai um vinho também?
- Mas eu não tenho vinho em casa...
- Eu trouxe.
E ela foi buscar uma garrafa de vinho da
geladeira. Era um vinho de preço mediano, que se podia comprar em qualquer
mercearia, garrafa fina e comprida, com aparência de importado.
- Comprei antes de voltar aqui, Macário. Toma
um golinho, eu te acompanho.
Engraçado, não lembro nem de ter cálices em
casa, mas ela, do nada, tirou dois, e encheu. Vieram de brinde com a garrafa?
Comi três pratos de risoto, mais por
insistência de Viridiana; ela se serviu também, e devia estar com fome, pois
ela acabou esvaziando a panela, que nem era tão grande. Me lembrei da Valtéria,
no domingo, devorando todos aqueles hambúrgueres.
Tomei
só dois cálices de vinho, que apesar de barato não era ruim, mas Viridiana tomou
cinco, mais que isso, emborcou os cálices, o vinho sumiu por sua garganta em um
só gole, não deu tempo nem de sentir o aroma, até deixou escorrer pelo canto da
boca (“oh, que pena, Macário, olha, deixei cair vinho no teu avental, ah,
ah!...”). E dava risadas, e se agarrava a mim, e me beijava, e já tentava fazer
amor comigo de novo, mas eu estava sem vontade, ainda não me sentia recuperado
daquela investida de antes, mas ela insistia, até tentou fazer os seios
saltarem do avental...
Mas eu não reagia a todas essas investidas; estava
sentindo algo estranho no ar. Aquelas estranhas atitudes todas já começavam a
me dar gastura. Tem algo esquisito. Era como se Viridiana estivesse bêbada
muito antes de tomar o vinho.
- Vai, Macário... toma mais vinho... Você
tomou tão pouquinho... – disse, me estendendo de novo a garrafa praticamente
vazia.
Resolvi perguntar de supetão:
- Vi... o que está acontecendo?
- Que está acontecendo o quê?
- Com você.
O olhar dela estava revirado.
- Por quê? Não gosta que uma linda garota quase
nua lhe sirva um risoto e um vinho? Ou eu não sou linda? Você disse, ontem à
noite, que eu era linda, e...
- Não é isso. Você é linda, claro que é,
linda do seu jeito.
- Então...?
- É porque... essa “linda garota quase nua” é
você.
- Como assim?
- Você não é assim, Viridiana. Você não está
agindo como a garota que eu conheci.
- Mas qual é o problema, Macário? – Viridiana
deixou uma lágrima cair. – Você não gosta que eu te mime assim? Só porque a Viridiana
que você conheceu... Você prefere que eu grite com você? Que eu aja como uma
fera com você?! Quer que eu te bata, é isso? Você não gosta do meu corpo? De me
ver assim, toda oferecida?! Você prefere a Valtéria?!
- Não, Vi, não me entenda mal. – estava sem
jeito, não queria decepcionar a garota. – Estou só achando esquisito você
assumir essa atitude submissa, de uma hora para outra. Você não é feminista?
Bissexual?
- Sou, sim. Digo, acho que ainda sou... – ela
deu uma risada bêbada. – Quem sabe eu esteja a ponto de me curar da tendência
para o “sapato”, hein? Ah, ah... – e seu sorriso se desfez. – Mas Macário, qual
é o problema? Foi a Valtéria que disse! E é verdade, infelizmente, estive mesmo
com vontade de dar para você de
novo... (soluço) Eu estive tentando esquecer que fiquei apaixonada por você...
Afinal, você é você, não? (soluço) Para você, eu fui apenas uma garota... Sei,
te tratei mal naquela noite, do mesmo jeito que você me tratou mal, aliás, mas
era para negar que foi muito agradável... (soluço) Mas, Macário... Eu...
Ela vem de novo para cima de mim, mas eu a
repeli.
- Vi... O que você pretende exatamente? Por
que está querendo, de repente, ter um romance comigo?
- Eu... Macário, eu... – ela tentou coordenar
as ideias, o vinho fazendo efeito em sua cabeça. – Estou fazendo isso pelo bem
da Valtéria. Depois eu conto para ela que voltamos a namorar. (soluço) Isso vai
fazer ela te esquecer. Isso vai fazer bem a ela, e...
- Namorar?! – me levantei, e olhei Viridiana
de cima. – Viridiana!!! O que está havendo?!
- Macário!!! – ela recuou, assustada.
Respirei fundo.
- O que está havendo, afinal?! Essa realmente
é você, Viridiana?! In vino veritas
(no vinho está a verdade)?! Aquele papo de feminismo e bissexualidade era pura
fachada? Quem sabe essa não seja a sua verdadeira face?!
Assustada, ela começou a chorar, encolhida.
- Macário... Talvez seja este vinho barato,
talvez... (soluço) Talvez seja um desejo reprimido, que eu esteja testando
deixar vir à tona, como uma forma de tratamento psiquiátrico... (soluço)
Lembre, Macário, eu sou aluna de Psicologia e... (soluço) – Ela não coordenava
bem suas palavras, nem as ideias, o vinho ainda fazendo efeito. – Aah,
Macário... (soluço) Eu te amo, Macário! Por favor, não me recuse, eu... (soluço)
Diz que eu que vou ser a garota da vida inteira, de agora em diante... Diz que
eu... (soluço)
Que mania dessa garota pontuar suas frases
com soluços.
Peguei com delicadeza em seus pulsos, e fiz
ela se levantar.
- Viridiana, por favor, não me entenda mal.
Não é que eu não goste de você. Mas é que isso tudo está sendo um choque para
mim. Pensar que ontem você estava gritando comigo, no hospital...
- Estou fazendo isso pelo bem da Valtéria, já
disse... (soluço) Ela não bate bem da cabeça. Ela não vai ficar com você. (soluço)
Ela não vai ser feliz com você, Macário. Eu é que vou! (soluço) – E tentou me
beijar, mas eu recuei.
- Pare!
- Macário, por favor... (soluço) Vem cá,
beija meu seio todo oferecido aqui, e... (soluço)
Eu já estava começando a me irritar.
- Sente-se, Vi, e vamos conversar...!
- Macário...
- SENTA! – explodi.
Ela ficou parada, me olhando, assustada. E
sentou no chão, se apoiando nas pernas e nos braços, como uma cadela. Fiquei
desconcertado.
- Vi?!
- Você disse para me sentar.
- No sofá, Vi. No sofá.
Ela foi para o sofá, e se sentou como uma
pessoa normal.
- Mas que palhaçada. – falei, com indignação.
- Mas foi você que gritou, que mandou...
- Que lindo. Agora você vai passar a se
portar como uma cachorrinha se eu te der ordens?
- Macário, eu...
- Escute, Vi. Por favor, me escute apenas. –
procurei falar com calma, olhando-a novamente de cima. – Talvez seja melhor
você ir para seu alojamento.
- Para meu...?!
Me agachei, para olhar nos olhos de
Viridiana, através dos óculos.
- Olha, Vi, não vou dizer que não fico
agradecido pelo risoto e pelo vinho, eu estou agradecido pela refeição,
obrigado por ter cozinhado para mim hoje, estava muito bom esse seu risoto. Mas
é que... Você agora não está se portando como uma garota racional, e está me
assustando. Além do mais, você me conhece, Vi. Sabe que meu ritmo de vida é
outro. Você é uma mulher do dia, eu sou um homem da noite. Por hora, nossos
egos não são compatíveis. Não creio que devamos namorar... não agora. Não
enquanto não baixar a poeira de toda essa loucura. Digo, a tua amiga toda
ferida, eu ter sido atacado, aqueles “monstros” todos que festejaram no bar
ontem, e você... você... – engoli em seco, respirei fundo e continuei: – Talvez
tenhamos uma chance, Vi, mas... eu quero um tempo para pensar. Por isso, peço
que não tome nenhuma atitude impensada agora.
- Macário...
Toquei nos ombros dela.
- Vi... vá para seu alojamento. Descanse a
cabeça. Vá para a tua aula, amanhã vá para o teu trabalho, torça para que teu
patrão aceite a desculpa que você der para justificar a falta de ontem. Pense
que sua amiga está longe de problemas agora. Está na casa dela, descansando. E
você teve o que queria, certo? Você deu pra
mim de novo, precisa de mais? Se quiser conversar, pode vir aqui, pode me
procurar. Mas não pense em se tornar algo que eu não tenho certeza se é você
mesma. Eu não reconheço a Viridiana assim, quase nua, submissa, como uma
cachorrinha... Você pode me entender... sem gritar comigo?
Viridiana engoliu em seco. E, afinal, acenou
positivamente com a cabeça. E levantou, em pé, junto comigo.
- Está bem. Acho que estive exagerando. Acho
que estou desenvolvendo sintomas de bipolaridade, acho que é o vinho, eu...
(soluço) Que piada, uma psicóloga bipolar, ah, ah... (soluço) Está bem, vou te
deixar em paz... por enquanto. Vou tentar esquecer que estou apaixonada por
você... (soluço) Eu... vou tentar não encarar isso como um fora, só como um...
“vamos dar um tempo”. (soluço)
- Ah, agora está pensando como uma garota
racional. – sorri.
- Mas você... não pode me evitar para sempre,
Macário. (soluço) Vou para meu alojamento, mas pode crer que eu voltarei. Você
não saberá de que forma eu voltarei, mas eu volto. (soluço) Vai depender do meu
estado de espírito. Mas... – e se levantou, e me encarou, apontando o dedo para
mim. – Mas da Valtéria você nunca mais vai se aproximar. (soluço)
- Quem disse que eu estou a fim de me
aproximar da Valtéria, mulher? Talvez só para ver se ela está bem, está
retomando a vida, mas não do modo que você está... pensando.
- Que bom que entendeu. (soluço) Eu vou,
Macário. Mas eu volto. – ela me disse com aquele sorriso terrível do bar.
Engoli em seco.
- Vou ver se sua roupa já está seca.
- Obrigada. Ah, Macário... (soluço) Posso te
pedir uma coisa antes?
O quê?! Não me diga que ela quer mais...
- Deixa eu ver as marcas no teu pescoço, que
eu não vi direito?
Marcas no... ah, eu praticamente já não
lembrava mais das marcas de mordida em meu pescoço. Com toda essa confusão, até
esqueci da mordida do “vampiro”. Até esqueci que ainda tinha aquele curativo em
meu pescoço. Não caiu ainda, como o que eu tinha no nariz, e acabou dando um
susto nos clientes do bar, na noite passada.
Acho até que já dá para tirar. Me aproximei,
Viridiana descolou o curativo cuidadosamente.
- Credo, Macário. O que foi que mordeu você?
- Eu que pergunto.
- Mas não creio que essas mordidas sejam de
animal, Macário...
- Hum?
- Essas marcas não parecem de dentes. Eu já
fui mordida por um cachorro uma vez, e por uma cobra noutra vez, e graças a
Deus sobrevivi para contar (soluço) e sei que essas marcas não são de dentes...
Fui até o banheiro. Examinei o pescoço no
espelho. As marcas já se encontravam plenamente cicatrizadas, mas as marcas nem
pareciam mesmo de animal. Pareciam mais marcas de agulha de injeção, como se eu
tivesse tomado vacina pela jugular. Quer dizer, em uma primeira olhada eu havia,
sim, constatado isso, mas não tinha certeza se minha mente estaria na verdade
distorcida pelos acontecimentos. Teria sido mordido por um vampiro mesmo? Será
que os vampiros tem, na verdade, caninos finos como agulhas, e...
- Essas marcas não doem, Macário? – Viridiana
me pergunta, atrás de mim.
- Não. Não sinto nada quando toco. –
respondi, olhando sempre para o espelho. – E já faz quase uma semana que
aconteceu, então já está curado.
- Deixa eu ver melhor.
Mais que olhar, Viridiana se aproximou,
encarou um momento e avançou no meu pescoço, bando um beijo com “chupão” em
cima de minhas marcas. Levo um grande susto.
- Vi?!
- Desculpe, Macário. Eu... não resisti. Quem
sabe eu não faça marcas de mordida autênticas no teu pescoço agora, hein? Ah,
ah... (soluço)
- Não teve graça. – respondi, indignado.
- Ah, a propósito... isto é seu?
E me mostrou o apanhador de sonhos do índio.
Eu estava esquecendo isso também.
- De onde você ganhou... Ah, a Valtéria
contou, lembrei. (soluço) Então é verdade que você salvou um índio de ser
agredido por bandidos? Então está explicado. Isso ajuda a reformular ideias a
seu respeito, meu doce Macário...
- Me devolve isso, por favor. – pedi,
envergonhado.
- Só se houver uma “saideira”.
- Saideira? Você... você disse que ia me
deixar em paz, Vi.
- Sim, mas... Ah, Macário, só mais uma antes
de ir embora, Macário... Por favor... Só mais uminha... (soluço) Aí eu te deixo
em paz de vez... Por favor... (soluço)
Viridiana estava certa a respeito de si
mesma. Ela apresentava sintomas de bipolaridade. E já vi que vou ter de fazer
sua vontade, ou ela ia ficar com o apanhador, a lembrança que ganhei do pajé
Mateus.
Ela me enlaçou e me beijou. Por algum motivo,
comecei a ficar mais à vontade. Sentia o desejo voltando. Acho que agora dará
certo. Devia ser a certeza que aquela seria a última do dia.
Viridiana me soltou um instante, e ela mesma
colocou o apanhador do meu pescoço, como se estivesse me colocando uma medalha
olímpica. E me enlaçou de novo.
- Isso fica muito bem em você, sabe?
Afastei ela um pouco, para tirar o apanhador
do pescoço e apoiá-lo na pia do banheiro.
- Macário?
- Vou tomar um banho para ir pra aula. E acho
que não posso deixar isso molhar. Quer... tomar banho comigo antes de colocar
sua roupa?
- Eu quero, Macário, quero te ver pelado de
novo... (soluço) – ela disse, lascivamente, colocando os óculos junto com o
apanhador.
Minhas calças foram para o chão. O avental de
Viridiana também foi ao chão.
Levei ela para o box do chuveiro.
E fizemos, embaixo do chuveiro, eu e ela
beijando nossos corpos molhados. Do mesmo modo que fiz com a Valtéria, naquele
domingo. Sem a camisinha, mas consegui tirar antes.
E fiquei contente em ver que a Viridiana
ficou satisfeita, agora sim ficou satisfeita. Estava mais calma, mais serena.
Eu estava tão calmo quanto ela. Talvez fosse
disso que eu estava precisando para me acalmar.
Ou talvez eu que estivesse despertando
sintomas de bipolaridade também. Não sei de mais nada...
Só sei que, depois do gozo, fiquei ali,
naquele box, de joelhos, por longos minutos, olhando para o corpo nu de
Viridiana, a água do chuveiro caindo e escorrendo por cima dela, e ela também,
ajoelhada, ficou me encarando, apaixonadamente, com o corpo molhado. Por alguma razão, eu
gostei daquela visão, como se Viridiana estivesse tendo sua cabeça banhada pela
ducha de uma cachoeira. Tão bonita. Uma ninfa dos rios. E o piercing no umbigo
estava desimpedido para meu deleite... Uma ninfa de piercing, que legal.
Mas eu disse que não íamos namorar agora.
Primeiro, quero deixar baixar a poeira de toda essa loucura.
Mas vamos dar um tempo, Vi... Vamos dar um
tempo...
Fiquei contente que afinal acabou.
Viridiana saiu do chuveiro, pegou a roupa do
varal, se vestiu, me deu um beijo de despedida e foi para o seu alojamento, sem
olhar para trás.
Eu respirei aliviado.
E fui me preparar para ir para o curso. Resolvi
trocar a calça, vou sair com essa que a Viridiana pegou emprestada de mim. Pelo
menos eu já estava jantado. E estava me sentindo mais tranquilo, sabendo que a
D.R. (discussão da relação) deu certo desta vez.
Quem sabe não era disso que eu estava
precisando? De uma sessão de sexo para descarregar a tensão?
Mas estava preocupado. E se Viridiana
voltasse? E se, quando voltasse, ela voltasse a ser aquela garota “barraqueira”
do hospital? E se ela estivesse me armando, na verdade, uma armadilha? Estava
apreensivo por causa dessa bipolaridade dela. E pela possibilidade de eu também
estar despertando uma bipolaridade.
Na volta eu ajeito o apartamento de novo.
Havia sinais de bagunça, louça suja na pia, manchas de vinho no chão. Mas tinha
de ir para a aula.
E fui. O dia de curso não teve maiores
problemas, transcorreu normalmente.
Naquela noite teve lição de anatomia prática.
Mas isso eu conseguia suportar perfeitamente, a visão de um cadáver humano
cortado, seccionado, cada órgão separado e analisado. Faz parte de ser
estudante de medicina, faz parte da vida de um (futuro) médico.
O cadáver usado hoje era de homem, e tinha
marcas de acidente – cortes retos e profundos, como feitos por lâminas. O
professor disse que as ferragens do carro em que se acidentou haviam feito um
estrago em seu corpo. O “paciente” morreu na hora. Alguns de seus órgãos foram
doados. Mas havia partes aproveitáveis para nosso estudo.
Olhando o cadáver, lembrei de Valtéria, o
corpo enfaixado, cortado.
Engoli em seco ao pensar na possibilidade de
alguma das garotas com quem saí ser, de repente, a próxima a estar ali, naquela
mesa, sendo cortada, esquartejada, tendo seus órgãos retirados para fins de
estudo. A possibilidade de eu estar assistindo, tendo de ver a pobre garota
sendo cortada por bisturis. E a possibilidade de ela estar ali... por minha
causa.
Deixei uma lágrima rolar. Que sorte ninguém
ter visto.
Por que me ocorreu tal ideia?!
Horas depois, ali estava eu, na rua, andando
a caminho do bar, com aquele ar despreocupado de sempre.
No caminho, ali estava o beco onde, na noite
passada, Viridiana e eu fomos cercados pelos cães ferozes. Resolvi dar uma
olhada...
E estava tudo diferente. Não havia mais
marcas de sangue, nem os pedaços de carne, nem o cheiro forte. Mas tampouco
barreiras policiais. O local já foi lavado, limpo. Nem lixo havia sido
depositado ali, ainda. Só uma lata de lixo vazia. De igual à noite anterior, só
a lâmpada esquecida acesa, iluminando o local.
Que sensação esquisita. Teria sido tudo um
sonho?!
Procure não pensar nisso, Macário. Vá para o
trabalho. Siga suas próprias recomendações.
Talvez os “monstros” hoje apareçam, e vão
querer que você os atenda... Você não pode decepcioná-los...
O próximo capítulo sairá dentro de 15 dias. Ainda não foi possível resolver todos os assuntos que deixei pendentes, mas até final de maio vai!
Oh: tem update na série. Uma nova ilustração foi acrescentada ao capítulo 5! Acessem aos capítulos anteriores para conferirem as atualizações que saem no sentido de melhorar a história!
Enquanto isso, a novela e a vida não podem parar. Como está a novela até aqui: continuo? Paro, mesmo sem chegar a uma conclusão? Permaneço sem o feedback?!
Até mais!
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