Olá.
Hoje,
19 de abril, é o Dia do Índio. Porém, este ano, combinou com um sábado de
Aleluia, véspera da Páscoa. Mas, para hoje, interessa mesmo o Dia do Índio,
portanto, propício ao assunto do qual falarei.
Hoje
vou falar de quadrinhos. E de índios também. Hoje, trago a vocês mais uma HQ
publicada pela editora Júpiter 2, de José Salles. Não sei dizer agora se ele
continua pensando mal de mim depois da última vez que nos comunicamos – e
depois da última vez que falei de gibis da editora dele.
Esperei
mais de um mês pra poder falar do gibi de KRAHOMIM. Quis coincidir o tema com a
ocasião do Dia do Índio. E eis que a oportunidade chegou – a ocasião não é
tanto adequada, mas vamos em frente.
ANTES,
O AUTOR
KRAHOMIM
é criação de Elmano Silva. Antes de falar do personagem, vou falar do autor.
Elmano
Silva Santos nasceu em Recife, Pernambuco, em 1942. Artista já veterano, Elmano
é um dos maiores desenhistas brasileiros de HQ de terror, embora tenha
incursões em outros gêneros.
Desde
menino, Elmano gostava de escrever e desenhar histórias. Formado técnico
contábil, Elmano nunca abandonou a produção quadrinhística, feita em sobras de
cadernos escolares, papel de padaria e até verso de impressos de propaganda
eleitoral.
Mudou-se
para o Rio de Janeiro em 1965. Em 1976, resolveu colocar alguns trabalhos no
Salão de Inverno de Petrópolis e recebeu menção honrosa nessa exposição. Em
1977, como ilustrador e chargista, trabalhou para as empresas cinematográficas
J. B. Tanko e Vidya Filmes. Nesse mesmo ano, conheceu o então editor de
quadrinhos da Editora Vecchi, Otacílio d’Assunção, o Ota, e publicou, na
histórica revista de terror Spektro,
dessa editora, sua primeira HQ, A
Vingança de Sinhá Preta. A narrativa se passava no agreste nordestino, o
que diferenciou Elmano dos outros artistas da revista. Portanto, Elmano é
considerado o autor (senão um dos autores) que incorporou, nas HQ de terror
brasileiras, a presença de lendas regionais e temáticas ligadas ao Nordeste
Brasileiro, tão propícios a histórias sobrenaturais quanto os cenários urbanos
até então muito usados.
Elmano
colaborou ainda com as revistas Pesadelo
e Sobrenatural, da mesma editora
Vecchi. Mas seu trabalho mais conhecido se concentrou na Spektro. O trio Sinhá Preta,
Besta Fera e Menino Aparício fez
grande sucesso, mas seu personagem mais conhecido viria no número 21 da
revista: Silas Verdugo, o Homem do Patuá,
um caçador de criaturas sobrenaturais. Ele apareceria ainda nos números 22 e 24
da Spektro, sempre com histórias onde
se sentia o calor do sertão, o clima de injustiça social e a presença do
fabulário nordestino, com assombrações tipicamente brasileiras.
Com
argumentos próprios, Elmano tornou o período 1980-82 o mais fecundo de sua
carreira. Colaborou ainda com as editoras Grafipar, Record, Bloch, Vozes (para
o qual fez Vida dos Santos em HQ) e
ICEA. Também esteve presente nos oito números da Coleção Assombração, editada em 1995 pela Ediouro. Isso, só para
ficar nas suas colaborações com os quadrinhos. Elmano também trabalhou como
ilustrador de livros infantis e já foi bastante premiado no Brasil e no
Exterior – entre as premiações, está o 1º lugar no VI Salão Carioca de Humor,
categoria melhor charge, 1993; 1º lugar no 4º Concurso Nacional de HQ em São
Gonçalo, RJ, 1999; e menções honrosas no 9º e no 10º Concursos de BD e Cartoon
de Moura, Portugal, em 2001 e 2002.
Seus
mais recentes trabalhos, desde o início do século XXI: além de fazer capas e
ilustrações para os gibis da SM Editora / Júpiter 2, teve dois álbuns editados
pela editora Marca de Fantasia: Os
Marginais (2009) e Silas Verdugo, o
Homem do Patuá – A Origem (2010), onde retoma seu personagem mais famoso.
Suas
colaborações para a editora Júpiter 2 não se limitam apenas às capas e
ilustrações. Além do gibi do KRAHOMIM, que vou apresentar daqui a pouco, ele
desenhou histórias de outros personagens da casa – a mais lembrada é a história
El Condor, número 5 do gibi O Bom e Velho Faroeste.
Elmano
atualmente reside em Joinville, SC, onde continua tocando seus projetos.
Fontes:
ENCICLOPÉDIA DOS QUADRINHOS, de Goida e André Kleinert (L&PM, 2011), site
da editora Marca de Fantasia (www.marcadefantasia.com) e
blog da Editora Júpiter 2 (http://jupiter2hq.blogspot.com.br/).
AGORA
SIM, KRAHOMIM
KRAHOMIM
é a rara incursão de Elmano Silva no universo das HQ infantis. E deu ao público
brasileiro um dos personagens mais cativantes das HQ alternativas. Se fosse
publicado por uma grande editora e alcançasse todas as bancas brasileiras, ah,
onde chegava.
KRAHOMIM
teve seu primeiro gibi publicado em 2007. É um dos raros gibis brasileiros com
um indígena como protagonista – geralmente, os índios são personagens
secundários de HQ, o que por si já é mais uma das injustiças contra os
descendentes dos habitantes originais do Brasil. E não estranhem os olhos
puxados do personagem: indígenas são naturalmente assim, o que comprova a
ligação entre os indígenas do continente americano com as etnias asiáticas,
comprovando, também, que o ser humano povoou a América vindo da Ásia.
A
ideia para KRAHOMIM nasceu quando Elmano leu, certa vez, uma reportagem sobre a
tribo indígena Krahó, ameaçada de extinção, a ponto de ser mais uma a ter sua
cultura, suas lendas e costumes destruídos pela “civilização branca”. Na
reportagem, havia a foto de um indiozinho desse povo, e, pensando no futuro
dele, Elmano deu vida a KRAHOMIM – cujo nome é junção de Krahó, da tribo, com
curumim, menino indígena.
O
indiozinho, da tribo Krahó, é um incansável defensor da natureza. Uma de suas
características soa até clichê dentro do gênero: a sua capacidade de falar com
animais. Sem brincadeira, KRAHOMIM parece ser só mais um personagem infantil
capaz de falar com animais. Mas o que ajuda a diferenciar KRAHOMIM dos demais
personagens talvez seja sua origem, sua etnia.
A
tribo de KRAHOMIM já é semi-civilizada, com índios educados por freiras e
usando roupas de “homem branco”, mas buscando preservar muitos de seus costumes
e modo de vida, como morar em ocas comunitárias, ouvir os conselhos dos mais
velhos (inclusive o pajé da tribo) e fazer artesanato. KRAHOMIM, entretanto,
preza tanto os costumes indígenas que, apesar de ir à escola e gostar de ler
livros, é o único da tribo que anda nu e descalço, só com alguns colares,
pulseiras e cordas enroladas no corpo. Desconfia muito dos avanços tecnológicos
do homem branco. Gosta muito da floresta e dos animais e vive sempre
protegendo-os de caçadores gananciosos e malvados, num alerta pela preservação
da natureza e o combate ao tráfico de animais (mas fica meio irritante o
curumim ficar chamando os bichos de “amigo”: amigo boto, amiga onça, amigo
tamanduá, etc.). Ele também costuma se envolver nos problemas de seus amigos,
procurando ajudar da melhor forma, através da conversa. Em suma, KRAHOMIM é um
bom menino – e o que se espera bastante de um menino indígena.
KRAHOMIM
vive perto de uma pequena cidade na Amazônia, habitada por brancos, negros,
índios urbanos... Tudo na mescla étnica e cultural observada na ocupação da
região amazônica. Seus amigos mais constantes são o atrapalhado indiozinho semi-civilizado Noel,
que já adotou muitos costumes dos brancos, como o de andar sempre vestido com
roupas, o jabuti Tanjão e a menina Lisa. Um pouco mais tarde, foi incluído na
turma Off, o desligado, um sujeito citadino distraído e muito atrapalhado, que
garante boa parte do humor da série.
As
histórias de KRAHOMIM, no geral, são bem conduzidas e bem escritas, e o traço
de Elmano, que utiliza na série o caricatural típico das HQ infantis, é
superdetalhado, praticamente enchendo as páginas. Em alguns momentos, o traço
não fica tão bom como se pretendia, e são constantes os erros nos desenhos, como
os de proporções em partes dos corpos dos personagens, evidenciando, às vezes,
uma arte feita muito às pressas. Mas esses erros, principalmente nas primeiras
edições, só são reparáveis a quem ler as histórias com atenção, dado o
detalhamento na arte de Elmano. Boa parte das histórias, até a introdução do
personagem Off, gira em torno dos esforços de KRAHOMIM para salvar animais de
caçadores inescrupulosos e do envolvimento do indiozinho com lendas da região
amazônica, como o Curupira e a Iara. Ah: o gibi é completo com páginas de
passatempos e figuras para colorir.
AS
EDIÇÕES LANÇADAS ATÉ AGORA
Lembrando:
todas as histórias, texto e arte, e todas as capas, incluindo as cores, são de
Elmano.
KRAHOMIM
# 1
Lançada
em outubro de 2007, quando a editora ainda atendia por SM Editora.
Duas
histórias longas: na primeira, O Curupira,
Krahomim, ao tentar salvar uma onça de dois caçadores malvados, é preso numa
armadilha, e convoca o Curupira, numa versão diferente da já consagrada (com os
dois pés virados para trás, mas careca e com um só olho, ao invés de ter
cabelos vermelhos e dentes verdes) para dar uma lição dos malvados; e na
segunda, O Canto da Iara, Krahomim
tenta ajudar um amigo que teve contato com a bela criatura que habita os rios e
hipnotiza os homens com seu canto – o rapaz está apaixonado por ela. Para
tentar fazê-lo sair dessa, o indiozinho decide conversar com a própria Iara, e
os dois tem uma ideia para quebrar o encanto...
KRAHOMIM
# 2
Publicado
em novembro de 2009, com a editora já sob o nome Júpiter 2.
São
três as histórias agora: em O Jatobá,
Krahomim faz de tudo para impedir que um lenhador derrube uma árvore, inclusive
tentando pegar suas ferramentas – e sempre correndo antes do amigo Tanjão
terminar as frases; em Noel e Lisa,
Krahomim tenta entender o problema de a menina não estar prestando atenção em
Noel; e em O Bicho-do-Mato, Krahomim,
para salvar um filhote de onça-pintada capturado por um caçador inescrupuloso,
e diante da impossibilidade de um guarda florestal em resolver o caso, deixa o
caso nas mãos de uma criatura da floresta, o Bicho-do-Mato, que não vai deixar
o caçador em paz com seus truques e seus assovios. A edição é completa com uma
tira do personagem.
KRAHOMIM
# 3
Lançado
em novembro de 2010
Quatro
histórias. Neste gibi, temos a estreia de Off, logo na primeira história, Krahomim encontra Off, o Desligado, onde
o indiozinho e Noel conhecem o distraído citadino, que já chega fazendo
confusão. Na segunda, O Soluço de Lisa,
o indiozinho tenta curar uma crise de soluço da amiga, mas quem resolve o caso
é Noel, com uma ajudinha de Off; na terceira história, O Canto do Iurapuru, após ouvir do pajé da tribo uma história sobre
o canto do pássaro que, segundo a lenda, taz sorte a quem ouve, Krahomim tenta
ajudar Off a gravar o som do pássaro, mas para chegar até o pássaro, os dois
precisam fazer um acordo hilário com os macacos da floresta; e, na última
história, Vamos ao Cinema?, as
crianças da escola são convidadas para uma sessão de cinema na vila, uma ideia
que desagrada Krahomim, inicialmente porque ele precisa vestir roupas, e depois
porque a sessão termina em tumulto...
KRAHOMIM
# 4
Lançado
em março de 2012.
Três
historinhas: na primeira, O Valentão,
a turminha de Krahomim está sob ameaça de um menino que põe medo em todos por
ser faixa preta de karatê, mas Krahomim, o único que não tem medo dele, acaba
descobrindo que o garoto não é o que parece – um clássico enredo sobre
bullying; na segunda, O Segredo, Noel
passa um pequeno apuro para esconder um segredo sobre o pai de um de seus
amigos; e, na terceira, A Lenda do Boto,
Krahomim precisa salvar o bicho de um homem que acredita que sua filha foi
enfeitiçada. Tudo por causa da lenda de que o boto costuma se transformar em
homem de chapéu para seduzir as moças e levá-las ao fundo do rio. Pior é que o
amigo Off está envolvido na história... Ah: este gibi não inclui as páginas de
passatempos presentes nas edições anteriores, só a tirinha.
Ainda
está em tempo de conferir esse quadrinho brasileiro cativante! Basta escreverem
para smeditora@yahoo.com.br, e
pedirem os seus, ao preço de R$ 3,00 cada. Mas um aviso: José Salles informou
que o #2 já se encontra esgotado no estoque da editora. Mas ainda é possível
conseguir este gibi junto ao próprio Elmano Silva. Nesse caso, escrevam para: krahosilas@ig.com.br.
Fica
registrada nossa homenagem aos povos indígenas do Brasil em seu dia!
Para
encerrar, aqui vai a ilustração de hoje: no traço de Rafael Grasel, Krahomim
lado a lado com Silas Verdugo, o Homem do Patuá. As duas maiores criações de
Elmano Silva, o já veterano autor de HQB. Pelo que vi, acabei cometendo também
os já citados erros de proporção em partes dos corpos dos personagens...
E
uma Feliz Páscoa aos leitores deste blog!
Até
mais!
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