Hoje, volto a falar de quadrinhos. E, tal como fiz algumas vezes antes, vou criar, aqui na internet, uma referência confiável sobre um assunto que não tem muitas referências na internet. Porque eu sigo um preceito próprio: se você não consegue encontrar uma referência confiável na internet, crie uma!
E o assunto de hoje é uma revista em quadrinhos quase desconhecida, praticamente esquecida, e da qual não existem muitas referências na internet. É antiga, de uma série que praticamente não deu certo.
Chega de embromação: o assunto de hoje é o gibi OS PERIGOS DA JULLY PIG – DRÁCULA ATACA SÃO PAULO.
Encontrei este gibi durante minha última viagem a Porto Alegre, de férias, e vasculhando uns sebos de revistas antigas (pelo estado do scan da capa acima, vocês podem constatar que era velha mesmo - foi publicado há mais de dez anos atrás). A princípio, não ia levá-lo: mas algo me dizia para comprar este aqui também. Talvez pena por ser um gibi abandonado numa pilha de gibis empoeirados... ou mesmo por se tratar de um gibi brasileiro. E, quando o gibi é brasileiro, não posso recusar, mesmo que seja desconhecido.
Bão. Só pelo título, já sabemos que se trata de um gibi brasileiro. E ainda mais que traz um nome conhecido dos brasileiros na capa. E nada mais que isso.
Bem. OS PERIGOS DE JULLY PIG felizmente possui ficha catalográfica na segunda capa, que ajude a dar mais informações: foi publicado pelas editoras Maltese e Multi Gráfica em 1996. O texto e os desenhos são de Marcos Demetrius, com arte-final Wilson Delgado.
E o subtítulo já entrega: é uma história envolvendo vampiros. No caso, o mais pop dos vampiros, o Conde Drácula. O personagem literário de Bram Stoker não morre tão facilmente: sempre dá um jeito de votar à vida para aterrorizar os vivos, ainda mais os descendentes de seu algoz, o caçador de vampiros Abraham Van Helsing. Como neste caso.
O universo de JULLY PIG investe em um conceito que dá muito certo nos quadrinhos e desenhos animados: animais antropormofizados (com trejeitos e comportamento semelhantes ao o ser humano), convivendo com toda naturalidade com os próprios seres humanos, como se não fosse estranho humanos conversando com animais, você entendeu. O bicho antropormofizado do caso é a personagem-título, uma porquinha de cabelo Chanel. Ela tem como amigas Carlinha, uma coelhinha de cabelos loiros, e uma amiga humana, a modelo e atriz Luciana Vendramini. Podem acreditar: trata-se mesmo da atriz e modelo real, de mesmo nome, que é usada como personagem deste gibi (não dá pra dizer se foi com autorização da mesma). Aliás... não sabem quem é Luciana Vendramini? As gerações mais novas, que tem Gisele Bündchen como parâmetro, é claro que não vão lembrar dela. Mas, aos que quiserem conhecê-la, ou mesmo lembrar dela, visitem seu site pessoal: www.lucianavendramini.com.br/.
Voltando a JULLY PIG. Este gibi investe bastante nesse universo ficcional: a porquinha Jully Pig combatendo o Conde Drácula. Bem, vamos desde o início.
A história começa com um prólogo, relatando mais uma das mortes do Conde Drácula por Van Helsing – desta vez, incinerado pela cruz e pela luz do sol. Entretanto, um empregado dele consegue recolher suas cinzas e guardá-las.
Depois, a história avança para a São Paulo dos dias atuais (não podia faltar uma exposição de seus principais pontos turísticos, claro). Luciana é uma modelo em ascensão, que acabara seu namoro com Alex, um também modelo, mas delinqüente e de má conduta. Cego de raiva, o rapaz, para se vingar de Luciana, vai à mansão de um antepassado, na Serra da Cantareira, em busca de algo que o ajude em sua vingança. Na ânsia, acaba encontrando dois frascos com cinzas, um camafeu e um pergaminho. O tal antepassado de Alex era o mesmo empregado que recolhera as cinzas do Conde Drácula quando ele morreu; assim, Alex, informado através do pergaminho, através de um ritual com seu sangue e as cinzas dos frascos, devolve o Conde Drácula à vida. Em princípio, o Conde decide ajudar o rapaz em sua vingança; mas, ao ver fotos de Luciana, acaba reconhecendo nela sua paixão do passado. Sim: a grande idéia é que Luciana Vendramini é descendente da família Van Helsing. Por isso, o Conde suga o sangue de Alex e o tira de seu caminho.
Enquanto isso, o Sr. Laion, presidente de uma agência de modelos, está preocupado porque várias modelos suas estão migrando para uma agência rival. Assim, ele decide pedir a ajuda de July Pig para desvendar quem está tramando contra ele. Até aqui, não fica claro o que Jully Pig faz da vida, mas parece que ela faz bicos como detetive. Mas fica claro aqui a naturalidade de seres humanos convivendo com animais. É nesse momento que entra outro personagem: um modelo chamado Alucard, que pede emprego na agência de Laion – mesmo exigindo desfilar só à noite e seu flashes fotográficos. Alucard é, na verdade, o próprio Drácula disfarçado, que com esse ardil consegue se aproximar de Luciana.
Para desvendar a sabotagem na agência de modelos, Jully Pig combina de se passar por modelo. Na noite anterior ao desfile, Jully Pig decide ficar em casa, enquanto Carlinha e Luciana vão a uma festa com Alucard. De repente, Jully Pig acaba sendo atacada: Alex, que fora transformado em vampiro, invade seu apartamento à procura de Luciana. Jully Pig consegue acabar com Alex graças a uma sopa de alho que Carlinha deixara para o jantar. Entretanto, ela decide não contar o ocorrido para as amigas para não preocupá-las. Mas a porquinha suspeita de algo quando Carlinha mostra-lhes uma foto que tirara, na festa, de Luciana e Alucard dançando, e onde Alucard não aparece.
Chega o dia do desfile onde Jully Pig atuará infiltrada. E ela tem um palpite certeiro, quando uma pessoa da assistência coloca um pedaço de sabão na passarela para ela escorregar. E essa pessoa é Sabrina, a secretária de Laion, que na verdade trabalha para a agência rival. Porém, Sabrina se dá mal: ao tentar seduzir Alucard para a agência rival, acaba sendo mordida pelo modelo.
E o feitiço se vira contra o feiticeiro: o tombo de Jully Pig faz com que ela faça um sucesso inesperado.
Enquanto isso, Jully Pig, preocupada com os acontecimentos estranhos, decide fazer uma pesquisa sobre os vampiros. E, através de pistas inesperadas, acaba descobrindo que Alucard é o Conde Drácula. Agora, cabe a ela salvar a vida de Luciana. Mas o problema é que pode ser tarde demais...
Bão. Poderia ter sido uma série promissora e interessante. Mas desde a elaboração, JULLY PIG estava fadada ao fracasso. Não que o argumento fosse de todo banal e batido. O roteiro é que é um tanto mal conduzido. A trama das modelos é, na segunda metade da narrativa, totalmente abandonada em rol da caçada ao vampiro, e assim perde a razão de ser. E o que dizer da arte? Não é ruim. É interessante ainda porque foi toda pintada à mão. Mas há deslizes nessa parte, também. Principalmente a quadrinização, que ficou esquisita com o defeito de variação dos tamanhos dos quadrinhos à esquerda e à direita, tornando tortuosa a sequência de leitura da história. Os textos dos balões também são, em alguns momentos, inadequados. Sem falar que JULLY PIG parece ter sido uma das primeiras HQ brasileiras a ser balonada pelo computador, deixando o visual meio desagradável, contrastando os balões padrão dos programas de computador com a arte pintada à mão de Demetrius e Delgado.
Uma das principais virtudes da história foi o respeito às características bem conhecidas dos vampiros: eles são retratados como nós os conhecemos desde sempre, com aversão à luz do dia, alho, cruzes e estacas, e com sede de sangue. Dar fim ao Drácula vai ser mais difícil do que Jully Pig imaginava – ainda mais se tratando de uma porquinha “bonitinha” contra um vampirão experiente. E o final é surpreendente, mas que acaba caindo para o banal do “e foi tudo um sonho”. E pena ainda que Carlinha acabe perdendo importância dentro da trama: a coelhinha nem participa da caçada, junto com Jully Pig, ao Drácula. Bem, só lendo para entender.
Espero que, com esta postagem, possam vir mais informações sobre ela e seu autor. Praticamente não se sabe que fim levou Marcos Demetrius após a publicação desta HQ. E, para encontrá-la, só procurando em sebos. Não garanto que vocês vão gostar. Infelizmente, ainda é da época em que o quadrinho brasileiro era desacreditado pelos próprios conterrâneos – e com razão.
Mas, para encerrar, e como forma de homenagem a Demetrius, fiz uma ilustração especial com Jullypig e Carlinha. E do modo como ele fez com a história em questão: pintada à mão. Com lápis de cor.
E onde estará Luciana Vendramini agora? Quem souber nos informe.
Até mais!
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