Olá.
Hoje,
vou falar de livro – mas, desta vez, variando o tema: vou falar de mais uma
publicação recente sobre cultura pop. Tenho resenhado, em diversas
oportunidades, diversas publicações das editoras menores brasileiras, que focam
no público ávido por informações sobre, principalmente os super-heróis do
cinema e dos quadrinhos.
Bem,
este livro trata de super-heróis, sim, mas tem muito mais atrações que os
outros livros que resenhei até o momento.
Eis
aqui: UNIVERSO NERD – ESSENCIAL HERÓIS, da editora Geek.
UNIVERSO
NERD – ESSENCIAL HERÓIS tem organização do quadrinhista, editor e especialista
em cultura pop, Franco de Rosa. Prova de que o homem está vivo e ainda está
trabalhando – não tanto quanto nas décadas anteriores, quando trabalhou ao lado
de desenhistas importantes como Rodolfo Zalla, Sebastião Seabra e Paulo Paiva,
ou quando co-criou as editoras Press, Mythos, Opera Graphica e Kalaco... mas
Franco de Rosa continua dando sinais de (muita) vida dentro do mercado editorial
brasileiro.
Bem,
é Franco de Rosa quem organiza o livro de 256 páginas, sem contar a capa
cartonada, com textos seus e de diversos outros colaboradores, lançado em
setembro de 2016. Esse livro procura trazer praticamente o essencial sobre a
cultura pop em geral – não apenas sobre super-heróis, mas também séries de TV,
quadrinhos – incluindo brasileiros – mangás, cinema, desenhos animados antigos
e recentes, séries de TV. Tudo sobre o entretenimento que hoje é motivo de
discussões acaloradas nas redes sociais, nas rodas de conversas... Visando,
claramente, o público que ainda não está totalmente inteirado em diversos
assuntos da cultura pop, em tempos em que ser tachado de nerd (por gostar de
coisas que a maioria das pessoas “normais”, há décadas atrás, tachavam de
sub-cultura ou de coisas para criancinha) virou motivo de orgulho. Hoje, não é
mais possível ficar alheio ao mundo dos filmes de “não-arte”, das histórias em
quadrinhos, das séries de TV e dos videogames, só para citar algumas dessas
coisas. Como as pessoas “normais” conseguiam viver sem essas coisas até meados
dos anos 1980? Quem tenta escapar da cultura “nerd”, tem de dar uma olhada
nesse livro, que vale os R$ 39,90 que custa.
São
24 capítulos – mas alguns podem decepcionar, mesmo sem intenção. Já explico.
Apesar
da editora ser a Geek, que tempos atrás reeditou de forma meio tosca alguns
livros lançados anteriormente pela editora Discovery Publicações – da qual a
Geek é, ou era, um selo fantasia, não tenho certeza se a editora já se descolou
da Discovery – o livro não decepciona. Traz praticamente tudo o que você não
sabia sobre diversos temas do mundo pop. Algumas coisas o público já sabia em
ler publicações da Discovery, da Criativo, da Pixel, da Agir... Neste blog, já
trouxe resenhas de várias destas obras. Mas vou dizendo aos poucos por que
UNIVERSO NERD – ESSENCIAL HERÓIS não é igual às outras publicações já
resenhadas neste humilde e depreciável blog.
Well.
Cada um dos 24 capítulos inicia com duas páginas introdutórias em splash page, com fundo preto, títulos em
caracteres garrafais, breve parágrafo introdutório, uma caixinha vermelha com
informações adicionais, ilustrações... para só depois ir para a matéria, em
páginas brancas, cheias de ilustrações corretamente legendadas.
As
matérias, seguindo uma ordem aleatória de temas.
No
capítulo I, Homem-Aranha – os Segredos de
Suas Versões nas Telas, o autor Paulo Lerosi trata de todas as versões do
mais popular super-herói da Marvel Comics na televisão e no cinema – sua
primeira série de TV, a versão japonesa, as negociações que se estenderam por
décadas, entre a Marvel e diversas produtoras, para que saísse o filme
live-action, e as cinesséries de Sam Raimi e Marc Webb. Meio que por alto,
também trata dos desenhos animados.
O
capítulo II, O Quarto Mundo de Kirby, de
Wilson Costa, trata essencialmente do período em que o “rei dos comics”, Jack
Kirby, que ajudara Stan Lee a co-criar o Universo Marvel, passou a trabalhar
para a DC Comics, nos anos 1970, criando conceitos importantes como o dos Novos
Deuses, que influenciaram diretamente o universo do Superman e seus parceiros.
O
capítulo III já pode ser considerado a “maçã podre” do livro: Oscar – O Primeiro Super-Herói do Mundo, de
Carolina Fonseca, é escrito em tom de censura pela ignorância do povo brasileiro,
e de nacionalismo exacerbado, daquele que só serve para dar razão aos trolls de
internet, para tratar do personagem, criado pelo escritor Gustavo Barroso e
publicado na revista O Tico-Tico, em
1906, que vários brasileiros juramentam que seja o primeiro super-herói dos
quadrinhos em todo o mundo. Há provas de que a história de Oscar esteve à
frente de seu tempo, mas a autora exagerou um pouco – assim como vários autores
que escreveram sobre o personagem. Isso apesar de haver provas de que houveram
outros personagens, em várias partes do mundo, com características de serem
super-heróis. Bem, não vamos ficar de discussão sobre esses temas agora... fica
para outra oportunidade. Felizmente, esta matéria não afetou as demais do
livro.
O capítulo
IV, Paul Dini – O Reinventor do Classismo
nos Super-Heróis, de Paulo Augusto, trata de alguns aspectos da carreira do
roteirista de séries de TV e de quadrinhos, que reinventou, praticamente, a
maneira de pensar os super-heróis da DC Comics entre as décadas de 1990 e 2000
– tanto nas séries animadas do Batman, ao
lado do designer Bruce Timm (aquelas onde pela primeira vez apareceu a
Arlequina), quanto nas graphic novels
que criou ao lado do icônico artista Alex Ross.
No capítulo
V, Samurais – Heróis Lendários do Japão, de
Suely Paiva, vários aspectos sobre os lendários guerreiros japoneses nos são
apresentados: sua história, sua cultura guerreira guiada pelos ensinamentos do bushido, alguns samurais famosos, e,
claro, alguns dos mais célebres samurais dos mangás japoneses e dos quadrinhos
brasileiros – a autora fala, rapidamente, dos quadrinhos de Júlio Shimamoto e
Cláudio Seto, de temática samurai. Sabiam que o Brasil foi o primeiro país a
publicar HQs de samurais produzidas por artistas não-japoneses, fora do Japão?
O capítulo
VI, Star Wars – Campeã do Cinema,
Literatura, Quadrinhos, Brinquedos, etc..., de Magali Jardim, é um resumo
detalhado de tudo o que envolve a famosíssima cinessérie espacial. Filmes, do
primeiro ao mais recente, séries de TV, algumas obras do “universo
expandido”... Quem não conhece Star Wars e seu universo de sabres de luz e
explosões de naves cujos sons ecoam no vácuo do espaço, certamente foi, nos
últimos tempos, abduzido por alienígenas.
Também
de Suely Paiva é o capítulo VII, Super
Sentai – A Legião de Combatentes Fantasiados, sobre as famosas séries
japonesas de equipes de heróis de roupas coloridas e capacetes estilosos que
combatem monstros. O capítulo também traz uma lista de todas as séries de Super
Sentai conhecidas, produzidas no Japão – e quais as que chegaram aqui no
ocidente como Power Rangers. Quem já ouviu falar, conhece a “falcatrua”: no
ocidente, apenas as cenas das lutas entre os heróis, monstros e robôs gigantes
são mantidas do original; o restante é substituído por atores ocidentais. Uma
estratégia que dá certo desde 1993.
O
capítulo VIII, Osamu Tezuka – O Inventor
dos Olhos Grandes do Mangá e Anime, de Patrick Medeiros, trata, de forma
resumida mas essencial, da vida e da carreira do Deus do Mangá Japonês, o
desenhista que definiu todas as características conhecidas dos mangás – o
relato inclui ainda sobre a lendária viagem que Tezuka fez ao Brasil em 1984.
Suely
Paiva também assina o capítulo seguinte, o IX, O Tico-Tico e os Primeiros Heróis de Papel, um resumo a respeito da
icônica revista publicada entre 1905 e 1962. A nossa primeira revista infantil
a trazer quadrinhos. Com louváveis objetivos educacionais, personagens de
sucesso... Não dá para se falar nos quadrinhos brasileiros sem falar em O Tico-Tico.
Franco
de Rosa começa de fato sua parte de colaborações ao livro assinando o capítulo
X, Akira – Ação e Violência Made in
Japan, sobre a lendária obra de Katsuhiro Otomo, que chamou a atenção do
mundo para os desenhos animados e quadrinhos feitos no Japão. Tanto o mangá,
como os bastidores do icônico longa-metragem de animação distópico, assim como
a carreira de Otomo, e alguns aspectos do funcionamento da indústria japonesa
de mangás, são abordados.
Capítulo
XI: Bruce Lee – O Eterno deus das Artes
Marciais, de Gabriel Pereyra, sobre a vida e a carreira do grande ídolo das
artes marciais no cinema. Sua formação como lutador; seus filmes; sua passagem
pela televisão (inclusive atuando como o Kato da série Besouro Verde); sua vida pessoal; sua prole – inclusa a trágica
morte de seu filho, Brandon, durante as filmagens do filme O Corvo.
No
capítulo XII, Calvin e Haroldo – Graça e
Fantasia para Pensar na Vida, de Edison Solano, praticamente tudo a
respeito da trajetória da icônica tira infantil de Bill Watterson, que jamais
foi igualada. A última grande kids strip norte-americana,
e o último grande clássico das tiras – um estilo de HQ em franco declínio,
frente aos comic books.
O
capítulo XIII trata de acontecimentos recentes: A Reinvenção dos Heróis da Hanna-Barbera, de Ivan Gregório e Franco
de Rosa, trata do reboot, em curso, que a DC Comics, na forma de gibis, está
promovendo com os icônicos personagens do ainda mais icônico estúdio de
animação. Yes, folks: Scooby Doo, Corrida
Maluca, Os Flintstones, Johnny Quest e várias outras séries clássicas estão
sendo reinterpretadas, nos quadrinhos, em aventuras mais maduras e cheias de
ação, flertando até com a distopia.
Capítulo
XIV: Kick-Ass – Muito Além da Roupa
Collant e dos Superpoderes, de Silvano Caprioli. Tratando da série de Mark
Millar e John Romita Jr., hoje cult tanto nos quadrinhos quanto no cinema. Hoje
em dia é difícil falar em cultura pop sem fazer uma referência que seja a Kick-Ass, ironicamente cheia de
referências à cultura pop.
No
capítulo XV, Mangá – História, Origens e Significado,
de Adriana Fukue, um resumo bem básico e “assim, por cima” do histórico dos
quadrinhos japoneses, desde o século XIX até hoje. Não mais que o básico a
respeito do estilo de quadrinhos mais subestimado pelos especialistas em
quadrinhos ocidentais.
O
capítulo XVI, Matrix – Algo Além da
Realidade, de Silvana Morgana, traz um resumo básico e completo da mais
cerebral franquia de ficção científica do cinema, trazida à luz pelos irmãos
Wachowski – hoje, irmãs, visto que ambos mudaram de sexo recentemente. Do
início revolucionário, a carreira dos(as) Wachowski passou por altos e baixos,
muitos baixos, até que, em tempos recentes, no comando da série Sense8, encontrou, afinal, a redenção
junto aos fãs que exigiram muito deles(as).
Suely
Paiva volta a seguir no capítulo XVII, Mirza
– A Sedutora Vampira dos Quadrinhos, falando tudo a respeito da famosa
vampira sensual criada no Brasil, e de seu criador, o ítalo-brasileiro Eugênio
Colonnese.
Capítulo
XVIII: Superman e a Narrativa dos
Super-Heróis, de Luis Augusto Santana, trata da gênese do primeiro
super-herói popular do mundo, o modelo para todos os outros superseres, e da
carreira dele e de outros heróis nas tiras de jornal (sim, sabiam que Superman,
além dos gibis, estrelou tiras diárias e páginas dominicais de jornal? Sabiam
ainda que até hoje há quadrinhos do Homem-Aranha saindo nesse formato diário?).
Também
é de Franco de Rosa o capítulo XIX, Os
Clássicos e Insuperáveis X-Men, praticamente tudo, resumido, sobre os
mutantes da Marvel Comics, nos quadrinhos, no cinema... Mas nada, no entanto,
que a gente praticamente não saiba...
Capítulo
XX: Titãs – Jovens, Justiceiros e
Audaciosos, de José Roberto Castro. Tudo sobre a equipe de ex-ajudantes de
super-heróis da DC Comics que conseguira mais do que a autonomia no combate ao
crime: se tornaram ícones dos quadrinhos nos anos 1980, 1990 e 2000, quando
finalmente chegaram à televisão, como desenho animado. Todas as suas formações
e algumas de suas mais famosas aventuras.
Mais
um capítulo, o XXI, escrito por Suely Paiva a seguir: Memória e Pré-História dos Jogos Eletrônicos, um resumo rápido
sobre as eras dos videogames. Porque não dá para dissociar cultura pop de
videogames.
Suely
Paiva também assina o capítulo seguinte, o XXII, Zumbi – Os Mortos-Vivos Atacam. Praticamente o básico sobre as
incursões dos mortos, ambulantes e comedores de cérebros nos quadrinhos (The Walking Dead e Zumbis Marvel, por exemplo) e
na televisão (The Walking Dead e IZombie, por exemplo).
De
Franco de Rosa é o capítulo XXIII, Guerra
Civil – Os Vingadores em um Universo em Expansão. É um pequeno tratado
sobre os Vingadores da Marvel Comics, tendo por foco a última incursão
cinematográfica do grupo, que replica o famoso conflito dos comics.
E de
Suely Paiva é o capítulo XXIV e último, Caverna
do Dragão – O Mais Cultuado Desenho Animado do Mundo, tudo sobre a célebre
serie de animação fantástica – aquela dos seis jovens que tentam sair de um
mundo mágico, sem sucesso. Praticamente tudo, inclusive sobre o lendário último
capítulo que nunca foi produzido – o máximo que o público tem ideia sobre como
a série realmente termina é uma HQ não oficial, feita por um brasileiro, que
adapta o roteiro.
Os
fãs de cultura pop não terão do que reclamar, exceto pelos pequenos deslizes na
revisão dos textos. Um material de pesquisa excelente, embora meio limitado.
Haverá um segundo volume abordando mais assuntos de cultura pop? Porque,
convenhamos: o conteúdo do livro englobou, na melhor das hipóteses, só uns 15%
da cultura pop em geral. Vocês podem dizer: “ah, mas há tantos livros no
mercado com mais temas”... Mas podemos dizer que UNIVERSO NERD – ESSENCIAL
HERÓIS é um livro que não pode ser desprezado. Por que deixar de fora da
estante? Tudo bem, o preço de R$ 39,90 não é muito convidativo, mas tanta gente
é capaz de pagar 50, 60 paus por álbuns de capa dura com importantes arcos de
histórias de super-heróis ou da Disney, ou mangás de luxo, sem reclamar...
Para
encerrar, resolvi fazer uma ilustração especial, com referências limitadas, do
Oscar de Gustavo Barroso, um verdadeiro fantasma dos quadrinhos nacionais –
pelo que vi até agora, onde ele aparece, desperta o lado fundamentalista dos
fãs de quadrinhos brasileiros, o lado “regime militar” dos pesquisadores amadores
e profissionais dos quadrinhos brasileiros, instigando-os a atacar com
ferocidade os quadrinhos estrangeiros. O mais triste é que Gustavo Barroso
também foi um nacionalista ferrenho, partidário do integralismo. Se não
conseguem entender o que estou dizendo, procurem as referências disponíveis a
respeito do Oscar na internet, como textos de blogs... E, se possível, alguém,
por favor, se disponha a pesquisar, compilar e disponibilizar as aventuras
desse destemido cavaleiro andante publicadas nas páginas d’O Tico-Tico, edições de 1906,
ou localizem e republiquem o álbum O
Anel das Maravilhas, onde essa história foi pela primeira vez compilada...
Já
me dei muito mal ao me deparar com referências ao Oscar, e ao parlamentar com
alguns de seus “fãs” e defensores – essas discussões tem mais a ver com outros
assuntos que com o Oscar. Um dia me disponho a explicar essas coisas que
minaram muito de minha fé de outrora nos quadrinhos brasileiros.
Em
breve, retornamos com outros assuntos.
Até
mais!
2 comentários:
Oscar nem ao menos é uma HQ, é um conto ilustrado, é bem raro de se achar, as edições onde ele aparece foram roubadas da BN, por isso não foram escaneadas para a Hemeroteca.
Eu consegui a edição do Príncipe Oscar de 1924 e estou vendo a melhor forma de republicar. É uma HQ sim, os quadros são em sequência de desenhos, ou seja, Quadros Ao Vivo!
http://quadrosaovivo.blogspot.com.br/2016/11/finalmente-consegui-uma-edicao.html
Oscar também estará em breve em exposição permanente no Museu Histórico Nacional que dedicará um espaço para ele.
Quanto ao que falou o autor da matéria é incoerente: o fato de Gustavo Barroso ser Integralista não influencia em nada o fato dele ter criado o primeiro super-herói do mundo, até porque quando criou Oscar, em 1908, ele não era nem mesmo nacionalista ainda era adolescente e anarquista. E de todos os personagens do mundo Oscar é que possuí primeiro mais características do super-herói, existiram outros, até mesmo no Brasil, mas não com tanta riqueza de elementos que fundamentam um autêntico super-herói, termo criado, aliás por Dostoiévski.
A bronca que a autora da matéria do livro dá nos brasileiros é justa, em qualquer outro país do mundo o feito da criação do primeiro super-herói seria exaltado e comemorado, independente do sentimento de nacionalismo ou patriotismo da pessoa ser alto ou baixo, é inerente aos povos celebrarem suas realizações.
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