terça-feira, 20 de janeiro de 2015

ASTRONAUTA - SINGULARIDADE - Um astronauta sozinho não faz uma missão...

Olá.
Hoje, começando para valer 2015 aqui no Estúdio Rafelipe, vou falar de quadrinhos, feitos no Brasil, de lançamento recente, de Graphic MSP.
O grande projeto dos Estúdios Maurício de Sousa, em parceria com a editora Panini, de colocar seus personagens estrelando histórias mais maduras e desenhadas por grandes revelações das HQ brasileiras recentes está não apenas limpando a barra das ditas HQ brasileiras como rendendo cada vez mais frutos. Cada anúncio de um novo álbum cria muita expectativa pelo que vem a seguir, e, o que pelas imagens e pela sinopse divulgada na imprensa não prometia muito, acaba surpreendendo.
Vamos relembrar: em outubro de 2012, veio o primeiro, Astronauta – Magnetar, de Danilo Beyruth; em maio de 2013, Turma da Mônica – Laços, por Vítor e Lu Caffaggi (até agora, segundo este que vos escreve, o melhor de toda a coleção); em agosto de 2013, Chico Bento – Pavor Espaciar, de Gustavo Duarte; em novembro de 2013, Piteco – Ingá, de Shiko, encerrando o primeiro ciclo de álbuns; e, em agosto de 2014, Bidu – Caminhos, de Eduardo Damasceno e Luís Felipe Garrocho, inaugurando o segundo ciclo. Todos colhendo elogios nos veículos de comunicação e por parte dos leitores.
E agora, em dezembro de 2014, saiu o mais novo álbum. Danilo Beyruth nos traz uma nova aventura do personagem que ele trabalhou anteriormente: ASTRONAUTA – SINGULARIDADE. Também pela Panini, e com edição do coordenador geral do projeto, Sidney Gusman.

Depois de Magnetar, Beyruth ganhou ainda mais projeção, além da que ele já havia conquistado com os álbuns do Necronauta e com Bando de Dois, e só em 2014 conseguiu emplacar dois projetos. Além de ASTRONAUTA – SINGULARIDADE, ele lançou, em dois álbuns lançados no mesmo ano, São Jorge, também pela Panini.
O álbum tem cores de Cris Peter, que também colorizou Magnetar, e que, em 2014, lançou um livro, O Uso das Cores, publicado através de financiamento coletivo na internet, pela Marsupial Editora.
A continuação de Magnetar já era bastante esperada, após o fim um tanto abrupto do primeiro álbum. SINGULARIDADE continua mais ou menos do ponto onde o primeiro álbum parou, e... peraí, vamos devagar.

ATUALIZAÇÃO DE INFORMAÇÕES...
Na postagem sobre Magnetar, eu já havia dado algumas informações sobre o Astronauta de Maurício de Sousa, a partir de informações que eu tinha a meu alcance. Pois, as indispensáveis páginas de extras de SINGULARIDADE dão algumas informações extras – e coisas que nem eu, nem outro leitor mais jovem, sabia, decerto. Quer dizer, não tenho conhecimento de alguém que tenha a coleção completa ou semicompleta de gibis da Turma da Mônica ou que compre, religiosamente, todos os gibis de linha da Turma da Mônica – o normal é a gente comprar, na banca, um ou dois dos que mais nos interessarem, até porque seria muito caro levar todos os gibis de linha, todos os meses, sabe, Mônica, Cebolinha, Cascão, Magali, Chico Bento e os almanaques! A menos que assinem os gibis para recebe-los em casa (não sei dizer agora se a Panini possui o serviço de assinatura de gibis da Turma da Mônica, tal como a editora que anteriormente publicava a linha, a Globo).
Assim, poucos são os leitores, e especificamente os mais antigos, que sabem o que vou relatar a seguir, e que influi bastante na trama do novo álbum.
O Astronauta estreou nas tiras e páginas dominicais do jornal Diário de S. Paulo em 1963. Ele tem uma nave e uma roupa espacial redondas, trabalha para a agência BRASA (Brasileiros Astronautas) e o grande sustentáculo de suas aventuras espaciais é a saudade dos entes queridos que deixou na Terra – os pais, os irmãos, os amigos e a namorada, Ritinha, que se casou com outro homem durante sua ausência. Mas vocês sabiam que tanto a nave como a roupa do Astronauta não foram construídos na Terra?
A história de origem do Astronauta foi contada em uma série de exatas 200 tiras, em 1964, e depois essa história ganhou um remake para os gibis, publicada em três partes nos gibis de Cebolinha (#148 e #149) e Mônica (#180) em 1985.
Astronauta Pereira era um jovem que residia em uma fazenda no interior de São Paulo, e sonhava, desde criança, em ser astronauta. Até que, um dia, por acaso e indicação de um certo “General” – um vizinho excêntrico que se dizia um militar – a um técnico da NASA, o jovem Astronauta é convocado para passar por um treinamento na agência norte-americana e se tornar astronauta. No entanto, ele acaba passando por uma série de apuros, a partir do momento em que é resgatado por uma raça de alienígenas, chamados de Homens-Geleia. Estes buscavam proteger o jovem, que não estava preparado para viajar nos foguetes terrestres. Foram os Homens-Geleia que deram ao Astronauta a roupa redonda, que por sua vez fora dada a eles pelos Homens-Bolinha do Sol.
Pouco depois, já paramentado, Astronauta encontra, na superfície da Lua, uma raça de homens metálicos, que se preparavam para conquistar a Terra. Após impedir a ameaça, Astronauta acaba encontrando, ao vasculhar a base dos Homens Metálicos, a nave arredondada, que ele aprende a pilotar sozinho, praticamente entendendo os comandos sem ajuda – por isso, Astronauta é o único que consegue pilotá-la. A nave também comporta um sistema de viagem no tempo, que permite não apenas que a nave cubra enormes distâncias e vá para mundos habitados distantes anos-luz da Terra, como ainda permite que Astronauta volte para a Terra e encontre os entes queridos ainda vivos e na idade em que estavam quando ele deixou o nosso planeta. Pronto.
Aguardamos que, em breve, a Panini possa republicar essa história de origem, tanto o arco de tiras quanto a versão gibi, em alguma publicação histórica do personagem.

AGORA SIM, O ÁLBUM
O título da nova aventura do Astronauta, SINGULARIDADE, possui diversos significados. Pode remeter a um dos conceitos do tema em torno do qual a aventura gira – o buraco negro – como ao fato da própria personalidade do Astronauta, o que torna o aventureiro sideral uma pessoa especial, o único que consegue dirigir a própria nave. Se em Magnetar o tema principal era a solidão do personagem, em SINGULARIDADE o tema é a obstinação do personagem – sua disposição para cumprir as missões que lhe são confiadas, resolver eventuais perigos, a fidelidade a Ritinha, mesmo sem esperanças de reconquistá-la.
Quem se interessa por ficção científica ou pela astronomia e astrofísica “sérias”, já sabe o que é um buraco negro: uma região do espaço-tempo do universo, formada após a explosão de uma estrela, onde se forma um enorme campo gravitacional de onde nem mesmo a luz escapa. Estima-se que tudo o que possa cair dentro de um buraco negro possa ser destruído em uma fração de segundo. Há teorias que dizem que os buracos negros formam o centro das galáxias, e podem ter sido deles que estas podem ter surgido – inclusive a galáxia onde a própria Terra se localiza. Como os buracos negros fazem as leis da física entrarem em colapso, estes também são chamados de singularidades – e a região de onde a matéria e a luz não escapam, de horizonte de evento. Entenderam minha explicação? Não? Não se preocupem: o álbum explica melhor tudo isso. Beyruth não abriu mão da pesquisa sobre o tema e das soluções para resolver a trama.
Bão. SINGULARIDADE começa do ponto onde Magnetar terminou. E acrescenta um elemento novo: mais personagens. Desta vez, Astronauta não está sozinho em sua mais nova missão.
O álbum começa quando Astronauta está na Terra, após os apuros sofridos em sua missão de análise do magnetar. Ele está sendo avaliado por uma psicóloga da BRASA, a narradora da história, a única astronauta com formação na área (ah: o Astronauta é o único personagem com nome em todo o álbum; como os outros personagens do álbum não apareceram – até onde eu sei – em histórias anteriores do personagem, ou seja, são inéditos, criados por Beyruth – fiquem livres pra me corrigir se eu estiver enganado – eles não tem nomes). Astronauta desenvolve, no álbum, uma relação de amor e ódio pela psicóloga – até porque ela é uma das parceiras do Astronauta na missão.
Contrariado por conta da avaliação psicológica, Astronauta se encontra irritado – talvez por conta da paranoia a que foi submetido na aventura no magnetar – e, por isso, maltrata a psicóloga. Até que o chefe da BRASA o informa de sua nova missão, e ele vai ter de levar parceiros nessa. Os parceiros são a doutora e um major de uma nação estrangeira não especificada, que possui um grande interesse no assunto a ser tratado. O major, o vilão da trama, é um ser calculista e maquiavélico, que não se importa em lesar os parceiros para conseguir o que deseja. E ele já começa testando os limites dos parceiros, ainda na fase de treinamentos na Terra.
A missão: analisar um buraco negro, que está cercado por uma nuvem de gases superaquecida. A análise deverá ser feita através de boias com sensores, para medir as oscilações do campo gravitacional da singularidade. A missão, entretanto, acaba tomando rumos inesperados logo que eles chegam ao local e encontram um estranho objeto – uma estrutura octogonal – na borda da nuvem de gases. Enquanto a doutora fica na nave, Astronauta e o Major vão até a estrutura, que parece ser uma nave. No seu interior, abrem-se uma porção de estruturas controláveis, portais de acesso, coisas que o Astronauta consegue ativar apenas com o toque, e só ele – aí que entram as referências à aventura de origem nas tiras. O Major fica na “nave”, analisando a estrutura com os enormes equipamentos que levou junto com ele, enquanto o Astronauta instala as boias. Fica evidente que as pretensões do Major não são assim tão nobres, e já começa a entrar em conflito com Astronauta, preocupado antes de tudo com a segurança de tudo e todos.
Em dois momentos da história, quase acontece um romance entre Astronauta e a Doutora. A psicóloga, depois que vê o seu paciente mais determinado e mais calmo, vai mudando suas impressões iniciais, despertando uma admiração pelo aventureiro – e se apaixonando, claro. Em outro momento, ela consegue roubar-lhes um beijo na boca.
A trama esquenta no momento em que Astronauta e a Doutora são chamados pelo major para a “nave”: ele encontra uma forma de vida meio orgânica, meio máquina, mas já morta. No instante em que Astronauta se organiza para levar os restos da criatura para a Terra, o Major começa a sabotar a missão: prende a Doutora e começa a esvaziar seus tanques de oxigênio – tudo para que o Astronauta a salve, e não atrapalhe enquanto o Major reprograma a “nave”.
O Astronauta salva a Doutora, e é no momento em que o aventureiro aplica-lhes uma ressuscitação cardíaca que a psicóloga rouba-lhes o beijo – a princípio, Astronauta se rende, mas a lembrança de Ritinha o faz recuar. Após colocar a Doutora sob cuidados médicos, ele vai atrás do Major.
Desde o início, Astronauta desconfia, e confirma, da pior maneira, que o octaedro não é uma nave. Mas o Major reprograma a estrutura em direção à Terra, pensando em dirigi-la para lá – mas, na verdade, pode estar apontando uma arma em direção ao planeta. O clímax do álbum é a batalha entre Astronauta e o Major – o primeiro, em seu traje espacial pesado; e o segundo, em um traje com patas mecânicas e garras. Emocionante, como as batalhas que Beyruth costuma incluir em seus álbuns. Só depois de resolver o “problema” com o Major é que Astronauta precisa impedir que uma tragédia aconteça...
Mais uma vez, Beyruth, na arte, usa de seu realismo detalhado e ao mesmo tempo estilizado, com quadros grandes e quadrinização planejada, e páginas-pôster, duplas, visualmente atraentes graças às cores de Peter. No roteiro, um bom equilíbrio entre o tempo de diálogo extenso e o tempo de aventura – coube uma trama competente nas 82 páginas do álbum. Ainda há alguns segredos, não apenas as referências ao arco das tiras de origem: a criatura encontrada na nave não apenas faz referência aos homens-geleia como estava prevista – ela fazia parte dos rascunhos originais de Magnetar, como visto na página de bastidores do primeiro álbum. E o álbum, claro, traz os elementos sempre presentes: prefácio de Maurício de Sousa, páginas com os bastidores da elaboração da história, um breve texto com as origens do Astronauta, biografia do autor e posfácio do quadrinhista argentino Eduardo Risso, da série norte-americana 100 Balas.
O preço dos álbuns, felizmente, não sofreu reajuste nesse tempo de perceptível arrocho nas contas brasileiras: R$ 29,90 a versão em capa dura, R$ 19,90 a versão em capa cartonada.
Qual será, agora, o próximo projeto de Danilo Beyruth? Nada previsto, infelizmente... Só há certeza de uma coisa: foi anunciado que o próximo álbum da série Graphic MSP será com o Louco, pelo ilustrador Rogério Coelho. Aguardemos.
Para encerrar, a já tradicional ilustração minha. Desta vez, optei por fazer uma ilustração livre de ação ligeiramente ligada ao tema do álbum, um exercício de ilustração onde o lápis e a imaginação são os guias. Mas devia ter escolhido uma caneta melhor para fazer a arte-final, teria comprometido menos a arte...
E vamos ver se o restante do ano nos será mais favorável que este janeiro de atentados terroristas, governos enganadores e execuções questionáveis.

Até mais!

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