Olá.
O
Brasil está vivendo dias difíceis logo no início do ano: enganados pelo
governo, já começando a sentir o peso dos novos tributos, sob ameaça de colapso
no fornecimento de água e energia elétrica... Não, não vou engrossar o coro dos
indignados. Não hoje.
Porque
pelo menos, o mercado editorial não está deixando os brasileiros na mão. Os fãs
de quadrinhos estão bem servidos de lançamentos em bancas e livrarias,
nacionais e estrangeiras. Hoje, vou falar de um desses lançamentos – e produzido
no Brasil!
Hoje,
vou falar de PÁTRIA ARMADA, uma das mais incríveis HQs brasileiras com temática
militar e ficcional apoiada na História – ou quase isso.
PÁTRIA ARMADA, com texto e desenhos de Klebs Junior, é o primeiro lançamento do Instituto de Quadrinhos, nova editora derivada da renomada escola Instituto de Quadrinhos. A revista foi viabilizada após uma bem-sucedida campanha de financiamento coletivo no site Catarse, sendo lançada em dezembro de 2014. E, agora, em janeiro de 2015, a revista está sendo distribuída nas bancas de diversas localidades!
O
autor, Klebs de Moura Júnior, é um veterano no mercado brasileiro. Ele tem
diversas HQs publicadas tanto no Brasil como no exterior. Nascido em Rio Claro,
SP, em 1966, e formado em Comunicação Visual pela Faculdade de Belas Artes,
Klebs Junior é um dos fundadores da Impacto, uma das mais importantes escolas e
estúdios de quadrinhos do país – hoje, com o nome Instituto de Quadrinhos. Os
primeiros trabalhos de Klebs Junior apareceram no início da década de 1990, nas
revistas Pau Brasil, Metal Pesado e Brazilian Heavy Metal. Em 1998, é
lançado, numa parceria entre a Impacto e a editora Trama, o primeiro número de
uma série que teria três partes, Lilo, o
Horror Vivo, com roteiro e desenhos de Klebs e cores de Sam Hart – mas esta
série, até onde pude pesquisar, só ficou em um número mesmo. Klebs Júnior já
trabalhou para as mais importantes editoras norte-americanas: para a Marvel,
desenhou Nova, Citizen V e Excalibur; para a DC, Snakes on Plane; para a Dark Horse, Willow and Tara; e, para a Malibu, Code Name Firearm e Freex. Além de ilustrações para jornais e revistas.
Como
eu disse, PÁTRIA ARMADA é o primeiro lançamento do Instituto de Quadrinhos,
ex-Impacto, que pretende lançar, em breve, mais revistas de autores
brasileiros, de ex-alunos e alunos do Instituto, pretensamente na intenção de
criar um mercado de HQs brasileiras livre das imposições econômicas e
culturais. A nós, leitores, resta prestigiar essa iniciativa.
PÁTRIA
ARMADA é uma série que terá três partes – a primeira já foi lançada, agora é
torcer para que os volumes seguintes se tornem realidade, não aconteça como
aconteceu com Lilo, o Horror Vivo. Pelo
que se vê, o mercado de HQs brasileiras, atualmente, está mais promissor, estas
estão tendo boa aceitação dentro do país, graças ao nível de sofisticação que
os novos talentos estão alcançando. Mas ainda existe a concorrência desleal com
os comics e os mangás, então a saída para emplacar as HQs brasileiras é
oferecer material de qualidade, livres de ideologias políticas ou morais e
discursos demagógicos sobre um suposto combate ao “imperialismo quadrinhístico
nipo-americano”, que está sendo pregado por alguns autores e editores
independentes. Cada qual quer, claro, divulgar e vender seu material, mas está
o fazendo pregando discursos de ódio contra os quadrinhos estrangeiros. Não vou
citar nomes de quem está fazendo essas coisas agora.
Mas
não que PÁTRIA ARMADA não mereça um bom puxão de orelha, porque alguns fatores
tiram-lhes a qualidade. Já explico.
Bão.
PÁTRIA ARMADA é uma combinação insólita: de personagens com superpoderes,
política, realidades alternativas e espionagem, tudo com a típica pegada
brasileira. Os cenários são reais, tentando criar uma empatia com o leitor
brasileiro. Já os acontecimentos trabalham com a ideia do “o que aconteceria
se...?”, criar uma nova versão da História oficial do Brasil, mas de uma forma
séria e bem estudada.
Na
realidade alternativa imaginada por Klebs Júnior, o Regime Militar (1964 –
1985) não aconteceu. Os golpistas tentaram derrubar o presidente João Goulart,
mas a pressão popular conseguiu impedir. Mas o resultado acabou sendo uma
violenta guerra civil que se estendeu até a década de 1990 (a trama se passa em
1994). De um lado, os militares golpistas, agora chamados de Federalistas,
tentando implantar a Ditadura Militar; do outro, os Legalistas, tentando manter
a democracia. No violento confronto de forças, foram detonadas duas bombas
químicas destrutivas: os Federalistas lançam uma em São Paulo, e o Legalistas,
uma em Salvador. O saldo foram muitos mortos e, nos anos seguintes, o
nascimento de pessoas com doenças genéticas – ou melhor: superpoderes.
É
justamente dessas pessoas que o exército Legalista está se aproveitando:
recrutando pessoas com poderes para fazer delas armas contra os Federalistas.
O
álbum começa com um violento enfrentamento entre Federalistas e Legalistas nas
ruas de São Paulo. Somos apresentados – mas não o suficiente – a alguns dos
personagens que compõem esse exército, como o negro gigante Rasta e o
nordestino Zeverildo, atirador de pontaria precisa. Além do índio com poderes
elétricos, que não teve seu nome revelado. Mais adiante, outros personagens que
aparecem são Glória Maria, a garota com supervelocidade, e Teco, o GPS humano.
Pouco
depois, uma nova integrante é acrescentada ao exército Legalista: Cristina, uma
garota que possui o dom de manipular as emoções das pessoas. Depois de criar um
pequeno tumulto em sala de aula enquanto a turma assistia um documentário onde
o contexto da aventura é apresentado, ela é levada, direto da sala de aula,
pelo Coronel, o líder dos Legalistas, a um quartel, onde ela começa a passar
por um atordoante treinamento, com xingamentos dos superiores mal-humorados e
poucos motivos para descontração. Ela até tenta questionar os motivos de ter
nascido com poderes, mas o que consegue é ser praticamente repreendida.
Os
Legalistas precisam descobrir os motivos da investida dos Federalistas em São
Paulo, e descobrem, através de uma operação militar em uma base secreta, um
novo plano nefasto dos inimigos... e esse plano guiará os acontecimentos do
próximo volume. Mais: descobre-se que os Federalistas também possuem pessoas
com superpoderes em suas fileiras...
Além
da história, com os quadros sobre fundo preto, o álbum é completo com
ilustrações simulando notícias de jornal, mapas e uma página onde aparecem, na
forma de um documento “oficial” do exército, os nomes de todas as pessoas que
colaboraram, pelo Catarse, com a publicação da revista.
Os
desenhos de Klebs Júnior são realistas, porém levemente estilizados, e
coloridos na medida certa. O roteiro é interessante, mas há um grave pecado:
Klebs Júnior não apresentou direito os personagens. Ele ignorou, em vários
momentos, a principal regra dos quadrinhos: sempre apresentar um personagem,
pela primeira vez, desenhado de corpo inteiro. Os closes dos personagens são
bastante incômodos. Além disso, ele pouco se preocupou em aprofundar as
características psicológicas dos personagens, forçando o leitor a adivinhar
como cada personagem é. Aliás, ele sequer apresentou os personagens
convenientemente: só os jogou no meio da ação e pronto, só se preocupou em
conduzir as cenas de ação da história, mais nada. O leitor dificilmente vai
criar empatia com os personagens. Ah: e o único personagem que tem seu passado
apresentado em flashback é o índio com poderes elétricos, que conta sua
história como sobrevivente de um ataque dos Federalistas em uma aldeia do
Xingu. Klebs até se esforça em dar uma personalidade descontraída a Rasta e a Teco
– que começa a dar em cima de Cristina de um jeito cínico – mas e os outros
personagens? Que importância Cristina tem na trama? Aliás, quais são os poderes
dela mesmo?
Só
resta agora esperar que tais defeitos sejam consertados no segundo volume da
série. Se Klebs, além de resolver as tramas e subtramas da aventura, vai
apresentar melhor os personagens que compõem a ação.
A
única maneira, claro, é que os leitores prestigiem o trabalho brasileiro. Preço?
R$ 15,00. Como a revista é colorida, com páginas em papel couché e capa
cartonada, o preço é justo.
E
vamos aguardar os próximos lançamentos do Instituto de Quadrinhos, e ver se
todos compensam o investimento.
Para
encerrar, já que falamos de Regime Militar (1964 – 1985), que tal puxar um
pouco a orelha dos defensores do retorno da Ditadura ao país, e fazer mais um
revisionismo histórico do período? É o que faço no cartum abaixo, que desta vez
discute o papo da necessidade do Golpe (Revolução não, Golpe) de 1964 como meio
de impedir que o “comunismo fosse implantado no Brasil” e tal. Mas fica a
pergunta: como seria se tivesse mesmo sido implantado? A situação brasileira
seria melhor... ou pior? No meu turno, prefiro não me envolver nesse tipo de
discussão... sempre me dei mal ao discutir com os neocomunistas e também com os
defensores da Ditadura.
Prestigiem
o quadrinho nacional!
Até
mais!
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