Olá.
Hoje,
volto a falar de livro – e, mais uma vez, revirando minha estante, lanço mão de
uma obra mais antiga.
Foi
recentemente que li, na internet, a notícia que motivou a escolha do livro: no
dia 10 de março deste ano, aos 67 anos, faleceu o veterano ilustrador Jayme
Leão, famoso pelas ilustrações – boa parte delas capas – de importantes
publicações. O trabalho mais lembrado de Leão é na histórica série Vaga-Lume,
da Editora Ática, para a qual fez muitas capas e ilustrações de títulos desta
coleção.
Bão: quem estudava nas décadas de 80, 90 e 2000 conhece a Série Vaga-Lume, a histórica coleção de literatura juvenil da Editora Ática, voltada aos jovens do 1º Grau, atual Ensino Fundamental. Desde o lançamento dos primeiros títulos, em 1972, é a série com mais títulos lançados no Brasil – mais de 90 títulos de autores diferentes, e muitos lembrados até hoje. A Coleção Vaga-Lume é conhecida: pelas capas, com o reconhecível projeto gráfico, que recentemente passou por uma repaginação, mas mantém as mesmas características; pelos Suplementos de Trabalho inclusos em cada título, com atividades de fixação para alunos; pelo mascote, um vaga-lume hippie, que teve diversas aparências, por ter sido desenhado por diversos ilustradores; pelas orelhas da primeira capa, ilustradas, com o mascote dando pistas sobre as tramas; e pelos títulos, muitos deles abordando temas específicos e de interesse à juventude, e numa linguagem compreensível para os leitores mais jovens. O foco maior da série é a literatura policial, mas desde o início houve espaço para a aventura, drama, tramas históricas...
Os
primeiros títulos da coleção foram: A
Ilha Perdida e Éramos Seis, de
Maria José Dupré; Cabra das Rocas e Menino de Asas, de Homero Homem; O Caso da Borboleta Atíria e O Escaravelho do Diabo, de Lúcia Machado
de Almeida; Coração de Onça, Cem Noites
Tapuias e O Gigante de Botas, de
Ofélia e Narbal Fontes. Muitos desses títulos, na verdade, eram republicações
de romances já lançados anteriormente e bem conhecidos – é o caso de Éramos Seis, Menino de Asas e O Feijão e o Sonho, de Orígenes Lessa,
títulos já aclamados. E daí, a coleção foi crescendo, e consagrando autores.
Lúcia Machado de Almeida, por exemplo, lança ainda pela Vaga-Lume Spharion e a trilogia Xisto (Aventuras de Xisto, Xisto no Espaço e Xisto e o Pássaro Cósmico); Luiz
Puntel também é muito lembrado, por Deus
Me Livre!, Açúcar Amargo, Meninos Sem Pátria e Tráfico de Anjos; José Maviavel Monteiro, com Os Barcos de Papel, O Outro Lado da Ilha e O Ninho dos Gaviões; e outros livros célebres, como A Aldeia Sagrada, de Francisco Marins
(autor, dentro da coleção, também de O
Mistério dos Morros Dourados e A
Montanha de Duas Cabeças) e A árvore
que Dava Dinheiro, de Domingos Pellegrini, ganharam novas edições pela
Série Vaga-Lume. Ah: recentemente, a coleção Vaga-Lume foi dividida em duas
linhas: a segunda é a Vaga-Lume Júnior, voltada para leitores da Educação
Infantil (1º ao 5º ano do Fundamental), enquanto que a linha “convencional” é
voltada aos alunos do 6º ao 9º ano. Os livros da coleção são facilmente
encontráveis em bibliotecas, livrarias e escolas, tanto as edições antigas
quanto as recentes.
Mas
o autor que se consagrou, de verdade, na Série Vaga-Lume, foi o paulistano
Marcos Rey.
QUEM
É MARCOS REY?
Edmundo
Donato, conhecido como Marcos Rey, nasceu (1925) e morreu (1999) em São Paulo,
Capital. Filho de um encadernador da Editora Monteiro Lobato, pioneira no ramo
editorial brasileiro, Rey era irmão do também escritor Mário Donato. Começou a
publicar contos e romances aos dezesseis anos, e acumulou importantes trabalhos
na televisão.
Seu
primeiro livro foi a novela Um Gato no
Triângulo, de 1953; depois, veio o infantil Não Era Uma Vez, de 1956. Rey escreveu tanto para o público juvenil
quanto para o adulto, e predominantemente situando suas tramas na cidade de São
Paulo, sobre a qual suas cinzas foram jogadas após seu falecimento.
Na
área adulta, Rey é lembrado por: Café na
Cama (1960), O Enterro da Cafetina
(1967, adaptado para o cinema em 1970), Memórias
de um Gigolô (1968, adaptado para o cinema em 1970 e para a TV, em forma de
minissérie pela TV Globo, em 1985), Soy
Loco Por Ti, América! (1978), A Arca
dos Marechais (1985), Esta Noite ou
Nunca (1988) e O Último Mamífero de
Martinelli (1995), entre outros.
Na
área juvenil, Marcos Rey, em sua maior parte, escreveu livros policiais, cheios
de investigações detetivescas feitas por pessoas amadoras. Seu primeiro grande
sucesso juvenil foi O Mistério do Cinco
Estrelas, de 1981, seu best-seller; e, pela editora Vaga-Lume, veio ainda: O Rapto do Garoto de Ouro (1982), Um Cadáver Ouve Rádio (1983), Sozinha no Mundo (1984), Dinheiro do Céu (1985), Enigma na Televisão (1986), Bem-Vindos ao Rio (1986), Garra de Campeão (1988), Corrida Infernal (1989), Quem Manda Já Morreu (1990), Na Rota do Perigo (1992), Um Rosto no Computador (1993), Doze Horas de Terror (1994), O Diabo no Porta-Malas (1995) e Gincana da Morte (1997), entre outros.
Sem contar ainda os livros paradidáticos e títulos lançados fora da Série
Vaga-Lume.
Na
TV, Marcos Rey também foi responsável por adaptar para telenovela A Moreninha, de Joaquim Manoel de
Macedo, e escreveu roteiros para Vila
Sésamo e Sítio do Picapau Amarelo
(versão dos anos 70).
Atualmente,
seus livros infanto-juvenis são editados pela Global Editora.
AS
AVENTURAS DE LÉO
O
livro que escolhi para resenhar hoje é o primeiro de uma série. Justamente, O
MISTÉRIO DO CINCO ESTRELAS, o mais vendido de Marcos Rey.
Lançado
em 1981, O MISTÉRIO DO CINCO ESTRELAS é o primeiro da tetralogia com as
aventuras de Léo e seus amigos – os outros são O Rapto do Garoto de Ouro, Um Cadáver Ouve Rádio e Um Rosto no Computador.
Léo
é o único personagem literário fixo de Marcos Rey – após o sucesso do primeiro
livro, o escritor pensou em novas aventuras para Léo, Ângela e Gino. E,
certamente, isso o empolgou a escrever mais histórias policiais, com
investigações a la Sherlock Holmes, feitas de modo amador, por personagens que
nem pensavam em seguir a carreira de detetives, entram nas encrencas “de
gaiatos no navio”, mas mostrando ao leitor que bancar o detetive não é tão
difícil. Muitos leitores mirins brasileiros, incluindo este que vos escreve,
começaram a gostar de romances policiais lendo as tramas de Marcos Rey.
O
herói dos livros é Leonardo Fantini, o Léo, um rapaz de quinze anos que
trabalha como mensageiro em um hotel de luxo de São Paulo, o Emperor Park
Hotel. Filho de uma família humilde de descendentes de italianos do Bairro da Bela Vista, em São Paulo, Léo, inteligente e com propensão tanto para se meter em
encrencas como levar as coisas até o fim, atua meio que como um detetive
amador, entrando em casos assim, por acaso. Mas ele nunca está sozinho nas
“investigações”: ele tem como aliados em cada caso: Ângela, a “quase-namorada”,
uma bela e muito inteligente garota do bairro nobre do Morro dos Ingleses,
grande paixão de Léo, mas cujo namoro é atrapalhado pelas diferenças sociais; e
Gino, primo de Léo, mais velho, cadeirante, apaixonado por xadrez e um
verdadeiro gênio, que geralmente é responsável por conectar as “peças” dos
casos e acertar onde os outros erram. O trio ainda conta com o auxílio do
voluntarioso Guima (Guimarães), amigo e colega de trabalho de Léo, que ajuda
conseguindo pistas quentes e inesperadas para a elucidação dos casos, e da
simpática Tia Zula, mãe de Gino, cozinheira e palpiteira de mão cheia. E, embora no primeiro livro ele demore a se entender com o garoto, outro importante aliado do grupo é o Doutor Arruda, o delegado de polícia. Os
“casos” pegos pelo trio envolvem assassinatos e sequestros, com bom-humor, investigações
ao modo quebra-cabeça e um pouco de crítica social. Mas frise-se mais uma
coisa: Léo e Ângela só assumem o namoro no quarto livro; nos outros três, é
mais um chove-não-molha.
Ah:
todos os quatro livros da tetralogia tem capa e ilustrações de Jayme Leão,
naturalmente. Nas versões da Global Editora, os livros ganharam novo projeto
gráfico e novas ilustrações. O MISTÉRIO DO CINCO ESTRELAS, pela Global, tem
capa e ilustrações de Alê Abreu.
O
MISTÉRIO DO CINCO ESTRELAS
Bem.
O MISTÉRIO DO CINCO ESTRELAS serve para apresentar aos leitores Léo e seus
amigos – seu trabalho, seus encontros “ocasionais” com Ângela, e o início de
uma investigação. O mote da trama, no caso, é uma luta de Davi contra Golias,
conforme Rey esclarece no prefácio: o primeiro caso de Léo é tentar provar o
envolvimento de um figurão em um assassinato que mergulhou o protagonista em
desgraça.
Recém-contratado
no Emperor Park Hotel, Léo acaba sendo testemunha involuntária de um
assassinato: numa manhã, quando vai atender a um chamado do tal figurão – Oto
Barcelos, o Barão, um morador permanente do hotel e conhecido por trabalhos de
caridade a instituições – Léo vê, no quarto dele, um homem de feições
indígenas; quando retorna com o jornal do Barão, Léo vê, sem querer, dois pés
embaixo da cama do hóspede, e uma mancha vermelha no roupão deste. Ao contar o
que aconteceu a seu amigo Guima, Léo tem certeza de estar diante de um
assassinato, mas é aconselhado a manter segredo, até ter certeza do que viu. O
caso deixa Léo perturbado, até que, por acaso, acaba indo ao porão do hotel, onde
funciona a lavanderia, e acha o corpo do tal homem em um carrinho de roupas.
Mas, em seguida, Léo é nocauteado, e, quando acorda, o corpo sumiu sem deixar
vestígios.
O
Barão, um homem cheio de segredos, consegue, com uma bem-disfarçada inocência,
fazer com que Léo seja demitido do hotel, ao forjar o roubo de um isqueiro,
onde o garoto leva a culpa. Léo, inconformado, aceita a demissão, mesmo sendo
inocente. Porém, dias depois, lê a notícia de que um corpo é encontrado boiando
em um rio, e vai à polícia reconhece-lo: é o mesmo homem que ele vira no quarto
do Barão. O tal homem, um boliviano chamado Ramon Vargas, para completar a
desgraça, esteve envolvido com tráfico de drogas. Ao acusar o Barão de
assassinato, Léo acaba se indispondo com a polícia, e se torna um rapaz
procurado – desse modo, Léo decide fazer de tudo para provar sua inocência, e a
culpa do Barão.
Para
isso, ele precisa sair de sua casa e se refugiar na de Tia Zula, e acaba
encontrando em Gino um importante aliado. Mas o primeiro passo para descobrir a
culpa do Barão é tentar descobrir o capanga do mesmo, que ajudou a despachar o
corpo do boliviano e ainda nocauteou o garoto. Com uma lista de empregados do
hotel obtida por Guima, e por um jogo de eliminação através de evidências
lógicas, eles chegam a um provável capanga: o ex-lutador Hans Müller, o Alemão.
Em uma academia de lutadores fantasiados, Léo deixa uma mensagem “do morto”
para Hans, e, com isso, acaba se tornando alvo também de uma quadrilha de
traficantes, aparentemente comandada pelo Barão. E a aventura para provar a
ligação entre o Barão e os traficantes faz com que Léo vá deixar outro recado
no hotelzinho onde Ramon se hospedava, se envolva com uma falsa repórter, seja
caçado em uma represa e vá se refugiar no apartamento de Ângela, de onde sai
disfarçado de mulher. Mesmo numa situação tão adversa, Léo descobre que a
garota guarda uma certa quedinha por ele, e se revela a futura aliada do garoto
nos futuros casos. Mas são muitos lances até que Léo volte a confiar na polícia
– e a polícia, notadamente o Doutor Arruda, no garoto – e ambos se juntem para desbaratar a quadrilha e
conseguir a ligação entre esta e o Barão.
Em
se tratando de literatura juvenil, claro que tudo acaba bem no fim – o
importante, entretanto, é saber como. Por isso, aos leitores mais novos, mais
não posso revelar da trama. É só ler, pessoal. Facilmente encontrável em
bibliotecas.
Quanto
às ilustrações, é importante ressaltar que, em O MISTÉRIO DO CINCO ESTRELAS,
Jayme Leão as fez a lápis puro, criando um efeito tridimensional aos desenhos.
Nos outros livros, ele usa nanquim.
Ah:
em 2012, saiu a notícia que O MISTÉRIO DO CINCO ESTRELAS vai ganhar uma
adaptação para cinema, produzida aqui no Brasil! Não há agora como dizer como
está o andamento da produção, se as filmagens já terminaram ou mesmo começaram.
O tempo dirá.
Na
próxima postagem: O Rapto do Garoto de Ouro, dando prosseguimento à série de
postagens sobre Léo, Marcos Rey e Jayme Leão.
PARA
ENCERRAR...
O já
tradicional desenho deste que vos escreve. Hoje, escolhi fazer um cartunzinho
de crítica, algo que não é muito comum na minha obra.
Vendo
os noticiários, as críticas feitas sobre os gastos da Copa e os motivos para os
protestos da população, estou chegando à conclusão que o Brasil se tornou a
Pátria dos insatisfeitos. Estou até vendo: um brasileiro satisfeito com a vida
que leva, e que consegue deixar as contas em dia, hoje pode ser visto como um
bicho raro. Se um brasileiro hoje está feliz, só pode ser por um dos dois
motivos: ou ficou rico, ou está alienado à realidade que o cerca. E hoje se
vende a ideia que ser alienado é inaceitável. Se você está alienado, prepare-se
para perder todos os seus amigos, que provavelmente se renderam às patrulhas
ideológicas: ou das da direita, os das da esquerda. Você não pode ficar alheio
ao fato de que a qualidade do transporte está ruim, a saúde está um caos, o custo
de vida está subindo, o governo gastou mais que o previsto nas obras da Copa, a
qualidade da educação está sofrível, a mídia está moldando cabeças... Mesmo que
você se distraia, darão um jeito de te chamar a atenção pra isso. Nem que seja
preciso entupir seu Facebook com mensagens políticas. Tá certo, a situação do
país está mesmo difícil, mas estão fatalizando muito... estão vendendo a ideia
que o país está todinho sucateado. Todinho. E ninguém vai escapar. Ninguém pode
escapar.
Enfim,
se você está satisfeito com a vida que leva, se você está aí, deslumbrado
diante da internet, lendo ou consumindo uma midiazinha escapista, prepare-se
para perder seus amigos. Prepare-se para se tornar um objeto de estudo. É isso
que eu quis expressar neste cartum.
Sei
que não tem a ver com o tema da postagem, mas foi o que me ocorreu neste
momento. Desculpem se estraguei seu dia. Vocês aí, entretidos com uma
recomendação de literatura escapista, e dei um jeito de enfiar política no
meio. Entenderam agora o que eu quis dizer nos parágrafos anteriores?
Na
próxima postagem: O RAPTO DO GAROTO DE OURO.
Até
mais!
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