domingo, 3 de fevereiro de 2013

OS 25 MAIORES MOMENTOS DOS QUADRINHOS NACIONAIS - parte 4

Olá.
Hoje, continuamos a série especial sobre os 25 maiores momentos da história dos quadrinhos brasileiros.
Lembrando sempre: os fatos estão sendo apresentados em ordem cronológica, e a escolha dos fatos parte de critérios de ordem pessoal. Qualquer discordância com relação ao conteúdo, elas podem ser discutidas comigo.
Bem, aqui vão os fatos 16, 17, 18, 19 e 20.



16 – A aparição do “Pasquim” (1969)

Não se trata de um gibi, mas não seria de bom alvitre deixar de fazer referência ao Pasquim, o “nanico” (jornal alternativo) de maior sucesso da história do Brasil, e um dos maiores símbolos de resistência à Ditadura Militar brasileira. Fundado por Tarso de Castro, Sérgio Cabral e pelo cartunista Jaguar (1932 -), O Pasquim surgiu sem grandes pretensões, e sem tanta fé no sucesso: além de que seus criadores acharem que o jornal não ia durar quatro semanas, a sua circulação não ia passar do Rio de Janeiro. Entretanto, O Pasquim alcançou sucesso nacional, e influenciou a imprensa brasileira como um todo, inserindo no jornalismo brasileiro uma linguagem coloquial, entrevistas estilo pingue-pongue, com asteriscos substituindo palavrões (como a célebre entrevista à modelo Leila Diniz), e cartuns e quadrinhos. Dentro do Pasquim, Jaguar lança sua célebre tira Chopnics, de onde sairia também o mascote da publicação, o rato Sig. Outros colaboradores importantes do nanico foram Ziraldo, Fortuna, Claudius, o “intelectual do Meyer” Millôr Fernandes, o aclamadíssimo criador dos Fradinhos e da Graúna, Henfil, seu “afilhado” Cláudio de Oliveira e muitos outros. O jornal resistiu a tudo: a prisões de seus integrantes, como a que aconteceu em 1970, por causa de uma sátira ao quadro O Grito do Ipiranga de Pedro Américo; a atentados à bomba (quando os militares linha-dura, contrários à abertura política, chegaram a bombardear bancas de revistas que vendiam o Pasquim e ouros jornais de “esquerda”); e até à redemocratização. O Pasquim foi publicado até 1991. Porém, Ziraldo e seu irmão Zélio Alves Pinto relançam o Pasquim em 2002, sob o nome Pasquim21 – e que teve na revista humorística Bundas, lançada em 1999 e recheada de humor e crítica social, seu balão de ensaio. A maior parte da equipe foi novamente reunida nessa nova empreitada que, infelizmente, durou pouco – O Pasquim21 durou até 2004.

17 – A aparição da versão nacional da revista “MAD” (1974)
A revista MAD, lançada pela editora estadunidense EC Comics, em 1952, renovou o gênero humor no mundo inteiro, através da sátira a todos os aspectos da sociedade norte-americana, incluindo filmes, séries e programas de TV e até mesmo a própria revista, com humor inteligente e escrachado, e bons desenhos, semirealistas. Foi em 1975 que a tradicional editora Vecchi, do Rio de Janeiro (que também publicou o gibi de faroeste Chet, dos irmãos Wilde e Watson Portela), decidiu trazer a MAD para o Brasil, editada por Ota (Otacílio D’Assunção Barros, 1954 -). Ota, que também seria responsável pela célebre revista de terror Spektro, da mesma editora, é considerado o editor que ficou há mais tempo no comando da publicação em todo o mundo, cobrindo as quatro fases pela qual passou: de 1974 a 1983, pela Vecchi (que fechou no ano seguinte); de 1984 a 2000, pela editora Record; de 2000 a 2006, pela editora Mythos; e de 2008 até hoje, pela editora Panini (desde 2009, o editor da MAD é Raphael Fernandes, após o rompimento de Ota com a revista). Em todas as fases, colaboraram artistas como Luscar, Carlos Chagas, Nivaldo, Ed, Xalberto, Amorim, Vilmar, Pupuca, Flávio Dealmeida e o próprio Ota, com sua célebre seção Relatório Ota. Além, é claro, de editar o material da versão estrangeira, com as tiradas de Don Martin, Al Jafee, Sergio Aragonés, Antonio Prohias, Mort Drucker, Paul Coker Jr., George Woodbridge, Dave Berg e muitos outros – incluindo aí até a mascote norte-americana da revista, Alfred Newman, o garoto sardento que aparece nas capas. De certo modo, a MAD ampliou os horizontes do humor brasileiro, através da implantação do modelo norte-americano de sátira a tudo e todos, com todas as referências possíveis, sem mascarar nada. Em 1972, a Abril já havia lançado uma revista de linha similar à MAD, a Pancada, inclusive com mascote próprio (o faxineiro Belarmino, espelhado no Alfred Newman). Mas a MAD continua sendo a mais influente revista de humor escrachado.

18 – A aparição da revista “Kripta” (1976)
Desde o lançamento da revista Terror Negro, em 1950, os brasileiros se tornaram especialistas em quadrinhos de terror, um gênero preferencial dos leitores. Muito ajudou os quadrinhos brasileiros o fato de as publicações de terror dos Estados Unidos, que eram importadas ao Brasil pelas muitas editoras que investiam no gênero, estarem sendo perseguidas pelo Macarthismo e pela “cruzada antiquadrinhos” desencadeada pela publicação do polêmico livro do psiquiatra Fredric Wertham. Isso possibilitou que artistas brasileiros demonstrassem todo seu talento, e o Brasil ganhou grandes nomes do gênero entre as décadas de 50 e 60: Eugênio Collonese (1929 – 2008), Nico Rosso (1910 – 1981), Rodolfo Zalla (1931 -), Júlio Shimamoto, Flávio Colin (1930 – 2002), R. F. Lucchetti (1930 -) e muitos outros. Entretanto, tal como nos EUA, os quadrinhos de terror começaram a sofrer alguns percalços – o maior deles foi a censura imposta pela Ditadura Militar inicada em 1964, que começou a perseguir as editoras que publicavam revistas de humor crítico e terror. A primeira metade dos anos 70, a mais fechada do período da Ditadura, praticamente paralisou a indústria nacional de quadrinhos, já que os quadrinhos de terror eram os que mais rendiam. O gênero ganha um sopro de vida em 1976, quando a editora RGE lançou a revista Kripta. Ganhando até um anúncio de TV (“Com Kripta, qualquer dia é sexta-feira, qualquer hora é meia-noite”), a revista publicava material estrangeiro – o conteúdo das revistas norte-americanas Eerie e Creepy, da editora Warren Comics, que, nos EUA, também contribuíram para renovar o gênero então marginalizado. Mesmo assim, a Kripta lançou no Brasil a segunda onda dos quadrinhos de terror (a primeira começou com o lançamento da Terror Negro). E possibilitou o aparecimento de outras publicações importantes, estas sim contando com o trabalho de artistas brasileiros – além dos já citados Collonese, Shimamoto, Colin, Rosso e Zalla, publicações como a Spektro (Vecchi, a partir de 1977), os filhotes desta revista, Pesadelo, Sobrenatural e Histórias do Além (também da Vecchi), e a Calafrio (D-Arte, 1982) abriram espaço para gente de talento como Elmano Silva, Olendino, Zenival, Watson Portela e Mozart Couto.

19 – O aparecimento da editora Grafipar (1977)
É um dos marcos mais importantes da história das HQ nacionais. Antes do aparecimento da Grafipar, os principais quadrinhos eróticos que circulavam no Brasil eram os “catecismos” de Carlos Zéfiro (1921 – 1992), entre os anos 50 e 60, os conhecidos gibis com histórias pornográficas em desenho canhestro, mas que serviam de guia de iniciação sexual para muitos adolescentes (apenas em 1991 seria revelado, pelo jornalista Juca Kfouri, para a revista Playboy, que Carlos Zéfiro era o pseudônimo do funcionário público e compositor Alcides Caminha). Em Curitiba, Faruk El-Katib funda a editora Grafipar, com a revista Peteca. Dedicada quase que exclusivamente aos quadrinhos eróticos, a Grafipar, contudo, era a que mais incentivava a publicação de material genuinamente brasileiro – tanto que muitos artistas de HQ começaram a se mudar para Curitiba. Revistas como Personal, Neuros, Katy Apache, Maria Erótica, Eros, Perícia e Xanadu, cuja equipe criativa era capitaneada pelo editor Rogério Dias, não apenas resgataram trabalho de veteranos como Cláudio Seto, Júlio Shimamoto e Flávio Colin, como também revelaram novos talentos do quadrinhismo, como Watson Portela (1950 -), Roberto Kussumoto, Sebastião Seabra, Ataíde Braz, Eros Maichrowicz e Arthur Garcia. Entretanto, a experiência durou pouco: a editora fechou em 1983. Mas foi uma das pioneiras nos quadrinhos “adultos” nacionais, que explodiriam nos anos 80, não apenas através da importação dos mais importantes quadrinhos estrangeiros do período, como o Ranxerox de Stefano Tamburini e Gaetano Liberatore, o Torpedo 1936 de Enrique Sanchez Abuli e Jordi Bernet, o Batman: O Cavaleiro das Trevas de Frank Miller e o Watchmen de Alan Moore, mas também possibilitaram o aparecimento de revistas que publicavam material não dirigido a crianças (e desfazendo o mito corrente de que HQ era exclusivamente “coisa de criança”, uma vez que o perfil dos leitores foi mudando gradativamente, abrangendo um público mais adulto e maduro), como a Inter Quadrinhos, (editora Ondas, 1983), a Aventura e Ficção (editora Abril, 1986), a Paralelas (Asteróide, 1986, só com trabalhos de Watson Portela, um dos mais destacados desenhistas de histórias de terror e sexo explícito da década de 80), a Animal (VHD Diffusion, 1987), a Tralha e a Porrada! Special (Vidente, cerca de 1989) e a Pau Brasil (Vidente, 1992), com o melhor do quadrinho adulto nacional e internacional.

20 – O aparecimento da revista “Chiclete com Banana” (1985)
O movimento da contracultura nos quadrinhos, que nos EUA, desde os anos 60, conta com nomes de peso como Robert Crumb, Gilbert Sheldon e os irmãos Hernandez, e que ajudaram a mudar os rumos dos quadrinhos mundiais, deixando de lado as histórias de super-heróis e os personagens “fofinhos e engraçadinhos”, explodiu no Brasil quando a editora paulista Circo Editorial, de propriedade de Toninho Mendes e Luís Gê (1951 -), lançou a revista Chiclete com Banana, em 1985. Encampada por Arnaldo Angeli Filho (1956 -), grande revelação das HQ nacionais desde sua participação no Salão de Humor de Piracicaba de 1975 e que é conhecido pelos personagens malcomportados que desenvolveu no jornal Folha de São Paulo, a Chiclete com Banana durou até 1995, totalizando 24 números e 20 especiais – 10 da Chiclete Especial e 10 da série Tipinhos Inúteis - e que em seu auge vendeu 110 mil exemplares. Nessa revista, os mais conhecidos personagens de Angeli – Rê Bordosa, Bob Cuspe, Meiaoito e Nanico, Bibelô, Os Skrotinhos, Wood & Stock, Rigapov, Rhalah Rikota, etc. – apareciam em tiras e histórias longas. O evento mais marcante da Chiclete com Banana foi A Morte de Rê Bordosa, quando Angeli resolveu matar sua personagem mais famosa – a edição onde o “crime” foi relatado foi a mais vendida. Dentro da Chiclete, também publicaram: Laerte Coutinho (1951 -), Glauco Villas-Boas (1957 – 2010), Glauco Mattoso, Fábio Zimbres, Luís Gustavo, Cláudio Paiva, Luís Gê, Hubert, Sérgio Machado, Fúrio Lonza e até mesmo um alter-ego de Angeli, o fetichista e anti-patriota Edi Campana. Ainda, Angeli, Laerte e Glauco lançavam histórias produzidas a quatro ou seis mãos (sendo as mais famosas as da série Los Tres Amigos, produzida em conjunto pelos três, e que posteriormente ganharia a adesão do gaúcho Adão Iturrusgarai). E a revista, marcada pela crítica social, pelo retrato devastador dos anos 80 e 90, e pela postura anárquica e contestadora típica do movimento punk, ainda apadrinha outras publicações do gênero: a Circo, mais “sofisticada” que a Chiclete, que reunia trabalhos de Laerte, Alcy, Luís Gê, Glauco e Robert Crumb; a Geraldão, onde os personagens de Glauco Villas Boas – Geraldão, Dona Marta, Zé do Apocalipse, Casal Neuras e Doy Jorge – apareciam em histórias longas; a Piratas do Tietê e a Striptiras, reunindo os mais conhecidos personagens de Laerte; a Níquel Náusea, de Fernando Gonzales (gibi que começou sendo editado pela editora Press, passando, depois para a Circo); e a BigBangBang, de Adão Iturrusgarai. A Circo também edita livros de tiras e ilustrações de artistas como Ciça (Pagando o Pato), Luís Gê (Quadrinhos em Fúria) e Rubem Grilo (Xilogravuras). A editora Circo deixou um grande legado às novas gerações de quadrinhistas nacionais, inspirando nomes proeminentes do cartunismo nacional, como Allan Sieber, Caco Galhardo e Chiquinha. Foi pena que a redemocratização, os malfadados planos econômicos dos anos 80 e 90 e o desmonte da produção cultural vitimaram o quadrinho brasileiro, incluindo aí a Chiclete com Banana.

Na próxima postagem, a última da série, os fatos 21, 22, 23, 24 e 25.
Como desenho meu de hoje, como não tive como fazer material relacionado, resolvi deixar com vocês duas tiras inéditas dos meus personagens Bitifrendis. Estas aqui já foram publicadas no blog deles. As outras imagens foram extraídas de diversos sites da internet.
É isso aí.
Até mais!

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