sábado, 22 de outubro de 2011

BLENQ - uma HQ brasileira que dá a cara ao tapa

Olá.
Hoje, enquanto nesse momento está acontecendo a segunda Rio Comicon (a qual não posso comparecer por ter compromissos aqui no Rio Grande do Sul), vou falar de quadrinho brasileiro.
Há alguns dias atrás, recebi uma nova remessa de gibis da Júpiter 2, a editora do sempre atuante – e por vezes polêmico – José Salles. E o gibi de hoje foi criado por um cara ainda mais polêmico.
Muitos interessados em quadrinhos brasileiros ou simplesmente atuantes da cena nacional de HQ já devem ter ouvido falar de Rod Gonzalez.

Bem. Ele é, além, de criador de personagens, produtor musical, músico também (ele toca em uma banda chamada 7 Vidas) e colaborador de publicações como a Mundo dos Super-Heróis, da editora Europa. Ah, e ele também foi co-fundador do site Central de Quadrinhos Brasileiros, um grande fórum de quadrinhistas nacionais – muitos deles frustrados por não conseguirem um nicho no nosso mercado de HQ tão bichado pelas publicações estrangeiras.
Rod Gonzalez, infelizmente, também é um polemista. Militante radical das HQ brasileiras, porém, ele desperta amor e ódio em igual medida por conta de seus artigos, publicados na internet e nas mídias impressas. Isso porque ele, ao defender as nossas histórias em quadrinhos, sempre adota o tom de quadrinhista frustrado por não conseguir espaço no mercado. Pode ser verdade que a culpa seja das editoras, ou do público, ou dos próprios artistas. Mas isso com certeza não contribui para passar uma boa imagem aos interessados por HQ brasileiras – e serve de carga para os detratores de nossa oitava arte. Se continuar assim, Gonzalez nunca sairá da cena alternativa.
Bem. Gonzalez também é criador de personagens, claro. Dentre os mais conhecidos, está Thutharella, a guerreira nua (que ele criou quando ele tinha, pasmem, sete anos!), e que despertou alguma polêmica (em parte, porque Gonzalez, em um artigo publicado na internet, acusa Stan Lee, da Marvel Comics, de ter se baseado em Thutharella para criar a personagem Striperella – o que contribui para aumentar sua fama de reclamão frustrado); o herói Boi Bumbá; e o Blenq.

QUEM É BLENQ?Bom. A estrela do gibi da Júpiter 2 foi criado por Gonzalez, talvez, em 2008. Quer dizer, como foi o ano em que saiu seu primeiro gibi, não há informações de que o herói tenha aparecido antes em outra publicação. E se trata de um dos mais criticados heróis de nossas HQ, em parte devido ao conceito.
Não se sabe ao certo quem é Blenq, ou seja, qual sua identidade secreta e de onde ele veio. Só se sabe que Blenq mora na Amazônia, é um herói ecologista, tem um parceiro, Luã, e seu único poder é o de voar.
Quer dizer, Rod Gonzalez nem se preocupou em explicar quem é Blenq, nem de onde ele veio. Não há nada sobre a origem dele nos quatro gibis publicados até agora. Tudo o que se sabe foi o exposto acima.
Bem. O personagem nasceu como forma de abordar, nos quadrinhos, o tema ecologia. Sim: Blenq é um herói ecológico, que luta principalmente contra agressores da natureza, como traficantes de animais ou lenhadores ilegais. Mas Blenq parece ser mais humano que herói, pois seu único poder é o de voar – e fazendo uso de uma prancha de surfe voadora. Fora isso, suas únicas armas para combater os inimigos são a agilidade, a inteligência e o preparo físico, além da vontade de proteger a natureza.
E ele tem um parceiro, um alienígena chamado Luã. Apelidado e “cabeça de balde” por conta do formato do crânio, Luã, além da capacidade de voar, possui poderes telepáticos. Mas nem sua origem Rod Gonzalez se preocupou em estabelecer – através de algumas pistas, sabe-se que Luã, como o nome sugere, vem da Lua. E, tal como seu parceiro humano, Luã é um sujeito bem-humorado e cuca-fresca, e tão preocupado em proteger a natureza quanto Blenq.
Outro ponto polêmico de Blenq é o uniforme: ele já foi chamado, em alguns sites, de “mistura de Surfista Prateado com Super Mouse”, por conta da roupa amarela com calções vermelhos. E além disso: se o nome do herói começa com B, por que o emblema em seu peito é uma letra E? Além disso, o que quer dizer exatamente a palavra Blenq?
Bem. As Histórias de Blenq evocam uma época em que as HQ de heróis eram mais ingênuas – diversão despretensiosa. Por isso, ele exagera um pouco no maniqueísmo dos personagens – os vilões das histórias de Blenq, agressores do meio ambiente, agem quase sempre movidos por ganância ou maldade. De certa forma é verdade, mas os vilões parecem irreais sob o ponto de vista de Gonzalez, ou seja, não refletem exatamente a realidade. Quer dizer, não acredito que traficantes de animais ou outros agressores do meio ambiente ajam unicamente por ganância. Nada contra alertar contra os males que nós, humanos, fazemos contra a natureza, mas não devemos exagerar, ou espantaremos os partidários da causa.
Outro ponto polêmico é que os artistas interpretam o herói ao seu modo, em termos de aparência – em termos de personalidade não, visto que Gonzalez escreve todas as histórias. Desse modo, Blenq tem muitas versões diferentes de seu uniforme. A mesma coisa vale para o Luã: alguns artistas desenham suas asas como membranas sob os braços, outros lhe dão asas de pássaro nas costas. E nem todos os artistas se saem muito bem desenhando as histórias do personagem.
Outra coisa: como Gonzalez ainda não estabeleceu uma origem para o herói, e nem se preocupar em dizer o que ele é, em apontar maiores detalhes de sua vida, isso acaba espantando potenciais novos leitores. As histórias de Blenq só vão acontecendo, sem mais nem menos, sem grandes preocupações. Daí, em parte, as críticas negativas.
O que mais contou em Blenq, mesmo, foram as boas intenções de Gonzalez. Porque o herói, infelizmente, foi muito mal-concebido, pelamordedeus! Se o Blenq conseguir despertar consciências apesar das histórias pouco inspiradas e da arte irregular de alguns de seus colaboradores, o mérito será das intenções de Gonzalez, e não do personagem em si.
Ah, mas tem uma coisa que salva as revistas: as matérias informativas incluídas, algumas escritas pelo próprio Gonzalez, outras por colaboradores.

AS EDIÇÕES
Bem. Vamos agora às edições até agora publicadas do herói. Todos os roteiros são de Rod Gonzalez.

BLENQ no. 1Lançado em outubro de 2008.
Duas histórias. Na primeira, Devastação Florestal (que conta com a participação de um grupo de super-heróis, o Esquadrão C.A.O.S. - criação de Darlei Nunez - , uma superequipe com sede no Rio de Janeiro), Blenq e Luã são convocados pelo Esquadrão C.A.O.S. para encontrar um membro da equipe que desapareceu na Amazônia. O tal membro, Lâmina, investigava o desmatamento ilegal de árvores na floresta, e acaba sendo raptada pelo chefe do bando e por um mercenário perigosíssimo. A arte da história é de Darlei Nunez. Essa história, apesar do roteiro bem construído, peca pela arte “de iniciante” de Darlei, que deixa a história muito desajeitada. O excessivo maniqueísmo dos personagens também contribui para o afundamento da trama. A segunda história, S.O.S Bicho-Preguiça, com roteiro co-escrito com Amanda e arte de Oqui, foi feita como forma de alerta à ameaça ao bicho-preguiça. Após encontrar uma fêmea de bicho preguiça abandonada na floresta – vitimada por traficantes de animais e pela ignorância de seu comprador - , uma bióloga – Verinha, baseada em uma personagem real – convoca Blenq e Luã para investigarem o tráfico desses animais. E se deparam com uma trama muito sórdida. O roteiro também peca pelo maniqueísmo, mas a arte de Óqui já é bem melhor, apesar dos personagens caricaturais – e a história foi feita mesmo para chocar e conscientizar. É a melhor da edição. Completa a revista um artigo da própria Verinha – a bióloga Vera Lúcia de Oliveira, atuante na preservação dos bichos-preguiça da Mata Atlântica – que traz informações sobre os animais em questão, e alerta sobre os riscos do tráfico de animais. E ainda tem página de passatempos. Todas as histórias tem letras e diagramação de Johnny Fonseca, e a capa acima é de Emir Ribeiro. Apesar de esta ser uma das edições favoritas do autor, é também uma das mais criticadas.

BLENQ no. 2Lançado em dezembro de 2009.
Apresenta uma história longa: O Lobisomem de Sepé. Nela, Blenq e Luã saem um pouco de seu elemento, e se inserem numa história de terror, quando investigam a aparição de um lobisomem numa pequena cidade. Esse lobisomem, que esconde um terrível segredo, ameaça a vida de uma jovem. A arte, pasmem, é do mestre Rodolfo Zalla, um especialista em HQ de terror! A HQ se estrutura em quadros grandes (o roteiro, porém, e meio desajeitado, deixando a história muito ingênua), e o Blenq e o Luã de Zalla, em estilo mais realista, são bem diferentes dos dos outros artistas. Completa a edição uma matéria de Rod Gonzalez sobre a vida e a carreira de Zalla, que também assina a capa.

BLENQ no. 3
Lançado em fevereiro de 2011.
Duas histórias, ambas com desenhos de William Cabral e arte-final e letras de Johnny Fonseca. Assassinos de Cães!, a primeira, traz a origem de um personagem novo – Muzambinho, o cachorro de Blenq (de que adianta saber isso, se Muzambinho nem apareceu nos dois números anteriores?). É contada a dramática história de um cão Doberman que, abandonado pela família que o adotara por ser considerado perigoso, vive nas ruas e sobrevive como pode, até ser perseguido, junto com os companheiros, por um grupo de assassinos de animais – e o cachorro consegue ajudar Blenq e Luã a deter essa gangue. Nessa história também é introduzida uma tribo de índios, supostamente amigos de Blenq e Luã. E na segunda história, Tráfico na Tribo!, Blenq investiga os movimentos de um jovem índio que não apenas viciou-se em drogas como influenciou alguns amigos de sua tribo. E descobre que existe tráfico de drogas na aldeia - e coordenada por um homem branco. História calcada na realidade – entretanto, funcionaria melhor se o roteiro fosse mais bem-construído, e a história fosse menos fragmentária. A arte de Cabral e Fonseca é até legal, com os efeitos de lapisado na arte-final – mas a quadrinização caótica é o pior da historinha. Completam a edição: Uma matéria de Leninha Matias sobre as desvantagens da castração tradicional de cães (matéria de utilidade pública para os donos de cães que não desejam a reprodução destes); uma matéria de Rod Gonzalez sobre Lobo, o cão do herói televisivo Vigilante Rodoviário (sucesso da TV brasileira nos anos 60), e sobre os heróis inspirados no Vigilante Rodoviário; e mais ilustrações pin-up de Blenq e Luã feitas por Dagoberto Lemos, Emir Ribeiro, Samuel Bono e Sandro Santos. A capa é de William Cabral. A renda da venda desta edição, na ocasião, seria revertida para o tratamento de um cão verdadeiro – Skiner, que serviu de inspiração para Muzambinho (se bem entendi, é o cão de estimação de Gonzalez, corrijam-me se eu estiver errado).

BLENQ no. 4
Lançado em julho de 2011.
Uma história: Um Lobisomem Brasileiro em Londres, com argumento de José Salles e arte de Rodolfo Zalla (de novo!). Neste número, Blenq e Luã vão a Londres, na Inglaterra, investigar as atividades do Lobisomem de Sepé, que havia sido exilado na história anterior, e que está atacando gente da comunidade brasileira de Londres – principalmente mulheres. O roteiro, assim como na história anterior, é meio mal-ajambrado, mas a arte de Rodolfo Zalla continua sendo a que a gente sempre conheceu. Participação especial da personagem Zora, a Mulher Lobo, criação de Zalla (dos tempos dos gibis de terror que o artista publicava entre os anos 70 e 80). Quanto a Zora, confesso que até então era uma personagem que eu não conhecia, no dia em que escrevi a matéria sobre a carreira de Zalla. De extras, apenas uma galeria de capas de revistas antigas onde aparecia Zora. A capa também é de Zalla.

E aguardem: em breve, chegará a quinta edição do herói! Claro: Gonzalez também anuncia, ao fim de cada edição (com exceção do número 1), as atrações do próximo número.
Para quem se interessar, o preço de cada gibi é R$ 3,00. Se vale a pena adquirir, decidam vocês. Se decidirem que sim, peçam pelo e-mail: smeditora@yahoo.com.br. E saibam mais sobre outras publicações da editora em http://jupiter2hq.blogspot.com/.
Para encerrar, eu fiz uma ilustração – um pouco apressada – do Blenq e do Luã. Apesar de levar muito tempo para acertar a melhor posição das pernas do herói no desenho – e de não ter obtido um resultado muito satisfatório – desta vez, não sinto remorsos: para um herói tão irregular quanto este – na minha opinião – já está de bom tamanho.
E é bom que, nas próximas edições, Gonzalez desta vez se preocupe em estabelecer a origem do herói. E que também não seja tão agressivo em suas críticas. Ou só espantará leitores se continuar assim.
Até mais!

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