Conforme prometido na segunda-feira passada, quando publiquei com atraso o último episódio de meu folhetim ilustrado para adultos, MACÁRIO, nesta segunda-feira, sete dias depois, para acertar, coloco no ar um novo episódio. A novela já está chegando na metade...
ATENÇÃO: leitura não recomendada para menores de 18 anos. Contém cenas de chantagem emocional, constrangimento, consumo de bebidas alcoólicas e sedução.
Um pouco emburrado, mais por causa do modo
como havia sido acordado naquela tarde de domingo, preparei café para mim, na
nova cozinha. Era meu primeiro desjejum no apartamento novo. Em plena tarde de
domingo.
Era meu primeiro domingo no apartamento novo,
e fui bruscamente acordado por meu novo companheiro – Lúcifer, vulgo Luce, o
vampiro. Eu e minha amante naquele momento, Andrômeda, aliás, fomos acordados
bruscamente em pleno domingo à tarde.
Devia ter imaginado que Luce estaria disposto
a fazer festas particulares em nosso novo apartamento. E ele já estava
organizando uma para aquela noite, mesmo.
Meu despertador marcava quatro horas da tarde
quando fui acordado.
Depois de terminar meu desjejum na cozinha
nova, ainda me acostumando à minha nova moradia – que diferença da minha antiga
cozinha – eu me dirigi à sala. Luce assistia televisão sentado no sofá,
tranquilamente, pantufas nos pés. E, pelo barulho que vinha do banheiro,
supunha que Andrômeda estivesse no banho.
- Ei, Macário. – Luce, sorridente (oh, como eu
odeio aquele sorriso), me cumprimentou. – Que está emburrado aí?
- Eu estou emburrado? – respondo com um
acento de ironia.
- Ah, Macário. Você parece que não dormiu
bem, apesar da companhia da Andrômeda! Não foi bom com ela?
- Não foi por isso. Foi por causa do susto de
agora há pouco.
- Pô, Macário, desculpe se te acordei daquele
modo... – ele se levantou do sofá e parou na minha frente, com uma expressão de
quem estava querendo pedir perdão, mas não estava sinceramente arrependido. –
Sei que você teve uma semana atribulada... E que você deve estar contrariado de
estar dividindo o apartamento com o cara que há umas duas semanas te fez de
saco de pancada...
- Eu não estou contrariado, Luce...
- Ah, Macário, não fica bravo comigo... –
Luce fez um olhar pidonho de criança esperançosa. Que ridículo. E eu já estava
começando a odiar aquele olhar tanto quanto o sorriso.
- Pare com isso, Luce!...
- Sei que não tenho sido um bom menino
ultimamente, mas não fica bravo comigo, Macariozinho... Por favor...
- É sério, Luce, eu não estou bravo. – Mas
meu cenho franzido não estava convencendo, decerto. – Só estou me acostumando
mal a essa nova vida.
- Bem, eu sei, Macário. Não está sendo fácil
para você lidar com essas mudanças todas... Dois rapazes morando juntos, e você
estava acostumado a morar sozinho, a...
Interrompi, fazendo gesto com a mão.
- Luce, por favor. Chega, tá?
- Ah, está bem, Macário... Se você não está
mesmo bravo comigo, eu acredito. – Luce desta vez fez muxoxo.
- Ainda bem...
- Mas desfaz essa carranca, Macário. Ficar
emburrado não combina com você... Rosto entediado não combina com um garçom.
Vamos, rapaz, sorria. Se descontraia!
Tentei relaxar. Respirei fundo. E tentei
sorrir. Tentei dar um sorriso sincero, mas sentia que só conseguia sorrir
amarelo.
- Ah, garotão, está melhor agora. – Luce
pareceu se dar por satisfeito. – Vamos, hoje teremos festa. Não é razão para
ficar emburrado.
E Luce voltou a sentar no sofá e sua atenção
para a tevê. A minha televisão, aliás. Mas a mesinha onde a televisão estava
era de Luce. Mas o sofá onde ele estava sentado também era meu.
- Não quer sentar, Macário? – convidou Luce,
batendo no assento livre do sofá.
- Hm... agora não. Eu ainda vou me ajeitar,
e... E quem você convidou para o festa de logo mais, Luce? – perguntei, mais
descontraído.
- Ah, não convidei muita gente, não... Não
vai caber todo mundo, o apartamento ainda é pequeno. Então só convidei os
principais do nosso grupo. Sabe, a Âmbar, o MC Claus, o Jorge Miguel, o
Breevort... Os principais.
- Os Animais de Rua não?
- Hoje não. Nem a Fifi, aquela sua amante
baixinha...
- E os Dinossauros que Sorriem?
- Só o Flávio Dragão. Mas se quiser que os
outros venham, eu aviso eles...
- N-não, não precisa. Só perguntei...
- Hum.
- O Breevort?
- Esse vem. Mas pedi para ele vir sozinho.
Aquela tua amiga não vem.
- A Geórgia? Ah.
- Melhor que ela não fique sabendo do seu
novo endereço, por enquanto. Sabe, né?
- Sei. Aquele lance de manter segredo... E o
outro Flávio? O Urso?
- Esse vem. E, olhe ali, Macário, já providenciei
parte da bebida por causa dele.
E apontou, para um canto da sala, para alguns
engradados de cerveja em lata ali empilhados.
- Espero que seja o suficiente.
- O que deve ser o suficiente? – pergunta uma
voz feminina.
Andrômeda, o corpo enrolado em uma toalha, os
cabelos prateados brilhantes de úmidos, entra na sala.
- A cerveja para o Flávio Urso. – Luce
respondeu, sem se alterar. – E você, vai ficar para a nossa festa, mana?
- Vou. – Andrômeda responde, franzindo o
cenho. – Claro que vou. Depois eu vou para casa.
- Que há, Andrômeda, parece tão apreensiva. –
Luce deu outro daqueles sorrisos.
- Apreensiva, eu? Por quê?
- Não gosta da ideia de eu promover uma festa
aqui no apartamento?
- Mas você não pretende fazer uma “daquelas”
festas, né?
Xi, do jeito que ela falou, o Luce deveria
estar mais acostumado a promover festas “de arromba” – não que eu já não
tivesse uma ideia pelo que ele já havia promovido no bar onde trabalho.
- Como assim, irmã? Aqui não dá, você vê
muito bem. Acha que eu sou idiota? Eu só convidei o pessoal do círculo
principal. Esses se comportam muito bem nas festas. A gente só vai tomar umas
bebidinhas juntos, comer uns aperitivos, e ouvir uma música em volume que não
incomode os vizinhos.
- E o Marto Galvoni? – insistiu Andrômeda.
- Ele não quis vir. – Luce amarrou a cara. –
Disse que tinha outro compromisso. Fica para outra oportunidade...
Decerto Luce queria muito que o Marto Galvoni
viesse. Ele era fã do pintor italiano que também estava envolvido com Geórgia.
De repente, tive um mau pressentimento. E se o Galvoni aproveitasse que o
Breevort não estivesse na companhia de Geórgia, e resolvesse...?
Olhei para o meu retrato pendurado sobre o
sofá. Impressão minha ou eu, naquele quadro, arqueei uma sobrancelha?!
- Ponha uma de suas melhores roupas, irmã. –
continuou Luce, abrindo de novo o sorriso. – Afinal, vamos comemorar a mudança
do nosso Macário aqui. A partir de agora, ele faz cada vez mais parte da nossa
vida. Da sua, principalmente.
- Espero mesmo que seja uma festa bem comportada,
viu, Lúcifer? – Andrômeda adotou um tom de repreensão, parecendo uma mãe dando
muitas recomendações ao filho. – Lembre-se, estamos no quinto andar de um
apartamento. E aqui, só o Macário sabe nossa verdadeira condição. Tome muito
cuidado, viu? Nenhuma gracinha que nos revele demais!!
- Está bem, irmã... Gracinha que nos revele,
você diz, como esta?
E puxou, rapidamente, a toalha do corpo de
Andrômeda. Esta, rapidamente, cobriu a nudez com as mãos, enquanto Luce ria, e
eu arregalava o olho.
- Ora seu sem-vergonha, tarado, seu!...
- Vem pegar sua toalha de volta, vem!...
E Andrômeda, nua, e soltando palavrões
cabeludos, começou a perseguir um risonho Luce pela sala, ambos correndo em
círculos pelo tapete. Os dois pareciam duas crianças. Eu, pelo menos, estava
achando a cena divertida. E não me sentia incomodado, afinal, eu estive vendo
Andrômeda nua há horas atrás. Aliás, eu a tinha nua nos meus braços. E acho que
já estava me acostumando em ver a gostosa ali pelada. Me retirei discretamente
para a cozinha, deixando os dois discutirem.
Quase nove horas da noite.
Eu no meu quarto, banho tomado, barbeado, olhando-me
no espelho do meu roupeiro. Eu abotoava minha camisa de flanela xadrez. Esta
era parecida com a camisa que eu usava na ocasião em que esta história começou.
Eu ainda tinha, no armário, a camisa que eu usava na ocasião em que salvei o
pajé Mateus e depois fui atacado por Luce pela primeira vez, mas ela não estava
em bom estado.
Em um canto, lavada e dobrada, estava a
trouxa de roupa que um dos companheiros do Flávio Dragão me emprestara, naquela
noite em que os Carniceiros atacaram a mim e aos Animais de Rua. Se eu lembrar,
eu as devolverei para o Flávio devolver ao Rosauro.
Não tinha como escapar. Afinal, eu fiz um
pacto. Agora eu, um humilde garçom que trabalhava de madrugada, ia fazer parte
do círculo dos Monstros. Eu me sentia como se tivesse entrado para a Maçonaria,
ou para uma dessas sociedades secretas.
Pressionei o peito com a mão espalmada, para
sentir o apanhador de sonhos do pajé Mateus sob a camisa. Aconteça o que acontecer, me proteja, Mateus.
Acho que toda a sorte que tive de sair vivo
de uma série insana de eventos, até hoje, se devia àquele apanhador de sonhos.
Já me considerando pronto, fui para a sala.
Ali estavam Luce e Andrômeda, já mais calmos, e igualmente prontos, vestidos
socialmente para receber os convidados.
- Pronto, Macário? – Luce pergunta,
simpaticamente.
- Eu estou. – respondi, sorrindo, mas
sentindo que aquele sorriso, na verdade, era amarelo. – E vocês?
- Eu estou pronta. – responde Andrômeda,
dentro do vestido que a fazia aparentar ser uma senhora. Mesmo em uma pequena
reunião, ela parecia querer aparentar ser uma mulher respeitável. Mas
dispensava a peruca, deixando o cabelo prateado esvoaçar.
- Eu também. – responde Luce, dentro da calça
e da camisa sociais. Perto dele, com minha camisa de flanela e da calça jeans,
eu parecia um desleixado office-boy em uma reunião de escritório.
- Agora, é esperar o pessoal chegar. – Luce
fala, com despreocupação. – Esta noite tem tudo para dar certo.
- Tanta preocupação para uma simples reunião
do pessoal. – Responde Andrômeda. – E ainda que cada um contribuirá com uma
cota de bebida.
- Ora, irmã. Se fosse você a organizar uma
festa, também ficaria obcecada que tudo corra bem, não? Se estivéssemos no
bar...
Luce parecia encarar a ocasião como se fosse
uma noite de Reveillon fora de época. Ele até deixara uma porção de petiscos
diversos sobre a mesa da cozinha, e pusera algumas champanhes dentro de um
balde com gelo.
- E querem ver vocês que eu adivinho, sem nem
olhar para aquela janela, quem vai chegar primeiro? – e apontou para a janela
da sala, e, de fato, ele estava longe dela. – Pois serão o MC Claus e a Âmbar.
E já estão subindo, e tocarão a campainha...
A fala de Luce acaba interrompida pelo som da
campainha. Ele levanta do sofá, de supetão.
- ...agora! Querem ver que são eles?
Tentei esconder minha expressão de ponto de
interrogação. De fato, estávamos no quinto andar, e só dava para ver quem
estava se aproximando do prédio se debruçando na janela e olhando para baixo. Decerto,
ele estava usando seus sentidos aguçados de vampiro para adivinhar quem estava
chegando. Seria dons premonitórios, ou...?
E não deu outra: eram mesmo MC Claus e Âmbar
que chegaram primeiro. MC Claus, com o casacão de pele, trazia nas mãos um
engradado com garrafas de, pelo que vejo, conhaque. Âmbar, ao seu lado, apenas
um casaco sobre as habituais roupas curtas.
- Sejam bem vindos ao nosso novo apartamento!
Estejam à vontade!
- E aí, Luce. E aí, Macário. – responde MC
Claus, com simpatia.
- Oi, Macário. – Âmbar me cumprimentou com um
sorriso, meio que ignorando a presença de Luce.
- E aí, Claus, não quis trazer a mulher?
Permita-me – pergunta Luce, pegando a caixa de garrafas. – Está sempre
acompanhado da secretária, e a esposa?!
- A Anfisbena teve um compromisso com uma das
irmãs – responde MC Claus – E só tinha a Âmbar aqui para me acompanhar. E,
sabe, ela só veio porque sabia que o Macário estava aqui. Que vocês vão passar
a morar juntos.
- Pois é, agora o Macário está cada vez mais
pertinho de nós. – responde Luce, já se dirigindo à cozinha, e pude notar que
seu sorriso tinha ficado amarelo. Decerto esperava que Anfisbena viesse
junto...
Mas só a presença de Âmbar já seria
suficiente. Ela sorria em minha direção – mas amarrava ligeiramente a cara
diante de Andrômeda e Luce.
- Então, é aqui que o Macário e você vão
morar agora... – fala Âmbar. – Até que o local é de bom gosto.
- Ora, Âmbar, você sabe que bom gosto é meu
segundo sobrenome... – responde Luce – E o local estará sempre de portas
abertas para quando você quiser aparecer, viu? Digo, vocês, o MC Claus e você.
- É, nada mau, mesmo. – foi a opinião de MC
Claus. – Mas é meio apertado, não?
Naturalmente, MC Claus considerava seu
próprio tamanho. Mesmo na estatura humana, ele ainda parecia bem grande, por
ser gordo.
Andrômeda trouxe cadeiras da cozinha, mas MC
Claus sentou no sofá, mesmo.
- Bem, fiquem à vontade, pois os outros não
vão demorar. – falou Luce, agindo como anfitrião. – Aliás, neste momento, o
Breevort, a Morgiana e o Beto Marley é quem tocarão a campainha... Atende para
mim, Macário, faz favor?
E a campainha, de fato, soou novamente. Fui
atender a porta. E, não deu outra: foram estes mesmos que entraram. Como é que
Luce estava adivinhando quem ia chegando?!
Breevort, usando aquele casaco de gola
felpuda; Morgiana, de calça jeans e uma camiseta que deixava o umbigo de fora;
e Beto Marley, ostentando as trancinhas dreadlock e os óculos escuros. Cada um
deles levando uma garrafa de bebida. Depois de cumprimentarem Luce, os três se
dirigiram diretamente a mim, Breevort, aliás, até abriu os braços.
- Oi, Breevort.
- Venha cá, amigão!! – e Breevort me deu um
abraço que me deixou encabulado.
- Não exagere, Breevort. – disse Morgiana,
amarrando a cara.
- Fala, Macário!! – cumprimentou Beto.
- E aí.
- Ooi, Macário. – foi a vez de Morgiana me
falar, meio encabulada, como que reprimindo a vontade de me abraçar – não o fez
por haver detectado a presença de Âmbar e Andrômeda.
- Oi, Morgiana. – respondi. – Não trouxe suas
irmãs?
- Hoje não. – ela respondeu, com um sorriso.
– Hoje sou só eu com meus amigos. A Cliodna e a Moira não podem ficar no meu pé
o tempo todo... Por que quer saber delas?
- Não, nada... era só para saber. Ultimamente
a Cliodna e a Moira tem acompanhado você, e...
Morgiana me interrompeu.
- Ah, Macário, esquece elas um pouco. Eu
mesma estou tentando fazer com que elas interfiram menos na minha vida, sabe?
- Ei, Macário! – interrompeu Breevort,
olhando em volta. – Local bacana vocês escolheram.
- Hã, obrigado. – respondi. – Mas ainda vou
demorar um pouco para me acostumar... E você e a Geórgia, como estão?
- Acho que estamos bem, obrigado. – responde
Breevort, sem jeito. – Espero estar fazendo tudo certo. Para agradar...
Xi, pelo jeito a competição com o Marto
Galvoni ainda estava acirrada. Depois tentarei saber de tudo com calma...
Os dreadlocks de Beto Marley pareciam estar
vivos, de tanto que se mexiam com seus movimentos de cabeça. Apesar de eu já
saber que aqueles dreadlocks, na verdade, eram cobras vivas. Mas todos, ali,
estavam mantendo suas aparências humanoides. Decerto, não iriam, em algum
momento, assumir as verdadeiras aparências. Mesmo que seja só eu, que conhecia
as verdadeiras formas deles, o único humano a estar ali.
Luce, vindo da cozinha, cumprimentou os
companheiros. E todos foram se cumprimentando, claro.
- Macário – pede Luce, levando as garrafas
trazidas por Breevort, Morgiana e Beto para a cozinha – recepcione o Flávio
Urso, o Flávio Dragão e o Jorge Miguel que estão chegando, sim?
Impressionante.
Mais impressionante ainda foi que foram estes
mesmos os próximos a entrarem pela porta, depois do toque da campainha. Flávio
Urso estava vestido socialmente, camisa e calça alinhadas, mas o cabelo e a
barba hirsutos; Flávio Dragão, com a mesma aparência de sempre, com o casaco
distintivo de sua gangue e o “smile” esculpido na nuca; e Jorge Miguel,
igualmente com a aparência de sempre. Sem comentários. E cada um, claro, com a
garrafa de bebida em mãos.
- Macário, como está? – cumprimentou Flávio
Dragão. – Tudo bem desde aquele dia?!
- Oi, Macário. – foi a vez de Jorge Miguel.
- Sejam bem vindos. – foi o que eu falei.
- Hah, eu não falei que eram eles?! – falou
Luce, vindo da cozinha. – E soube disso sem sequer olhar para a janela!
- Isso, gabe-se dos seus poderes
premonitórios, irmão. – ironizou Andrômeda. – Diz aí, está vindo mais alguém?
- Agora não. – Luce devolveu um sorriso
amarelo. – Estamos completos. O círculo principal.
- Como ele fez isso? Digo, de prever quem
estava chegando? – perguntei, discretamente, para Andrômeda.
- Pelo olfato. – Ela me respondeu, baixinho.
– Ele detectou o aroma de cada um à distância... vampiros tem sentidos
aguçados, sabia?
É, era só para confirmar o que eu desconfiava
que fosse.
Luce trouxe um toca-discos e uma caixa de
vinis de seu quarto. Um modelo meio antigo, meio moderno. Depois, pediu a um
dos convidados – escolheu Jorge Miguel – para que escolhesse e colocasse um
disco. E, logo, o vinil começou a rodar na vitrola, e assim criar o clima da
festa. O som saía perfeitamente. E, puxa, que diferença era ouvir, de um disco
de vinil, uma música que até então você ouvia em CD.
- Ah, que boa escolha, Jorginho. E aí, bebem
alguma coisa? – pergunta Luce.
- Tem que ter bebida! – exclamou Breevort. –
Afinal, trouxemos bebida!
- Sai um tira-gosto, enquanto o Macário
prepara os drinques para nós? – pergunta MC Claus.
- Positivamente! – fala Âmbar. – Que seja o
Macário a nos preparar drinques como no bar!
- Já que ele está aqui, que utilize o talento
que ele utiliza no bar! – falou Flávio Dragão.
- Macárrio é quem faz a fêsta ganharr alma...
– fala Flávio Urso, com poesia.
- Vamos lá, Macário... – pede Morgiana.
Ah, algo dentro de mim já me dizia que eles
iriam me alugar esta noite. Sabia, de alguma forma, que eles iam pedir para que
eu fizesse os drinques.
Mas, resignado, eu fui. Dirigi-me à cozinha,
sob os olhares dos outros. E não é que o Luce já havia deixado tudo preparado
para mim em cima do balcão? Tábua de cortar, faca, liquidificador, limão, tomates
para o bloody mary, formas de gelo,
coqueteleira, recipiente com sal, taças e copos. Até um avental já estava
preparado. E, claro, as garrafas que cada um trouxe. Diferentes variedades de
bebida – conhaque, uísque, vermute, licor...
- Oh, Macário! – Flávio Dragão chamou minha
atenção. – Não esquece de acrescentar isto aqui ao meu drinque!
E, de dentro do casaco, sacou um maço de
ervas. Achei que eram aquelas ervas esquisitas que ele me fez colocar na bebida
que preparei naquele dia para os Dinossauros que Sorriem, mas era um maço de
hortelã, simplesmente. Ah, hortelã dava um sabor especial para qualquer drinque.
Porém, o licor que ele trouxera era verde, como aquela substância verde que ele
me fez usar...
Bem, pus as mãos à obra, enquanto Luce e
Andrômeda já começavam a passar os tira-gostos, enquanto os convidados
começaram a conversar entre si. Fora o som não muito alto, o clima já era
semelhante ao do bar.
E eu já sabia qual bebida era de qual, pois,
tal como no bar, eu recebia os pedidos telepaticamente. O pessoal não tinha com
o que se preocupar.
À medida que iam ficando prontos, os drinques
eram servidos por Luce. E já fui recebendo os primeiros elogios aos meus
drinques. “Aah, ótimo, como sempre”. “Macário sempre caprichoso”. “Sempre
prestativo, nosso caro Macário”. “Nunca nos deixa na mão”. E por aí vai.
Os convidados se revezavam na escolha do
disco e da música seguinte a ser tocada no toca-discos. Assim que o disco
acabava, Luce chamava um deles aleatoriamente, este ia para a caixa, escolhia o
disco e colocava para tocar. E, ao que parecia, todos eram entusiastas em
garimpo de sebos, à procura de vinis antigos e clássicos. Sob a companhia de
Luce, acho que acabarei me atualizando em música antiga – jazz, blues, rock n’
roll, samba de raiz.
Rapidamente, em menos de uma hora e meia, as
bebidas trazidas pelos convidados acabaram, apesar de sermos em onze, e
consequentemente os drinques, só restando as cervejas para tomar com os
tira-gostos. E aquelas champanhes no balde com gelo. A festa já estava
evoluindo, com todos já rindo alto, contando piadas, e o assunto mais frequente
das conversas que captei era justamente sobre o apartamento.
- Ei, já acabou a bebida, Macário?
- Nossa, já bebemos tanto assim?
- Arrout! Pardon...
- Não tem mais drinques?!
- Já acabaram as bebidas dos drinques! –
exclamei.
- Ah, mas que chato!...
- Então, Macário, junte-se a nós!
- Vem pra sala!
- Já o exploramos bastante, não?
- É, esta festa deveria ser para comemorar a
mudança do Macário...
- Vem, Macário, aproveite conosco!
Não me fiz de rogado, juntei-me ao pessoal.
Nesse momento, Luce abriu uma champanhe. E serviu a todos – incluindo eu.
E chamou todo mundo para um brinde.
- Pessoal, brindemos o início de um novo
estágio de vida para o nosso bom e prestativo Macário! Um brinde a um futuro
que promete ser glorioso, agora que ele está perto de nós!
- Hã... Ao futuro! – puxei o brinde.
- Ao futuro! – todos exclamaram.
E todos batemos as taças.
Com a minha inclusão na festa, parece que
agora, sim, valeu a pena. A animação dos convidados aumentou.
- Sua vez, Macário! – disse Luce. – Escolhe
um disco! Ponha uma música para dançarmos...
Nunca tive a iniciativa de escolher a música
do jukebox lá do bar, agora eu estava meio apreensivo em fazer a escolha de um
disco numa vitrola... Mas tudo bem. Remexendo na caixa de discos, achei um
vinil de rock clássico, ao que parecia, e pus a tocar. E parece que agradei...
E a animação continuou até... que horas são
agora? Acho que perdi a noção das horas...
Era quase uma da manhã quando todos se
despediram.
Puxa, achei que a festa tinha durado bem
mais... e olhe que eu não bebi tanto quanto os convidados.
O pessoal, sim, que ficou muito alto, eu pude
constatar.
Mas ninguém assumiu a sua forma monstruosa.
Nem Breevort, nem um dos Flávios, nem MC Claus...
E não houve sequer pegação. Bem que as
garotas tentaram, mas os rapazes cobravam muito minha atenção.
Inclusive Breevort que, sob influência da
bebida, desabafava muito. Ouvi ele falar quase o tempo todo de Geórgia. “Estou
com medo, Macário... medo de não estar agradando... eu nunca conheci uma garota
como ela... não quero perde-la... Aquele velho italiano não vai vencer, ah,
não...” é o que eu consigo lembrar que ele falou. Fiquei com pena dele. Apesar
da aparência agressiva, Breevort se mostrava um rapaz de sensibilidade. É,
começo a acreditar que não foi ele quem decepou a orelha do menino Maicon...
Os outros também deram seus desabafos, mas
não lembro de muita coisa que eles disseram. Lembro mais, também, dos desabafos
de Morgiana. Ela reclamava muito da marcação das irmãs sobre sua vida, algo
assim. E olhe que ela bebeu, na verdade, moderadamente. E uma coisa que reparei
ainda: Flávio Urso, entre um trago e outro, entre um arroto e outro (e era uma
atração à parte, o festival de arrotos monstruosos do Flávio, apesar dos
protestos das mulheres), não tirava os olhos de Morgiana. Decerto, estava mesmo
interessado na morena.
Mas tanto Morgiana quanto Âmbar me olhavam
com segundas intenções. Decerto, já tinham um plano terrível para mim.
Principalmente Âmbar – e não duvido que ela estivesse planejando invadir meu
quarto durante a madrugada.
Mas todos, ao fim, foram embora. Levemente
(?) bêbados. As garrafas todas vazias. As latas de cerveja todas vazias. Mas
tinha quem aguentava firme. MC Claus, por exemplo, saiu amparando a beberrona
Âmbar, que novamente mal se sustinha em pé.
O estranho foi o súbito desaparecimento de
Morgiana. Ela foi a primeira a ir embora. Ela resolveu sair à francesa, quando
todos estavam distraídos? Um momento de distração, e ela havia desaparecido.
Nem ouvimos a porta da saída abrir e fechar! Mas por quê ela foi embora?
Andrômeda voltou para a casa dela.
Simplesmente se transformou em morcego e saiu voando pela janela. E um morcego
bêbado, voando com dificuldade, aliás.
Espero que não tenhamos chamado a atenção dos
vizinhos do prédio.
Mas tive de ajudar Luce a ir para a cama, tão
bêbado ficou com não sei quantas doses de bloody
mary. Ele fez questão. A arrumação do apartamento ficaria para o dia
seguinte – e eu sabia que ia ficar por minha conta juntar as latas vazias, as
garrafas, os restos de petisco.
Mas eu também precisava digerir o álcool que
consumi. Só fui para o quarto, tirei minha roupa e caí na cama.
Amanhã começava mais uma semana. Faculdade e
bar. Bem, como seria, agora que o principal promotor das festas no bar morava
junto com o garçom?
Depois eu penso nesse assunto... agora o que
me interessa mesmo é dormir até a tarde do dia seguinte, neste meu quartinho
novo. E sem sexo hoje, nem no plano real, nem no dos sonhos – nada de portais
mentais hoje. Hoje, só dormiiiirrr...
Aah, mas quem disse que eu ia conseguir
dormir hoje?
Ouvi um barulho de porta abrindo que quase me
despertou. Tem alguém no meu quarto. Mas vou fingir que ainda durmo...
Certamente é a Âmbar. Ela entrou pela janela
do banheiro, na forma de louva-a-deus, e agora estava no meu quarto. Aah, eu
sabia que a gostosa não ia perder a oportunidade de se aproveitar deste pobre
corpo cansado, no meu novo apartamento, mesmo sob o risco de acordar Luce.
Essas mulheres não tem pena de mim... mas
tudo bem que era a Âmbar, que me amava. O MC Claus disse que não tinha
problema...
De olhos fechados, constatei que ela estava
tirando a roupa. Decerto, ia me surpreender, nua. Ia falar baixinho no meu
ouvido...
- Macário, está dormindo?
Já ia abrir o olho. Mas ela cavalgou em mim,
senti ela sentar sobre minha barriga.
Aí abri o olho, e já ia surpreender Âmbar nua
sobre mim, e...
Levei um pequeno susto.
Sob a luz da luminária de cabeceira acesa,
contemplei que...
Não era Âmbar. Era Morgiana!
- Acordou, hein? – ela sorriu para mim, com
aqueles dentes afiados.
E ela não estava nua: não totalmente. Estava
usando a minha camisa!
- Elas acharam que iam se livrar de mim,
aquelas sirigaitas. Que iam me deixar de fora. Que iam ficar com você só para
elas...
- Mas... como entrou aqui?
- Vocês pensaram que eu havia ido embora sem
avisar, não foi? Não fui não. Eu me escondi no banheiro.
- Se... se escondeu?! Mas por quê?
- Ainda bem que já estava quase todo mundo
bêbado. Senão teriam notado que eu não fui embora... Claro que foi para te
pegar dormindo, Macário.
- Mas Morgiana...!
- Mas nada, Macário... As peitudas já se
aproveitaram bastante de você. Agora sou eu quem vou me aproveitar. E vamos
curtir sem irmãs para atrapalhar.
- Mas Morgiana...!
- Mas nada, Macário... Olhe, eu resolvi
experimentar a sua camisa que você deixou largada. Ficou bem em mim, não ficou?
E dava para ver que ela estava sem nada por
baixo!
E que ela ainda estava levemente tonta de
bebida.
- Em que plano estamos? O real ou o do portal
mental? – perguntei.
- Não sei, Macário... o que você acha?
Bem, ao meu redor, ainda parecia ser meu
quarto novo.
- Oh, Macário... – Morgiana exclamou, com
tristeza. – Por que só as peitudas? Por que aqui no plano real, só a Âmbar e a
Andrômeda? Por que eu não?! Logo agora que consegui dar um jeito de sair da
vigilância das minhas irmãs, e das outras garotas... por que não eu, Macário?!
- Não estou dizendo que você não pode,
Morgiana. Só fiquei surpreso dessa sua ideia, e...
- E vai me dizer que ontem à noite já
cansaram você? Foi a Andrômeda, não foi? Afinal, ela veio ajudar você com a
mudança, não é? Pensa que não sei que foi com ela, aquela gorducha? E á não
bastou você ter pegado a Âmbar também, que eu sei?
- Não é isso, Morgiana, é que...
- Não minta, Macário... olha só, eu já estou
sentindo o seu “passarinho” desperto, ó, ó...
De fato, sua bunda estava fazendo pressão no
“bernardão”, ainda que ele estivesse sob o cobertor da cama. E ela ainda
esfregava a bunda ali... Oh, isso era bom, era sim...
- Sei que você quer. Não pode mais dormir sem
uma “farra”...
- Ai, Morgiana, eu só não esperava que fosse
você... Eu achei que fosse a Âmbar...
- Aí, não estou dizendo?! Sempre as
peitudas...
- Pensei que ela tivesse invadido meu
apartamento... ela que pode se transformar em inseto para...
- Ah, não teria como, Macário... você viu que
ela bebeu todas... ela agora está bêbada demais para tentar algo contra você...
Já eu, olhe para mim... eu não estou de ressaca. Deu para me recuperar um pouco
enquanto estava escondida... Aah, Macário... vem...
E ela me beijou.
Eu não estava mais conseguindo resistir.
Oh, céus... outra noite de sexo sem que eu
esperasse.
Sou um cafajeste, mesmo.
Morgiana tinha razão, não posso mais viver
sem isso.
E agora ela já desabotoava a camisa, e a
abria para eu ver seu corpo nu...
Sereia veneno, você tem um jeito sereno de
ser...
Agora, o próximo episódio será publicado dentro de 15 dias, se eu não mudar de ideia no transcorrer da semana.
Até aqui, como está ficando? Está bom? Ruim? Precisa mudar? Continua como está? Deve parar em um ponto qualquer?
Manifestem-se nos comentários! Ou continuarei fazendo o que me der na telha...
Até mais!
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