Olá.
Hoje,
como prometido, e sem outra interrupção inesperada, continuo a série sobre os
álbuns de Luluzinha pela Pixel Media, selo do grupo Ediouro, em “celebração” à
memória dos gibis de linha que foram interrompidos em abril deste ano.
Quer
dizer, haverá, sim, uma interrupção. É que, segundo a ordem de lançamento dos
álbuns, o próximo da fila é o do Bolinha – e também com histórias clássicas. No
caso, com alguns dos primeiros encontros do gordinho com os homenzinhos de
Marte!
BOLINHA
E OS HOMENZINHOS DE MARTE, o álbum, foi lançado em março de 2014. Como os
outros álbuns, tem 128 páginas, lombada quadrada, capa cartonada, colorido e em
papel couché. É o primeiro álbum solo do Bolinha – e o segundo melhor da série,
depois de Luluzinha – A Turma do Barulho.
Bem.
Se os leitores ficaram frustrados em não terem podido ler uma primeira aventura
de Bolinha, que havia sido prometida para o álbum Luluzinha – Primeiras Histórias, em BOLINHA E OS HOMENZINHOS DE
MARTE, eles tem um interessante documento histórico relacionado ao universo dos
personagens criados por Marjorie “Marge” H. Buell e John Stanley. Neste álbum,
não temos a presença de Luluzinha, apenas do Bolinha, já que seus encontros com
os minúsculos homenzinhos do planeta Marte constituem um universo particular na
mitologia Margeliana (terei eu criado este termo? Ou será melhor o termo
Buelliana? Terei eu criado este termo também?).
BOLINHA, O GIBI
Well.
Todo mundo que se inteira do universo de Luluzinha já sabe que Bolinha França,
ou Tubby, ou ainda Thomas O’Malley ou Tomás França (sabiam que esse é o nome
verdadeiro do Bolinha, uma exceção no mundo das HQ infantis onde personagens
são chamados unicamente pelo apelido?), foi o único coadjuvante criado por
Marge – todos os outros foram criados por Stanley. Mas ele só ganhou um gibi
próprio a partir de 1954, seis anos depois que Luluzinha já havia ganho o seu.
E também pela editora estadunidense Dell Comics. E, tal como Luluzinha, Bolinha
teve suas primeiras histórias solo publicadas, em caráter experimental, no gibi
Four Color, revista teste da Dell, em
1952. Fez sucesso, é claro, garantindo que Tubby,
o gibi, saísse, com sua numeração iniciada pelo número 5 (os quatro primeiro
números correspondem às edições da Four
Color). E, no gibi próprio, Bolinha vive aventuras que beiram o fantástico,
longas para gibis infantis, tomando quase todo o gibi. Outro tema que seria
muito frequente nos gibis do Bolinha é o seu xodó por Glorinha e sua disputa
com Plínio Raposo pelo coração da menina mais bonita do bairro. Em algumas
oportunidades, Glória e Plínio se juntam para tentar ludibriar o gordinho, e em
boa parte das vezes este dá a volta por cima. Em outras, Glorinha participa das
aventuras ao lado de Bolinha. E mais um tema frequente no gibi de Bolinha é o
clubinho, e as aventuras de Bolinha ao lado de Carequinha, Juca e Zeca – já
definidos como os membros principais – seja em aventuras infantis, seja em
conflitos contra a Turma da Zona Norte – ou contra Luluzinha e Aninha, ansiosas
em fazer parte do clubinho. As primeiras histórias do gibi do Bolinha também
eram produzidas pela “dupla de ouro”, John Stanley e Irving Tripp. Pouco
depois, Stanley deixaria os desenhos a cargo do também assistente Lloyd White –
e, bem, eis aqui outro nome que haverá de ser lembrado na mitologia de
Luluzinha de agora em diante.
OS MARCIANOS ESTÃO CHEGANDO!
Bueno.
Os homenzinhos de Marte constituem o elemento fantástico das histórias de
Bolinha. Eles surgiram de carona na moda que esse planeta estava fazendo nos
EUA na década de 1950. Naquele tempo, as notícias de avistamentos de objetos
voadores não-identificados (OVNIS), supostas naves alienígenas, eram bem frequentes,
e, de todos os planetas passíveis de abrigarem vida fora da Terra, Marte, por
ser o planeta mais próximo de nós, era o preferido, e já circulavam as famosas
histórias de que, se houvesse mesmo vida no Planeta Vermelho, seriam
homenzinhos verdes com tecnologia mais avançada que a nossa. Hoje, os
cientistas acabaram com nossas ilusões: várias sondas e robôs enviados a Marte
depois, se sabe que a maior forma de vida que Marte comporta é uma bactéria – a
menos que os tais marcianos tenham criado meios de se esconder muito bem dos
olhares dos terráqueos, sejam barreiras invisíveis, seja em colônias
subterrâneas (eu acho a hipótese mais plausível).
E
ainda por cima são covardes: enquanto só para meados de 2030 o homem terráqueo
conseguirá viajar para Marte, os marcianos há décadas visitam nosso planeta, em
discos voadores. Apenas na ficção, mesmo, os terráqueos já conseguiram
“amartissar” (o termo estará certo?), ou melhor, pousar na superfície do
Planeta Vermelho. Um dos primeiros terráqueos a conseguir “visitar” Marte, no
terreno da ficção, foi John Carter, criado por Edgar Rice Burroughs em três
contos publicados em 1911 (no ano seguinte é que Burroughs criaria Tarzan).
E os
marcianos já foram imaginados de várias formas, desde homens de pele verde, parecidos
conosco em tamanho e aparência (e nos vem à cabeça J’onn Jonzz, o Caçador de
Marte ou Ajax, membro da Liga da Justiça), até homenzinhos minúsculos (lembram,
por exemplo, dos cupins destruidores que o Pica-Pau enfrentou em um de seus
curtas animados?). E suas índoles também variam: de pacíficos (como o já citado
Caçador de Marte) a belicosos (como o pouco competente Marvin, o Marciano, dos Looney Tunes). Vindo só estudar a Terra,
fazer contatos pacíficos com os terráqueos, ou com a pretensão de conquistá-la.
Seja como for, os marcianos ainda são pop.
Bem.
Os homenzinhos de Marte, imaginados por John Stanley, são minúsculos, do
tamanho dos antigos bonequinhos de corda (cerca de 15 cm de altura), e visitam
a Terra numa nave minúscula – apesar disso, eles tem uma tecnologia
avançadíssima, que inclui cintos voadores, que anulam os efeitos da lei da
Gravidade de Newton, e comprimidos que alteram as proporções corporais dos
indivíduos – fazem encolher ou crescer. Em vários de seus encontros com Bolinha
– o único terráqueo em que os homenzinhos confiam, por ser o único capaz de
guardar o segredo de sua existência – esses elementos são usados. As histórias
praticamente envolvem o mesmo enredo: os marcianos estão com problemas, e
Bolinha dá um jeito de ajuda-los. Isso quando não é Bolinha que está com
problemas, e são os homenzinhos que o ajudam, de maneira miraculosa. Ah: no
geral, Luluzinha nem participa dessas histórias, ficando o segredo apenas para
Bolinha. O acesso a universos fantásticos, para a menina do vestido vermelho,
limita-se mais às historinhas que ela conta para Alvinho, ou uma ou outra
aventura que ela viva em sonhos, os quais ela acorda no fim da história. Sendo
assim, é Glorinha a menina com mais participação neste setor.
Há
mais a se dizer: foram necessárias algumas aparições dos homenzinhos para que
seu comandante recebesse nome: Sammi, conhecido no Brasil como Mino. É ele que
conduz os diálogos com Bolinha.
AS CRÔNICAS TERRÁQUEO-MARCIANAS
Mas,
como o leitor pode ver em BOLINHA E OS HOMENZINHOS DE MARTE, os aventureiros
espaciais como os conhecemos são frutos de uma grande evolução. Eles não
nasceram prontos, e nem pacíficos, que só vem estudar os terráqueos e seus
costumes: em sua estreia, ainda nas histórias experimentais da Four Color, eram um povo beligerante, e
com narizes que lembram focinhos de porco, e sem boca – mas já vestiam os
trajes inteiriços com antenas. Esses trajes, aliás, ganharam diversas cores, de
vermelho a laranja, até chegarem ao consagrado azul. Só depois é que ganhariam
a face humana consagrada.
E
mesmo encontros anteriores entre Bolinha e os marcianos não são levados em
conta na cronologia. Sendo histórias apenas experimentais, a continuidade das
características, ou mesmo a mudança destas, dependeu tanto da decisão dos
criadores das HQ como da resposta do público leitor.
Para
explicar, é melhor resenhar as histórias do álbum, que publica os encontros de
Bolinha com os homens de Marte, saídos das revistas Four Color e Tubby, em
ordem cronológica, e com as respectivas datas de publicação. Ah: há um detalhe
sórdido. Das 13 histórias deste álbum, dez já foram publicadas nos gibis de
linha da Pixel, portanto, só três eram inéditas na coleção geral (que inclui
gibis de linha, especiais, almanaques e álbuns). Ah: o texto introdutório, que
conta a história do gibi Tubby e dos
encontros com os marcianos é de Otacílio d’Assunção (Ota), especialista em HQs
antigas e ex-editor recordista da MAD Brasil.
Começando
com a narrativa épica A Arma Secreta
(Four Color 461, abril de 1953,
inédita na coleção). Na estreia, os homenzinhos eram verdes, com focinhos e
roupas vermelhas, e beligerantes. Na história de 32 páginas, os marcianos caçam
e raptam Bolinha. Motivo: o gordinho, em uma de suas aulas de violino, consegue
danificar os equipamentos da nave com uma de suas músicas! Eles, então,
acreditam que o menino é um cientista que cria uma arma mais poderosa do que
eles próprios já desenvolveram! Durante a caçada, cheia de trapalhadas,
Glorinha e um gato acabam entrando na confusão, e sendo abduzidos e levados
para Marte. E, em solo marciano, Bolinha quase destrói o planeta. Primeiro, com
o violino; e depois, dirigindo o planeta em direção à Terra! Só nos anos 50,
mesmo, era possível fazer dois planetas, quase do mesmo tamanho, quase
colidirem, e os terráqueos não perceberem isso...
Em O Maior Acrobata do Mundo (Tubby 8, abril de 1954, e publicada no
Brasil em Bolinha # 9, Pixel), os
homenzinhos detém características parecidas com as do “encontro” anterior, mas
são apenas observadores pacíficos, que decidem ajudar Bolinha quando este se
mete em encrencas ao tentar entrar de penetra em um circo. Nestas duas
primeiras histórias, o traço de Stanley e Tripp ainda é desajeitado – note que
até mesmo Glorinha tem uma aparência estranha, como se as histórias tivessem
sido desenhadas às pressas. E segue assim em aventuras seguintes do álbum,
cujas artes vão melhorando aos poucos. Afinal, eram três revistas para cuidar
ao mesmo tempo, Little Lulu, Tubby e Four Color!
Em O Grande Mágico (Tubby 9, julho de 1954, inédita na coleção), aparece apenas um
marciano, com a aparência dos anteriores. Ele se comunica com Bolinha por
telepatia, e se abriga no bolso do casaco de Bolinha, junto com seus equipamentos
milagrosos. E ele vai ajudar o gordinho em duas coisas: assistir a um
espetáculo de mágica, o qual ele não conseguiu entrar por falta de dinheiro, e
elucidar um assalto ao banco. Todos fatos interligados.
É em
O Invasor da Nave (Tubby 10, outubro
de 1954, publicada anteriormente em Bolinha # 10) que as características definitivas dos marcianos são definidas – bem
como sua relação de amizade com Bolinha. O gordinho é levado, no meio da noite,
para ajudar os homenzinhos a conter um inimigo terrível que invadiu sua nave
espacial: um simples gambá!
Em O Homenzinho no Bolo (Tubby 12, abril de
1955, e Bolinha # 11, Pixel), o
comandante da nave é chamado de Mino. E pede ajuda a Bolinha para uma missão de
resgate: comprar um bolo de casamento, com dinheiro achado na rua, pois um dos
subordinados de Mino foi usado como bonequinho no topo da guloseima! Mas o
negócio se complica quando crianças devoram o bolo... e ainda levam o
homenzinho!
Em A Rebinqueta (Tubby 13, julho de 1955, e Bolinha# 12, Pixel), os homenzinhos resolvem consertar a nave deles... no quarto
de Bolinha! O barulho feito durante o conserto é o de menos... O problema é
encontrar a peça de substituição requisitada!
Em A Canoa Voadora (Tubby 14, outubro de 1955, e Bolinha# 13, Pixel), os homenzinhos ajudam Bolinha a impedir que a Turma da Zona
Norte descubra o paradeiro da canoa do clubinho... que os aventureiros estão
usando de esconderijo enquanto visitam o zoológico!
Em O Bola Voador (Tubby 15, janeiro de 1956, e Bolinha# 14, Pixel), uma pequena aventura para tirar o disco voador do parque da
cidade vai colocar à prova a confiança que Bolinha tem em seus amiguinhos
marcianos.
Em O Amigo do Papagaio (Tubby 17, julho de 1956, e Bolinha # 15, Pixel), outra missão de
resgate! Bolinha tem de ajudar os homenzinhos a resgatar Mino, preso numa
gaiola de pássaro, e, como recompensa, pode ficar de bem com a professora, Dona
Marocas.
Ajudantes do Papai Noel (Tubby 20, janeiro de 1957, e Bolinha # 32, Pixel), envolve o Bom
Velhinho, logicamente. O menino e os homenzinhos ajudando-o a sair de uma
encrenca causada pelo mau tempo dos EUA (lá é uma das regiões da Terra em que
neve é problema, sabem?)
O Violino Atômico (Tubby 21, março de 1957, inédita na
coleção), os homenzinhos desta vez ajudam Bolinha a vencer um concurso de
aeromodelismo. E fazendo uso... do violino do gordinho! Com o mesmo método
usado em A Canoa Voadora. Ah: eis
mais um problema. As proporções dos homenzinhos de Marte podem variar de uma
história a outra – ora parecem menores que 20 cm, noutras maiores. É como a
indefinição da estatura do Pica-Pau – vocês repararam que, em alguns episódios
do desenho animado, o Pica-Pau ora aparece bem pequeno, cabendo na palma de uma
mão, ora grande, do tamanho de uma criança humana?
Voltando
ao assunto, em O Feijão Saltitante Humano
(Tubby 23, julho de 1957, e Bolinha # 18, Pixel), os homenzinhos de
Marte, desta vez, ajudam Bolinha a humilhar um pouco o metido Plínio Raposo, numa
sessão de cinema.
E,
encerrando, Uma Noite Difícil (Tubby 24, setembro de 1957, e Bolinha # 21, Pixel), onde quem sofre
com as estripulias de Bolinha e dos homenzinhos é o pai do gordinho – quando os
homenzinhos resolvem passar a noite na casa da família França.
No
aguardo estaremos de um improvável segundo álbum de aventuras do Bolinha, já
que agora a Pixel está se dedicando apenas aos álbuns – se eles realmente
cogitarem encerrar a publicação do gibi do Recruta Zero. BOLINHA E OS
HOMENZINHOS DE MARTE pode ser encontrado com facilidade, ainda. Preço de capa:
R$ 16,90.
E,
quem puder, me esclareça uma dúvida: para se referir ao universo criado por
Marge, o termo melhor seria “Margeliano”, “Margeriano”, ou “Buelliano”?
Comentem e ajudem!
PARA ENCERRAR...
...o
curso de HQ continua! Como prometido, eis aqui o segundo trecho de meu livrinho
teórico de HQ, Quadrinhos, Conceito e
Prática. Já contei a vocês a origem deste trabalho em quadrinhos envolvendo
a Letícia, minha personagem: quando estava lecionando uma oficina de HQ para
estudantes em Santa Maria, RS, elaborei este material de apoio em forma de HQ.
Agora, pisando no terreno da linguagem da HQ propriamente dita, com todos seus
elementos.
Na
próxima postagem, se não aparecer nada para causar uma momentânea interrupção,
como a chegada do gibi do Miracleman às
bancas, traremos resenha de outro
álbum de Luluzinha pela Pixel – e outro trecho de Quadrinhos, Conceito e Prática, dando continuidade ao curso de HQ.
Até
mais!
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